Alda Correia, OBEGEF

Quando se normaliza a fraude, perde-se a confiança e todos ficam mais vulneráveis.

Gosto de ver o copo meio cheio. É essa atitude que nos dá ânimo para enfrentar desafios complexos e persistentes, como o combate à fraude nos seguros. Um tema que, há apenas duas décadas, passava despercebido fora das seguradoras e que hoje está presente nos tribunais, nos noticiários e até nas conversas mais informais. Ninguém pode fingir que não existe.

Durante muito tempo, nem sequer havia uma definição legal clara sobre o que era fraude em seguros. Só em 2009 surgiu um enquadramento oficial, que a descreve como qualquer ato ou omissão intencional, ainda que apenas tentado, destinado a obter uma vantagem ilícita, seja na celebração, seja na execução de um contrato. Mas mais do que palavras na lei, a fraude traduz-se em comportamentos que todos já ouvimos contar: acidentes inventados, danos exagerados, declarações falsas. Pequenos gestos que se tornam custos reais partilhados por todos nós.

Portugal é um país onde o seguro faz parte do dia a dia. O seguro automóvel permite que milhões de pessoas circulem em segurança. Os seguros de acidentes de trabalho garantem que quem sofre um infortúnio tem acesso a tratamento e indemnização. Quando participamos num evento, partimos do princípio de que existe cobertura para os imprevistos. Esta teia de proteção é uma conquista coletiva. Mas só sobrevive se for alimentada pela confiança e pelo cumprimento das regras.

O setor segurador tem investido de forma consistente em tecnologia de deteção, em sistemas de controlo e em iniciativas de sensibilização, como a semana de combate à fraude. São passos essenciais. Para combater eficazmente a fraude, é preciso conhecê-la, estudá-la, quantificá-la. É também necessário dispor de um quadro legal claro e de reguladores vigilantes. Mas nenhuma lei ou algoritmo substituirá o que é mais decisivo: uma cultura de responsabilização que começa em cada cidadão.

A fraude não é um problema técnico isolado. É uma manifestação cultural de tolerância ao abuso, semelhante àquela que alimenta outras formas de corrupção. Quando alguém normaliza estas práticas, está a fragilizar todo o sistema, a transferir custos para os restantes segurados e a comprometer a capacidade das seguradoras de cumprirem a sua missão: proteger pessoas, famílias e empresas.

Desenvolver uma cultura antifraude é reconhecer que a integridade conta, mesmo quando ninguém está a olhar. É recusar participar em esquemas que prometem facilitar processos ou aumentar compensações indevidas. É denunciar práticas irregulares e promover a clareza na relação com as seguradoras.

O combate à fraude nos seguros não pertence só às empresas, aos supervisores ou aos tribunais. É uma responsabilidade partilhada por todos nós. Porque o sistema segurador vive do contributo de cada cidadão e existe para servir a sociedade como um todo. E é nessa consciência coletiva que reside a força para continuarmos a enchê-lo, dia após dia.