Óscar Afonso, Expresso online

Naturalmente, valores mais elevados de crescimento económico – via reformas estruturais, que demoram algum tempo a produzir efeito – e nível de vida não apenas ajudam a reduzir a pobreza de forma direta, mas também se traduzem em receitas fiscais adicionais capazes de financiar um Estado Social mais desenvolvido e apoiar a franja da população em que ainda persistam as dificuldades

Seria de esperar que o modelo de redistribuição dos últimos oito anos tivesse alguns resultados para apresentar em matéria de redução de pobreza e desigualdade. No entanto, o que se verifica é que os resultados são muito escassos no comparativo europeu, apontando para a necessidade de uma reforma imediata dos apoios sociais para que sejam mais efetivos, em complemento a políticas promotoras do crescimento económico, que deve ser o principal ‘motor’ para, a prazo, retirar as pessoas da pobreza.

A percentagem de população em risco de pobreza diminuiu em Portugal desde 2015, de 26,4% nesse ano para 20,1% em 2022 (o último ano com dados, do Eurostat), mas essa descida foi a quinta menor na União Europeia (UE), ajudando a explicar que continuemos na metade de países com piores resultados, refletindo níveis de pobreza ainda intoleravelmente altos em termos absolutos e relativos.

De facto, desde 2015 Portugal tem estado sempre claramente entre os países da UE com maior proporção de população em risco de pobreza, a maior parte dos anos até no top 10 (posições 9ª, 9ª, 10ª, 10ª, 9ª, 13ª, 8ª e 12ª, de 2015 a 2022), o que é um indicador muito negativo, evidenciando as más condições de vida de uma boa parte da nossa população.

O crescimento económico dos países da UE entre 2015 e 2022 está associado a uma descida do indicador de percentagem de população em risco de pobreza no mesmo período (coeficiente de correlação próximo de -0,4). Como Portugal foi um dos países da UE com pior crescimento entre 2015 e 2022 (11º pior registo), isso ajuda a explicar o mau desempenho relativo em termos de redução do referido indicador de risco de pobreza, assim como a melhoria de posicionamento em 2022 (da 8ª para a 12ª posição), a refletir o maior dinamismo da economia nos anos mais recentes.

O problema é que o surto de crescimento económico recente decorre em larga medida de efeitos temporários, associados ao ‘boom do turismo’ – estimulado pela forte procura de viagens no pós-pandemia e a imagem de país bonito e longe do conflito da Ucrânia – e aos efeitos do PRR. Esgotados estes efeitos, o nosso crescimento potencial ao longo da próxima década continuará a ser muito fraco no contexto da UE nos dados da Comissão Europeia (Ageing Report de 2024), estimando-se que o nosso nível de vida cairá para a 23ª ou 25ª posição – a terceira pior – até 2033 na atual configuração da UE27 (face à 20ª em 2022) se não houver reformas promotoras do crescimento económico.

Taxas de crescimento económico na casa dos 3% em média anual, como as verificadas nas décadas de 1980 e 1990 do século passado, seriam suficientes para Portugal entrar na metade de países da UE com maior nível de vida em 2033, daqui a uma década (13º posição na atual configuração de 27 países da UE), enquanto valores na casa dos 2% apenas permitiriam alcançar essa meta em 2043.

Naturalmente, valores mais elevados de crescimento económico – via reformas estruturais, que demoram algum tempo a produzir efeito – e nível de vida, não apenas ajudam a reduzir a pobreza de forma direta, mas também se traduzem em receitas fiscais adicionais capazes de financiar um Estado Social mais desenvolvido e apoiar a franja da população que ainda persista em dificuldades.

Até lá, a forma mais rápida de começar a reduzir a pobreza da nossa população, a adotar o mais breve possível, é aumentar a efetividade dos apoios sociais, que se afigura baixa no contexto da UE, como se constata ao analisar um dos principais indicadores de desigualdade de rendimento antes e após transferências sociais, o coeficiente de Gini, que mede a distância à distribuição igualitária teórica.

Segundo o Eurostat, o coeficiente de Gini de Portugal após transferências sociais foi o 5º maior da UE em 2022 (32,0%), que compara com a 8ª posição em 2015 (34,0%), significando que o indicador desceu mais nos outros países e Portugal compara cada vez pior em matéria de desigualdade na distribuição do rendimento em termos relativos. Acresce que no coeficiente de Gini antes de transferências sociais estávamos em 11º em 2022, implicando uma menor eficiência e eficácia das transferências sociais em termos relativos, pois o posicionamento piora bastante após transferências sociais.

A baixa efetividade das transferências sociais é ainda mais clara tendo em conta que, em 2022, Portugal registava o 6º maior peso da função social na despesa pública no seio da UE (39,7%) – traduzindo um aumento face a 2015 (38,3%), ano em que estávamos na 10ª posição –, sendo o peso da despesa com a função social no PIB também relativamente alto (17,5% em 2022, na 12ª posição).

De notar que uma maior efetividade dos apoios sociais pode ainda promover a redução da economia paralela. Melhorias a este nível passam ainda pela redução da fiscalidade sobre os rendimentos de entrada na economia oficial, permitindo aumentar os apoios sem ultrapassar esses rendimentos líquidos.

Vejo, por isso, como muito positivas, medidas similares de aumento da efetividade dos apoios sociais inseridas no programa da Aliança Democrática (AD), em particular a proposta de “substituir um conjunto alargado de apoios sociais, sem perdas para ninguém, por um Suplemento Remunerativo Solidário – sistema de subsídio ao trabalho, com a possibilidade de acumulação de rendimentos do trabalho com RSI, pensão social, ou outros apoios sociais (…), que atenue o empobrecimento dos trabalhadores empregados e incentive a sua participação ativa no mercado de trabalho (…)”.

O programa de AD afigura-se ainda o único dos sufragados nas recentes eleições contendo medidas compatíveis com taxas de crescimento económico na casa dos 3% a médio prazo, capazes de tornar Portugal num dos países mais ricos da UE numa década e reduzir os elevados níveis de pobreza de uma forma consistente.