Óscar Afonso, Dinheiro Vivo
Ao longo das últimas décadas, o mercado de trabalho português tem vindo a sofrer alterações substanciais. Em particular, três forças têm vindo a moldar a oferta de trabalho: (i) a emigração de jovens qualificados; (ii) a receção de imigrantes menos qualificados do que os nossos jovens emigrantes; (iii) o envelhecimento da população. No seu conjunto afetam, por exemplo, a demografia, as finanças públicas e as perspetivas de crescimento a longo prazo, bem como explicam por que razão mesmo quando a economia vai mal, a taxa de desemprego não sofre alterações significativas e há até falta de trabalho com determinadas qualificações, em certas regiões.
Qualquer país normal desejaria que os seus jovens fossem cada vez mais qualificados e permanecessem em território nacional. O aumento das qualificações dos jovens não só potencia a utilização de tecnologia, como incrementa a produtividade, melhora a produção potencial e a taxa de crescimento real do PIB, e amplifica as receitas fiscais. Potencialmente, os jovens, estando na sua idade mais produtiva, tendem a contribuir mais em impostos do que recebem em benefícios, pelo que a sua ausência cria um grande "fardo" para o erário público, que é particularmente grave no contexto do endividamento existente.
Há, é certo, quem refira que a automação, fruto da tecnologia, pode reduzir o número de postos de trabalho "humanos", aumentando o desemprego. Contudo, o receio da tecnologia é sobrevalorizado e a automatização pode complementar os empregos existentes, podendo, em termos líquidos, ter inclusive efeitos positivos no mercado de trabalho e na economia; por exemplo, pode criar empregos que não existiam antes da sua adoção.
Em Portugal, infelizmente a generalidade dos jovens qualificados emigra porque, fruto das ineficiências da economia, o emprego de jovens qualificados não se traduz em melhorias significativas da produtividade e o peso da carga fiscal é tão expressivo que os jovens não beneficiam de salários para uma vida digna. Como a emigração jovem está diretamente relacionada com os aumentos das respetivas qualificações, nunca está em causa uma eventual redução de postos de trabalho "humanos", mas sim uma redução da oferta de trabalho. Daí o comportamento relativamente estável da taxa de desemprego. Ao reduzir a oferta de trabalho, pela lei da oferta e da procura, os salários deveriam ser positivamente afetados, mas em Portugal não! Refira-se, ainda, que a emigração de jovens altera a composição da sociedade e contribui naturalmente para o envelhecimento da população.
Tendo em conta a estrutura de especialização da economia em atividades não rotineiras, direcionadas para o mercado interno, que requerem atividade física (por exemplo, emprego na construção civil e em serviços manuais relacionados com o turismo), prescinde-se de jovens "nacionais" qualificados e opta-se por adultos "nacionalizados" menos qualificados e em menor número, quando uns e outros são necessários. Resultado: não é possível alterar o padrão de especialização e o país sofre uma mudança estrutural porque os fluxos migratórios afetam a situação económica, social e cultural tanto nos países de envio como nos países de acolhimento.
O envelhecimento da população é a terceira força inevitável. De acordo com o relatório da ONU sobre as Perspetivas Populacionais Mundiais de 2019, o envelhecimento da população é o processo pelo qual os indivíduos mais velhos se tornam uma parte proporcionalmente maior da população total. Decorre da emigração de jovens, da baixa taxa de natalidade e do aumento da esperança de vida. Este fenómeno limita a oferta de trabalho, a produção potencial e o crescimento económico, acentua a desertificação humana do interior, requer ações de saúde pública que atenda à população idosa, e cria grandes encargos para os sistemas de pensões: quando os benefícios dos atuais reformados são financiados pelas contribuições dos atuais trabalhadores, o fluxo migratório existente tem efeitos adversos, podendo colocar em causa a sustentabilidade do sistema de segurança social. Acresce que a previsão de aumento do envelhecimento acima do crescimento económico, coloca a dívida pública numa trajetória insustentável.
Para suportar os custos do envelhecimento restam duas hipóteses: (i) o aumento dos impostos sobre os rendimentos da população ativa o que, provavelmente, aumentaria a emigração; (ii) a redução das pensões da população idosa, quando para a generalidade dos pensionistas já são demasiado baixas. Seja como for se o envelhecimento continuar a agravar-se dificilmente a população ativa será suficiente para assegurar o futuro.