Miguel Viegas, OBEGEF
Se não houver maior transparências, estaremos condenados a esperar, de forma passiva, o próximo escândalo.
Uma nova investigação do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos, batizada de “Pandora Papers” veio revelar mais uma vez a extensão da evasão e elisão fiscal. Os números são avassaladores. De acordo com os números divulgados, estamos a falar de centenas de personalidades mediáticas, muitas delas com responsabilidades públicas, que usaram todo um arsenal de esquemas envolvendo empresas fantasmas e paraísos fiscais para desviar qualquer coisa como 9.4 trilhões de euros dos circuitos oficiais. Esta informação apenas chegou ao público graças a uma fuga de informação cuja autoria se desconhece. Se a 5ª diretiva anti branqueamento fosse levada a sério, com o acesso público aos registos dos beneficiários efetivos, certamente que outro galo cantaria.
Poucos se surpreenderam com o rebentamento, nas últimas semanas, de mais um escândalo fiscal. Os “Pandora Papers”, representa hoje mais um episódio de uma telenovela que se arrasta penosamente, para vergonha dos nossos governantes, há quase uma década. Apesar dos Offshore Leaks, Panamá Papers, Paradise Papers, LuxLeaks ou OpenLux, não se vislumbram grandes modificações ao nível do combate e prevenção destes fenómenos. Resta-nos a indignação e a espera dos próximos episódios. Os “Pandora Papers” analisaram 11.9 milhões de documentos. Nestes, identificaram 336 figuras públicas que recorreram às conhecidas empresas de consultadorias para ocultar as suas fortunas em paraísos fiscais, e realizar os seus investimentos longe do olhar do cidadão comum. Entre estas figuras, não resistimos em citar Dominique Strauss-Kahn ex-presidente do FMI e membro da Troika que impôs a austeridade em 2011. Bem prega Frei Tomás...
Na sequência dos “Panamá Papers” em 2016 e por pressão da opinião pública, a Comissão Europeia apresentou uma revisão da 4ª diretiva anti branqueamento de capitais. Nascia a 5ª diretiva anti branqueamento de capitais que impunha o acesso mais alargado do público às informações sobre os beneficiários efetivos das empresas através de um registo centralizado (ou seja, as pessoas que se encontram, de facto, por trás dessas entidades), com vista a aumentar a transparência e dissuadir a ocultação de fundos. Contudo, como é habitual nestas coisas, não há bela sem senão. Por um lado, os fundos fiduciários ficaram de fora desta diretiva. Por outro lado, a transposição desta diretiva tem sido tudo menos pacífica. Portugal encontra-se entre um grupo de 17 Estados-Membros que limitam o acesso ao registo centralizado de beneficiários efetivos. O acesso continua apenas disponível a que “demonstrar interesse legítimo” e está vedado a quem não seja advogado, solicitador ou notário.
Existem ainda alguns setores que agitam a questão da confidencialidade e do direito à privacidade para manter tudo na mesma. Contudo, colocamos a questão: podendo constituir empresas e fundações em Portugal, porque é que alguns optam por fazê-lo no estrangeiro e em paraísos fiscais?