Daniel Aguiar Espínola, OBEGEF
"Os atores políticos que dão apoio a tais planos, geralmente focados em resultados de curto prazo, almejam criar grandes impressões de cunho eleitoral, que são conhecidas após as eleições, carecendo de suporte posterior (...)"
De tempos em tempos, no campo da prevenção e do combate à corrupção, surgem novas recomendações e práticas internacionais que os governos são instados a cumprir e a dedicar esforços. Muitas nações, com maior ou menor regularidade, buscam reuní-las em um conjunto de novas regulamentações, atualizações de normativos, criações de órgãos e de estruturas especializadas, dentre outras ações, organizadas sob o formato de planos ou de estratégias nacionais anticorrupção.
Essa constante necessidade de adaptações surge das exigências cada vez mais dinâmicas da sociedade contemporânea. Os processos de globalização e de inovações tecnológicas possibilitam que, à distância, uma gama cada vez maior de atores possa praticar crimes de fraude e corrupção, assim como propiciam o surgimento de condutas criminosas, tais como os crimes cibernéticos, novas formas de lavagem de dinheiro e de suborno transnacional, etc.
Planos e estratégias nacionais, quando bem conduzidos, são importantes pontos de partida para a consolidação de uma política anticorrupção eficiente, por promoverem apoio político conjunto às medidas a serem implementadas, demonstrarem esforços nacionais de uma forma ampla, tanto interna quanto externamente, assim como por apresentarem as ações que o governo se compromete a cumprir para conhecimento de toda a sociedade.
Recentemente muitos países têm adotado novas estratégias e planos nacionais anticorrupção, como Malásia (2019), Argentina (2019), Portugal (2020) e Brasil (2020) - em todos os casos as iniciativas são apresentadas com grande destaque junto à mídia nacional e à comunidade estrangeira.
Todavia, apesar das melhores intenções, o histórico de audaciosos planos nacionais anticorrupção nem sempre é positivo. Objetivos utópicos, frutos da carência de dados confiáveis para um diagnóstico da situação atual da fraude e corrupção nos países, tendem, consequentemente, a resultar em adaptações precárias de práticas estranhas às suas realidades específicas. No afã de alcançarem metas irrealistas, os recursos inicialmente disponibilizados vão, aos poucos, sendo reduzidos ou desperdiçados, e os progressos inicialmente conquistados acabam retrocedendo.
Os atores políticos que dão apoio a tais planos, geralmente focados em resultados de curto prazo, almejam criar grandes impressões de cunho eleitoral, que são esquecidas após as eleições, carecendo de suporte posterior. Por vezes, ansiando demonstrar respostas rápidas, os governos não hesitam em criar, a todo custo, novos arranjos regulatórios e institucionais, mesmo quando estes se apresentam inadequados. As “ilhas de integridade” no setor público podem se manter firmes por algum tempo, mas correm o risco de, com a mesma velocidade, serem destruídas no futuro. O ímpeto para as mudanças culturais e estruturais mais profundas é muitas vezes perdido, assim como a credibilidade e a legitimidade dos governos ou de outros atores à frente dos trabalhos relacionados à temática.
Por outro lado, estratégias nacionais anticorrupção que podem ser consideradas adequadas são aquelas que buscam explorar sinergias externas para a implementação de padrões internacionais, aproveitando-se de especialistas e de estudos nacionais para adaptar as propostas às suas realidades e, principalmente, apoiando-se em exemplos de sucesso (e de insucesso) em países com características semelhantes. O envolvimento da sociedade civil organizada na formulação e, quando possível, na implementação de tais planos, é também um fator de grande relevância e impacto.
Por meio de uma governança de esforços conjuntos bem conduzida, garantindo o envolvimento efetivo de diversos atores, podemos esperar uma correta análise dos problemas e das particularidades do fenômeno da corrupção em cada país. Desse modo podem ser diferenciadas estratégias distintas entre setores econômicos, unidades administrativas e áreas geográficas, gerando bons indicadores e propostas mais adequadas. Da mesma forma, é necessário integrar esforços e instituições para avaliar, de forma transparente, os avanços e as falhas detectadas na implementação dos planos, para constante aperfeiçoamento das estratégias adotadas.
Em resumo, planos ou estratégias nacionais podem ser iniciativas bastante úteis para fortalecer a coordenação entre diversos atores governamentais e não-governamentais e implementar novos padrões de prevenção, detecção e remediação da corrupção, assim como para reforçar iniciativas já existentes, ressaltando que os riscos políticos e a ausência de um constante diálogo e acompanhamento pela sociedade podem fragilizar os objetivos iniciais e diminuir a confiança da população em iniciativas futuras semelhantes.