Jorge Alves, OBEGEF

Não me ocorre outra atividade em que quem custeia a produção dos bens pague depois pela sua utilização.

Os Docentes e Investigadores (D&I) no seu quotidiano são inundados, no seu e-mail, com convites para participar em conferências internacionais ou publicar os seus trabalhos em revistas científicas de acesso aberto. As Editoras e Entidades Organizadoras de Conferências (EEOC), em troca de valores consideráveis, propõem-se receber, para análise e posterior publicação, trabalhos que os D&I tenham desenvolvido. Tudo isto acontece porque as EEOC, sabendo que os D&I necessitam de publicar os seus trabalhos para progredirem nas carreiras e existindo fundos públicos disponíveis para o efeito, estão a fazer desta atividade um negócio altamente lucrativo com o consentimento dos Estados.

De acordo com um artigo de opinião publicado em julho deste ano no The Guardian (https://www.theguardian.com/science/peer-review-scientific-publishing), as principais editoras de revistas científicas registam atualmente margens de lucro muito elevadas. É fácil compreender que assim seja. Se por um lado, os valores pagos às EEOC pela publicação ou acesso às publicações é significativo; por outro lado, as EEOC não suportam grandes encargos, já que a impressão das publicações atualmente tem pouca expressão e a revisão dos artigos é feita por D&I anónimos a quem nada pagam.

Nas revistas científicas de acesso restrito, embora os D&I não paguem às editoras, as Instituições de Ensino Superior (IES), que suportam os salários dos D&I e os recursos necessários para desenvolver a investigação, pagam às editoras elevados montantes pela subscrição de determinadas revistas para que os seus D&I e alunos possam ter acesso a conhecimento que foi produzido dentro da própria IES e suportado por fundos públicos. Não me ocorre outra atividade em que quem custeia a produção dos bens pague depois pela sua utilização.

Após a pandemia COVID-19, as conferências incrementaram significativamente a possibilidade de apresentação das comunicações online, perdendo-se em muitos casos, o contacto e a discussão dos trabalhos por parte de outros investigadores presentes na conferência, o que se traduzia na mais-valia da participação. Recentemente, participei numa conferência via online e que decorria presencialmente no Brasil. Ao entrar na minha sessão, apenas eu e a moderadora da sessão estávamos presentes. Esperámos alguns minutos para que entrassem mais participantes, mas ninguém mais entrou. Acabei por apresentar a minha comunicação só para a moderadora da sessão e não recebi qualquer contributo.

As EEOC não parecem preocupadas com a qualidade, conteúdo e impacto das comunicações, mas apenas com o valor que recebem de cada publicação. As comunicações são submetidas e, caso sejam aceites, os autores podem escolher uma de diferentes tipologias de registo. Por exemplo, e no caso da conferência que anteriormente referi, as tipologias de registo eram as seguintes:

- Publicação em capítulo de livro da Springer indexado à SCOPUS: 440€;

- Publicação em revista indexada à SCOPUS: 790€;

- Publicação em revista não indexada à SCOPUS: 150€.

O conhecimento científico publicado deveria ser todo de acesso aberto e sem qualquer custo para os autores e para quem financia a produção desse conhecimento. Em substituição das editoras com fins lucrativos, poderiam existir organizações internacionais públicas, as quais teriam a incumbência de organizar e disponibilizar diferentes publicações em função das diferentes áreas do conhecimento.