José António Moreira, [types field="pub" class="" style=""][/types],
De há anos a esta parte, com alguma regularidade, temos sido destinatários de campanhas da Autoridade Tributária destinadas a incentivar-nos a pedir a emissão de factura em todas as transacções em que sejamos intervenientes. Pretendem tais campanhas combater a evasão fiscal por parte de prestadores de serviços ou fornecedores de bens que, quando não emitem o correspondente justificativo legal, ficam exonerados de repercutir as transacções na respectiva contabilidade e, por essa via, de entregarem ao Estado o IVA cobrado e o tributo em sede de IRC pelo lucro obtido.
Nunca se conhece o efeito concreto de tais campanhas, mas como elas se repetem de tempos a tempos, e de modo particular em períodos de aperto orçamental, presumo que cada uma delas está longe de ter o impacto pretendido e, sobretudo, efeitos duradouros sobre o comportamento cívico dos cidadãos. A evasão fiscal é, em parte, uma característica cultural, perpetuando-se no tempo.
Recentemente, na zona de restauração de um centro comercial em Bogotá, na Colômbia, encontrei, pendurado do teto, um colorido reclamo luminoso que, do lugar onde me encontrava sentado, se lia "Sin su fatura no pague su consumo". Admiti, desde logo, que o mesmo seria parte de uma campanha da autoridade tributária local, tendente a levar os clientes a pedir factura. Tendo em consideração que a evasão fiscal nesse país é muito alta, não fiquei particularmente surpreendido com o teor da mensagem, mas apenas com o modo como ela era veiculada.
Acabado o repasto, quando me levantei, tive oportunidade de constatar que apenas lera uma parte da mensagem. Consegui, então, ler a última linha desta, que era a "assinatura" do respectivo autor: "El Dueño" (O Dono). Fiquei boquiaberto. O incentivo para que os clientes pedissem factura - espalhado pelo recinto em muitos outros reclamos como o que referi - era da autoria do dono do estabelecimento, não da autoridade tributária.
Veja-se o contexto. A propriedade daquele recinto da alimentação é de uma única empresa, embora existam áreas diversas e autónomas de alimentação por ele espalhadas ("barraquinhas de petiscos"). Dado que há muitos empregados envolvidos, para poder controlar o negócio por via da contabilidade, o proprietário ("o dono") tem de ter a certeza de que todas as transacções são registadas. Para isso pede a colaboração dos seus clientes. Talvez nem tenha pensado nas consequências fiscais da medida, mas o facto é que a sua original mensagem contribui, simultaneamente, para aumentar a eficiência do controlo interno do negócio e para a redução da evasão fiscal. Sorri com a originalidade da medida.
Não pude deixar de pensar que os empresários portugueses, sem prejuízo de outros objectivos a atingir, poderiam usar este tipo de sinalização como afirmação da respectiva honestidade fiscal. Bastava que afixassem nos seus estabelecimentos um ou mais reclamos do tipo referido. Certamente melhorariam a imagem das suas empresas junto dos clientes, e do público em geral; provavelmente, a medida teria maior impacto no comportamento cívico dos cidadãos (clientes) do que as campanhas da Autoridade Tributária acima referidas.
É certo que poderiam sempre simplificar o processo e, simplesmente, dar instruções precisas aos seus funcionários para emitirem o justificativo legal para toda e qualquer transacção. Mas isso não teria o mesmo impacto em termos de imagem pública. Ora, num tempo em que a imagem é tudo? ou quase, aceita-se que o reclamo pudesse ser preferido.