Pedro Moura, Expresso online

É caso para afirmar que se deitam agora na cama que fizeram. Se o povo é burro e estúpido, se dá coices e esperneia com a cruzinha no lugar errado, têm a agradecer a si próprios e à sua igreja do marasmo

O ‘status quo’ (doravante sem aspas) é um extremismo de marasmo e apatia, o extremismo é um status quo de mal-dizer e bota-abaixismo.

Ambos assentam no arregimentar, mais lento ou mais rápido, mais ou menos vocal, de conjuntos largos de gente que tende a ter pouco mais na cabeça que a satisfação das suas necessidades, sem grande preocupação por temas como o bem comum, os outros ou terem uma ideia que não um eco dos seus líderes.

Ambos são de certa forma igrejas, com os seus mandamentos, os seus dogmas, as suas formas de definir quem comunga ou não da mesma fé, a sua incapacidade de perceber que o mundo é um pouco mais diverso e complexo que a sua necessidade de entregarem a sua personalidade a um coletivo que lhes dá paz e conforto para não se sentirem totalmente perdidos e abandonados.

De um ponto de vista sistémico, estas últimas eleições tiveram a surpresa do levantamento de uma mole imensa de gente que é mais de bolos que de democracia como de bolos. Não me levem a mal o gracejo, mas num mundo de gratificações instantâneas e espírito crítico na maioria dos casos nulo, este passar-se efetivo da raiva inconsequente expressa entredentes no café do bairro para a urna de voto é um fenómeno de nota. E, note-se, comemorado com bolo em muita gente aparentemente insuspeita que de alguma forma fazendo parte do status quo, ou não teve a sorte / arte de subir nas fileiras, ou simplesmente está farta da privação de autonomia e liberdade que a pertença a essa igreja implica.

Mais interessante ainda é o status quo supra citado a rasgar as vestes com esta turba que de repente decidiu ir votar, anunciando o fim eventual da 3ª República em meio a este apocalipse de irresponsabilidade popular. É caso para afirmar que se deitam agora na cama que fizeram. Se o povo é burro e estúpido, se dá coices e esperneia com a cruzinha no lugar errado, têm a agradecer a si próprios e à sua igreja do marasmo.

Quem vive sem esperança de um futuro melhor não tem incentivo para fazer melhor, para se interessar realmente, para se informar e educar.

Quem vive agarrado à dependência do pequeno ou grande poder não tem incentivo para fazer melhor, para se interessar realmente, para se informar e educar.

Ambos os casos querem o mesmo: safarem-se, sabendo que para tal tem de eliminar a capacidade do outro de agir. O extremismo pela revolução chunga e esperança de se transformarem no próximo status quo. O status quo por manter a povaça na ignorância / indigência, na esperança que votem só uma vez na vida.

Como alguém já referiu, mais que nunca são precisos adultos na sala, pois esta criançada percebe pouco do mundo real.