Pedro Moura, Expresso online

Texto de destaque: “Não somos um país rico, mas há quem acredite que podemos sê-lo se nos gerirmos melhor, e há quem queira apenas um status quo que mantenha os privilégios e a posição medíocres que conseguem obter, rejeitando tudo o que possa pôr em risco isso.”

O NHR está de volta, agora como NHR 2.0. Para quem não está a par, o Estatuto de Residente Não Habitual (Non-Habitual Residency ou NHR, em inglês) foi criado em 2009 pelo governo PS de José Sócrates para atrair rendimentos e profissionais altamente qualificados para Portugal, e terminou a sua primeira versão em 2023, por, segundo palavras de António Costa (do PS) ser uma injustiça fiscal. A maior vantagem deste estatuto seria uma taxação de IRS a taxa fixa de 20% durante 10 anos.

O grande argumento, se bem me lembro, era que o imposto não cobrado a estes contribuintes estrangeiros (por exemplo um contribuinte que ganhasse 90.000€ / ano pagaria 20% de IRS em vez de 48%) seria uma despesa fiscal extra que teria de ser arcada pelo Estado, e, por transitividade, pelos contribuintes. Este argumento é claramente imbecil, pois o imposto, mesmo a 20% devido a este estatuto, nunca seria cobrado se as pessoas não tivessem sequer vindo para Portugal, precisamente por causa do NHR.

Dizia-se também que estes ‘estrangeiros ricos’ estavam a provocar uma inflação no custo de vida de todos e a tornar muito mais difícil aos cidadãos portugueses ganharem a vida. Ou seja, terão sido eles os culpados de termos uma economia anémica que não consegue sair do buraco de baixo valor onde se encontra há décadas. Por exemplo, o aumento dos custos de habitação é totalmente culpa desta gente, não da falta de casas disponíveis no mercado por falta de investimento e excesso de complexidade burocrática-administrativa.

Parecem existir muitas pessoas que preferem um Portugal fechado, para os ‘Portugueses’ (que raio é isso?), sem que venham para cá pessoas a falar em línguas esquisitas, mesmo que digam que essas pessoas trazem mais dinheiro para o país, e, mais que isso, que são pessoas com muito ‘valor’, que podem ajudar os Portugueses a serem mais capazes, a conseguirem fazer melhor.

Esta conceção de um Portugal sem a maçada dos estrangeiros assenta nos privilégios de ‘meia dúzia’ de pessoas e famílias que ‘estão bem’, e que salvo raras exceções estão mais preocupados em não perderem o que têm que em criarem mais. Em manter as suas ‘relações’ e ‘conhecimentos’ para poderem continuar a ter os seus negócios sem grandes sobressaltos que em investir em inovação e criação de valor e ir para o mundo mostrar do que são capazes.

É gente que em vez de sonhar com o futuro e tentar construí-lo (possivelmente com a ajuda de outros de fora) prefere continuar a olhar para um passado onde penso muitos de nós não queremos estar, para um Portugal onde 25% dos trabalhadores auferem o salário mínimo; onde por muito que trabalhemos muito mais horas por ano que nos outros países (1863 horas em Portugal versus, por exemplo, 1353 horas na Alemanha, quase 3 meses de diferença..) não conseguimos sair da cepa torta ao nível da produtividade; onde os serviços-base de saúde, justiça e educação (para não falar da habitação) parecem levar-nos numa descida aos infernos, etc. Não vale a pena mais vitupérios, fazem azia.

Quando se anunciou o fim do NHR 1.0 (a meu ver uma cedência política à extrema esquerda por parte do PS para fins eleitorais) tive contacto com muitas pessoas estrangeiras que me confessaram que tal fato pôs fim aos seus planos de se mudarem para Portugal, algumas delas com o objetivo de criarem empresas aqui (geralmente como filiais locais das suas empresas). À sua pergunta de ‘porquê acabar com o NHR?’ eu confesso ter sentido uma vergonha em ser português enquanto tentava explicar que os motivos eram puramente político-demagógicos, e que mesmo assim eles deviam continuar a considerar Portugal por toda uma série de razões. Sei que a maior parte encarou o fim do NHR como uma machadada nas suas pretensões, que, sim, obviamente, eram muito baseadas em interesse fiscal (nem

O problema é que vivemos numa economia aberta e numa sociedade liberal, e se queremos continuar a fazê-lo, não podemos fazer parte desse “clube” apenas quando é confortável e não é necessário enfrentar qualquer mudança: a exposição a forças económicas e sociais externas faz parte do jogo e leva-nos a melhorar. Atrair e reter mais estrangeiros (e empresas) de elevado valor deveria ser um imperativo estratégico.

Não somos um país rico, mas há quem acredite que podemos sê-lo se nos gerirmos melhor, e há quem queira apenas um status quo que mantenha os privilégios e a posição medíocres que conseguem obter, rejeitando tudo o que possa pôr em risco isso.

Portugal precisa de pessoas estrangeiras altamente qualificadas para escolherem viver aqui. Precisamos da sua cultura, do seu conhecimento, do seu dinheiro, da sua experiência, da sua pressão e influência, da sua escolha. O NHR 2.0 é muito bem vindo, e é uma resposta cabal à quase total falta de estratégia de um Futuro para Portugal.

O NHR 2.0 apresenta desafios? Ainda bem, pois nós, portugueses, bem precisamos, para ver se saímos desta modorra que nos parece entreter os anos.

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