Jorge Fonseca de Almeida, Dinheiro Vivo

O declínio europeu está a transformar o nosso país numa economia terceiro-mundista baseada em exportações, em apoios externos (neste caso da União Europeia) com uma mão-de-obra barata e sem Estado Social relevante. E tal como nesses países, as exportações são asseguradas não por empresas portuguesas mas por multinacionais estrangeiras que aqui procuram trabalhadores a baixo custo. São exportações de baixo valor-acrescentado, pois, na maioria dos casos, apenas incorporam mão-de-obra.

O orçamento para o próximo ano mantém essa rota de declínio, consubstanciada num baixo investimento público, numa degradação adicional do sistema nacional de saúde, na continuação do abandono da educação. Em contrapartida baixa o IRS, principalmente para os indivíduos de maiores rendimentos, prescindindo de fundos que poderiam ajudar a sustentar a saúde e a educação.

De acordo com especialistas fiscais uma pessoa que ganhe cerca de 1.000 euros líquidos verá o seu rendimento aumentar por via da baixa do IRS em cerca de 12€ mensais, valor que sobre para cerca de 90€ nos últimos escalões. Um valor pouco ou nada relevante face à inflação esperada. No entanto, a perda de receitas fiscais é da ordem dos 1.200 milhões de Euros uma verba relevante se aplicada na escola - permitiria inclusive (e sobrava) recuperar todo o tempo de serviço dos professores com ganhos evidentes no funcionamento do sistema escolar.

Uma opção neoliberal sem sentido económico face à sua exiguidade. Não será com este tipo de verbas que a classe media recupera, nem que as classes altas vão aumentar o investimento.

Com o desinvestimento nas áreas sociais e na saúde (em que mais de 1,5 milhões de pessoas não tem médico de família, em que as maternidades fecham, as urgências não funcionam) o Estado Social regressa lentamente para o nível de cobertura de antes do 25 de Abril. E tal como nessa época funesta a solução que se abre às classes populares, e hoje também às classes médias empobrecidas, é a via da emigração para o centro da Europa.

A incapacidade de gestão dos governos fica bem patente na crise da habitação num país cuja população diminui e o número de casas aumenta (embora pouco) mas em que há cada vez mais pessoas a viver em barracas, pessoas sem-abrigo e pessoas a viver em casas sobrelotadas. Como é possível tal incapacidade política. Como é possível não conseguir desenhar um simples sistema de incentivo que permita alocar as casas existentes às pessoas que delas necessitam? Obviamente o orçamento não prevê qualquer mecanismo, fiscal ou outro, para resolver este problema.

Se os países do centro da Europa, por qualquer razão, nomeadamente a vitória de partidos de extrema-direita, fecharem as portas à emigração portuguesa teremos uma situação social explosiva em Portugal e, provavelmente, com a atual correlação de forças sociais, o regresso a soluções antidemocráticas.

São necessárias medidas arrojadas não medidas tímidas e prudentes. Não podemos ser a rã que nada faz quando a temperatura da água aumenta gradualmente e que acaba cozida quando poderia ter-se salvo saltando.