Óscar Afonso, Dinheiro Vivo

Dedico este artigo ao trabalho de três economistas de renome na ciência económica que acompanho desde há muito, por terem trabalho académico seminal na área do crescimento económico e desigualdade, precisamente os dois tópicos em que tenho trabalhado enquanto académico.

Estou a falar de Daron Acemoglu – para mim, um dos melhores economistas de sempre, com grande influência na minha carreira –, James Robinson e Simon Johnson (os três sedeados em universidades norte-americanas), a quem a Academia Real das Ciências da Suécia atribuiu este ano o Prémio Nobel da Economia. De forma mais rigorosa, trata-se do prémio Sveriges Riksbank (o Banco Central da Suécia) em Ciências Económicas em memória de Alfred Nobel, cujo testamento não instituiu um prémio específico para esta área, tendo sido criado posteriormente pelo Banco Central da Suécia, que paga uma perpetuidade à Fundação Nobel para financiar o prémio e as despesas administrativas.

Daqui resulta um nome algo diferente para o prémio – não sem alguma controvérsia, pois há familiares que consideram que Nobel não teria querido associar o seu nome a um prémio na área económica –, mas o valor monetário, os critérios de seleção e a cerimónia são semelhantes ao que se verifica nos prémios originais que Nobel decidiu financiar no seu testamento (Física, Química, Medicina ou Fisiologia e Paz, este gerido pelo Parlamento sueco).

De uma forma simples, a Academia Real Sueca premiou a ligação estabelecida pelos investigadores entre a qualidade das instituições e o crescimento e desenvolvimento económico dos países ou, nas palavras do comunicado, a demonstração da “importância das instituições sociais para a prosperidade de um país”.

Por exemplo, sociedades com um Estado de direito deficiente e instituições extrativas, que se aproveitam dos recursos de um país em benefício próprio, em vez de o distribuir pela população, não geram crescimento nem desenvolvimento económico. A investigação dos laureados ajuda-nos a compreender melhor porquê, ao analisar o legado institucional dos colonizadores nos países colonizados.

Quando os europeus colonizaram grandes partes do globo, as instituições dessas sociedades alteraram-se, por vezes de forma dramática, mas tal não ocorreu da mesma forma em todo o lado. Em alguns locais, o objetivo era explorar a população indígena e extrair recursos para benefício dos colonizadores. Noutros sítios, os colonizadores criaram sistemas políticos e económicos inclusivos para benefício a longo prazo dos migrantes europeus.

As instituições inclusivas foram frequentemente introduzidas em países que eram pobres quando foram colonizados, resultando, com o tempo, em maior prosperidade. Pelo contrário, alguns países ficam presos numa situação de instituições extrativas e de baixo crescimento económico. Enquanto o sistema político garantir que estas pessoas se mantêm no controlo, ninguém confiará nas suas promessas de reformas económicas futuras e não há melhorias. A introdução de instituições inclusivas criaria benefícios a longo prazo para todos, mas as instituições extrativas proporcionam benefícios a curto prazo.

Por outro lado, essa incapacidade de fazer promessas credíveis de mudanças positivas por parte de elite extrativas também pode explicar o facto de, por vezes, a democratização ocorrer. Perante uma revolta popular, as elites no poder enfrentam um dilema, pois podem tentar apaziguar as massas prometendo

reformas económicas para manter-se no poder, mas é pouco provável que a população acredite, pelo que, no final, poderão mesmo ver-se forçados a ceder poder e instaurar um regime mais democrático.

O modelo económico desenvolvido pelos autores explica, assim, vários resultados económicos possíveis em função do legado institucional, que tem uma grande inércia.

Jakob Svensson, Presidente do Comité do Prémio em Ciências Económicas, salienta que “reduzir as enormes diferenças de rendimento entre os países é um dos maiores desafios do nosso tempo” e “os laureados demonstraram a importância das instituições sociais para o conseguir”, tendo identificado “as raízes históricas dos fracos ambientes institucionais que caracterizam muitos dos atuais países pobres”.

De um modo mais geral, a melhoria da qualidade das instituições é um fator importante para o crescimento e desenvolvimento económico de todos os países, pois tanto pode haver avanços como retrocessos, mesmo em países mais avançados.

Junto agora mais algum conhecimento próprio na área das instituições e crescimento económico para retirar algumas ilações que me parecem importantes para Portugal.

A qualidade das instituições é geralmente avaliada por via de indicadores com uma inércia grande e uma elevada correlação entre si, variando relativamente pouco em períodos curtos, pelo que são sobretudo úteis para comparações entre países ou de um dado país ao longo de períodos relativamente longos.

Há ainda autores que apontam as variações da qualidade institucional ao longo do tempo como sendo o resultado da evolução ao longo do tempo da qualidade das políticas – que têm uma maior variabilidade no tempo –, uma perspetiva que considero válida e relevante.

Tendo em conta estes ensinamentos, a seguir procedo a uma breve análise de alguns indicadores de qualidade institucional de Portugal tendo como fonte indicadores de governança do Banco Mundial.

Em 2022, Portugal estava ainda no percentil 75 ou acima em alguns indicadores importantes de qualidade institucional, como são a estabilidade política, a efetividade do governo, o controlo da corrupção e a qualidade regulatória. No entanto, temos vindo a piorar em todos eles de um modo geral – em nível e em termos relativos –, tanto desde 1998, como face a 2009 e mesmo desde 2015, com exceção da melhoria entre 2009 e 2015 na efetividade do governo e na estabilidade política, coincidente com o programa de ajustamento económico e financeiro da Troika. Abaixo destaco a nossa evolução relativa, em percentis.

Nos indicadores Estabilidade política, ausência de violência e terrorismo /Efetividade do governo /Controlo da corrupção /Qualidade regulatória, passamos do percentil 95 /85 / 85 / 85 em 1998, para 73 /83 / 82 / 79 em 2009, 78 /85 / 78 / 79 em 2015 e 76 /80 / 76 / 75 em 2022.

A conclusão a que chego é que Portugal tem estado a retroceder ao nível de aspetos importantes da qualidade institucional (há mais indicadores, como o Estado de Direito – Rule of law, mas aí a queda foi apenas ligeira), denotando também uma pior evolução (absoluta e relativa) nas políticas subjacentes.

Isso tem contribuído para um menor desempenho em matéria de crescimento económico e nível de vida, em que Portugal se deixou ultrapassar pela maioria dos países europeus de leste, vários deles partindo bastante atrás de nós e tendo recebido muito menos apoios europeus, aproveitando-os muito melhor.