Óscar Afonso, Dinheiro Vivo
No passado dia 25 de junho fui um dos intervenientes na conferência "O presente e o futuro da Concertação Social", que decorreu na sala do Senado da Assembleia da República por iniciativa da Comissão de Trabalho, Segurança Social e Inclusão (CTSSI), presidida pelo doutor Eurico Brilhante Dias, iniciada pela vice-presidente do Parlamento, Teresa Morais.
Foi com muita honra que aceitei o convite para este relevante evento, onde participaram pessoas muito qualificadas no tema, incluindo representantes de topo dos parceiros sociais (as principais confederações patronais e sindicais) e convidados ilustres, designadamente José Vieira da Silva, antigo ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Luís Filipe Pereira e Joaquim Dionísio, que tiveram responsabilidades no Conselho Económico e Social, e Manuel Carvalho da Silva, antigo secretário-geral da CGTP, professor e investigador.
Resumo aqui algumas das conclusões na minha intervenção, por ser pública e porque julgo que poderá interessar a uma maior audiência. Naturalmente, sendo a intervenção curta, tive de me focar em poucos aspetos, tratando-se, por isso, apenas de uma análise exploratória, mas da qual extraí algumas propostas fundamentadas.
O desfasamento crescente entre a baixa representatividade sindical e patronal (taxas de filiação oficiais de apenas 7,1% nos trabalhadores e 12,1% nas empresas em 2022, numa marcada tendência de queda) e a alta cobertura da contratação coletiva (perto de 80% em 2022, face a menos de 40% na OCDE, sendo a nossa taxa de filiação dos trabalhadores inferior à da OCDE nos dados disponíveis), poderá estar a refletir-se numa fraca ligação entre salários e produtividade na economia, prejudicando a nossa competitividade (os nossos custos laborais por unidade produzida subiram mais do que os da União Europeia na grande maioria dos anos desde 1999, com exceção dos anos da troika e mais alguns).
A representatividade sindical e patronal é muito menor nas empresas de menor dimensão, significando que são as grandes empresas – as mais produtivas – e os representantes dos seus trabalhadores a influenciar a pouca contratação coletiva existente, que depois leva a uma elevada cobertura devido às portarias de extensão (de uma dada convenção ao conjunto do setor) e às portarias de condições de trabalho (extensão a setores similares onde não haja acordo) – aplicadas pelos sucessivos governos –, que a literatura mostra terem impactos negativos sobre o emprego.
Chamo ainda a atenção que os novos sindicatos (e movimentos inorgânicos) parecem estar a contribuir para um maior número de greves – que, em 2022, estavam no valor mais elevado desde 1999 – e menos serviços mínimos (havendo ainda um muito menor recurso dos governos à figura da requisição civil), o que alarga o impacto negativo na economia mesmo que, devido à queda da taxa de sindicalização, o número de trabalhadores abrangidos e de dias perdidos por greve seja menor do que no passado.
Proponho que seja promovida a fusão de associações quer patronais quer sindicais via incentivos – fiscais ou outros (por exemplo, ao nível dos fundos europeus) – condicionais ao incremento da formação profissional e requalificação, potenciando uma maior proposta de valor aos respetivos associados, o aumento da representatividade e, dessa forma, o reforço orgânico da contratação coletiva:
(i) Associações patronais maiores (menos fragmentadas), com maior capacidade financeira, podem aumentar o número de associados com uma maior proposta de valor (face à quota), em particular para as empresas mais pequenas (as relativamente menos produtivas) na questão fulcral da formação profissional e requalificação dos seus trabalhadores – a que estaria ligado o incentivo à fusão –, fomentando assim a produtividade e os salários;
(ii) Associações sindicais maiores (menos fragmentadas), com maior capacidade, podem também atrair mais associados com benefícios ao nível da formação dos trabalhadores menos qualificados (relativamente mais presentes nas empresas menores, as relativamente menos produtivas) – a que estaria ligado o incentivo à concentração –, fomentando assim a produtividade e, consequentemente, os salários dos empregados, mas com a condição de que o benefício para formação seja priorizado para os associados que se tornem desempregados, gerando assim um incentivo para exigências salariais mais consonantes com a produtividade das empresas.
O reforço da ligação entre produtividade e salários poderá ainda ser estimulado pelo desenho de novos mecanismos inovadores atuando sobre o conjunto da economia (inovação nas políticas públicas), substituindo com vantagem as referidas portarias de extensão e de condições de trabalho.
Ao nível do Conselho Económico e Social (CES) e da Comissão Permanente de Concertação Social (CPCS), a realização de acordos de concertação social poderá beneficiar, a meu ver, de um maior apoio da Academia na sustentação de medidas e no seu acompanhamento, contribuindo para um impacto mais positivo sobre a economia e a sociedade.
O CES prevê, no seu relatório de atividades de 2024, a realização de protocolos com a Academia, mas para a realização de estudos como tem ocorrido no passado – talvez seja possível um melhor aproveitamento dos mesmos no futuro –, pelo que a minha proposta parece ir mais além do que já é a atividade corrente e vai de encontro a várias necessidades identificadas pelo CES na análise estratégica (SWOT) desse relatório, nomeadamente no que se refere a minorar a insuficiência de recursos técnicos do CES, aumentar a sua projeção junto da Sociedade Civil e fazer face às pressões sociais (o que, na minha proposta, aconteceria por via de um maior envolvimento da Academia nas decisões).
Julgo ter contribuído para a qualidade assinalável desta conferência, que após as intervenções dos parceiros sociais e dos convidados, contou ainda com intervenções dos grupos parlamentares, a que se seguiu uma fase de debate. A sessão foi encerrada pela ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Maria do Rosário Palma Ramalho.