Jorge Fonseca de Almeida, OBEGEF
Depois de um governo de casos e casinhos, depois do partido dos ladrões de malas e dos pedófilos, temos agora um PM sob grave suspeita. Em vez de enfrentarmos de uma vez por todas este flagelo que nos afunda na lama, preferimos discutir o mensageiro e não a substância da mensagem.
Nos últimos dias ficámos a saber que Luís Montenegro recebeu, durante o período em que já ocupava o lugar de Primeiro-Ministro, através da sua empresa Spinumviva, propriedade da sua mulher com quem é casado em comunhão de adquiridos, diversas somas de dinheiro de empresas que faturaram milhões de Euros em vendas de produtos e serviços ao Estado.
Estes factos, que em si mesmos levariam em qualquer país à remoção do Primeiro-Ministro, foi transmutada pelo PSD numa discussão sobre quem obteve esta informação – que, pasme-se, deve ser pública e que tem como fonte o próprio Luís Montenegro!
Quando os principais órgãos de comunicação social se associam a estas manobras de desinformação, a estas formas de afastar a discussão pública do essencial e de a centrar no acessório, no irrelevante, estamos perante a prova da sua falta de independência, da sua dependência em relação ao poder político, do pântano em que se instalou na política nacional, da falta de escrutínio sério e independente por parte dos principais jornais e canais de televisão.
Partidos, neste caso dois, que se unem atrás de um dirigente que enquanto primeiro-ministro recebeu dinheiro de empresas com quem o seu Governo, direta ou indiretamente, fez negócios de muitos milhões, não contribuem para afastar as práticas de corrupção dos centros de decisão nacionais.
Portugal segundo os rankings internacionais é um país em que a corrupção lavra sem travão. Estes exemplos de legitimação pelas urnas de práticas que devem ter outro tipo de veredito envergonham o nosso país.
No ranking da Transparência Internacional, uma organização europeia com sede na Alemanha, o nosso país surge em 43º lugar atrás de países como Cabo Verde, Bahamas, Uruguai, Barbados, Emiratos Árabes Unidos e outros. Mesmo países que a comunicação social portuguesa caracteriza como regimes corruptos, como a Arabia Saudita, a Dominica, o Ruanda, a Costa Rica conseguiram melhores resultados. A marca da corrupção é a triste imagem que Portugal projeta nestes estudos comparativos internacionais. Um ferrete que nos atinge a todos e que todos temos obrigação de combater. Uma imagem que afasta os negócios legítimos e o investimento honesto. Uma imagem que a todos nos prejudica.
Em vez de atacar o mensageiro a comunicação social devia concentrar-se nas questões críticas:
- Esclarecer a ligação entre as verbas recebidas pelo PM e os negócios do Estado com as empresas suas clientes;
- Saber se estes recebimentos configuram um conflito de interesses grave por parte do PM;
- Aclarar se as práticas de Luís Montenegro se confinam dentro do estrito limite ético a que um PM deve estar sujeito.
Nestes casos, procurar uma legitimação pelas urnas é o pior que, em termos éticos, se pode fazer. Porque implicitamente se reconhece que as más ações, as más práticas se podem legitimar, se podem admitir, se podem repetir se tiverem muitos votos. Que a corrupção, os conflitos de interesses podem tornar-se legítimos se obtiverem mais de 15% de votos dos portugueses.
Depois de um governo de casos e casinhos, depois do partido dos ladrões de malas e dos pedófilos, temos agora um PM sob grave suspeita. Em vez de enfrentarmos de uma vez por todas este flagelo que nos afunda na lama, preferimos discutir o mensageiro e não a substância da mensagem.
Assim não vamos lá.