Pedro Moura, Expresso online (047 27/11/2019)
Estimado Pai Natal, como não escreverei para publicação neste jornal até ao início de 2020, opto por deixar aqui a minha Lista de Presentes para o Natal, na esperança que esta seja partilhada que alguém com mais poder que eu para influenciar a nossa realidade se contagie com estas minhas pretensões, e se sinta tentado a mexer algumas palhas. Fica a lista:
Sistema legal eficaz, acessível, justo e célere
Um must de todos os governos, mas que parece nunca melhorar. O sistema continua entupido, lento que dói, aparentemente feito mais para o pormenor administrativo que para a resolução concreta de casos, e totalmente opaco para o cidadão e empresa comuns. Todo o país corre (arrasta-se?) à velocidade deste denominador mínimo comum, e a população sente-se menos importante que o debate iluminado sobre a vírgula no artigo da lei. A impunidade amontoa-se, fomenta o espírito de que não cumprir compensa mais que cumprir, e os investidores estrangeiros olham efetivamente para nós como se fossemos um país de latitudes mais tropicais.
Pai Natal, meta-nos isto na ordem e na lei, que já cansa tanta burocracia e inépcia a tapar o sol com a peneira.
Menor peso do Estado na Economia
O Estado é claramente o Macho Alpha desta nossa curiosa tribo atlântica. Todos falam mal dele, e até se atrevem a algumas veleidades quando o Estado não está a olhar. Mas na sua presença as orelhas tendem sempre a baixar (que o respeitinho é muito bonito), e na sua ausência a congeminação sobre como obter os seus favores é exercício com mais participação que o Preço Certo, o programa da Cristina ou as aventuras do Jorge Jesus.
É errado. A percentagem da Economia em que o Estado tem papel direto ou indireto é demasiado grande, limita tudo o resto. Não me refiro às funções principais do Estado. Nessas (Justiça, Educação, Saúde, Segurança, Segurança Social) gostávamos nós todos que o Estado se focasse e aplicasse devidamente o dinheiro que lhe pagamos, providenciando o melhor serviço da forma mais eficaz e eficiente possível.
Pai Natal, por favor faz com que o Estado gaste bem o nosso dinheiro e se foque no que é essencial para a base da sociedade, deixando o resto para a iniciativa privada.
Aumento de Transparência
Um grande palavrão: “Transparência”. Tão grande que enche imensamente a boca de reis que tendem a ir nus. Transparência é como o não aumento de impostos: quanto mais se fala do tema mais o contrário tende a acontecer.
Numa era digital, em que o custo de lidar com a informação é residual, não se compreende como não há processos e registos estandardizados de assuntos como declarações de interesses, relações pessoais e profissionais de PEP (Pessoas Expostas Politicamente), negócios entre entidades públicas e privadas, influências de escritórios de advogados e empresas no parlamento, etc, etc. Tudo parece estar automatizado, mas simultaneamente tudo parece ser do mais difícil acesso.
Pai Natal, naturalmente a privacidade e o direito à reserva têm de ser acautelados (o que acontece na Lapónia fica na Lapónia). Mas não pode isso ser uma desculpa para continuarmos a ver a realidade por um vidro fosco, permitindo
Ética de Integridade, Responsabilidade e Serviço
Bem sei, esta é muito complicada. Desejar, no sapatinho, um presentão tão grande pode bem estar longe mesmos dos seus feitos miraculosos.
Tudo começa e acaba nas pessoas. Infelizmente as pessoas tendem a ter tanto de bom como de mau. E tanto se podem influenciar positivamente umas às outras, como levar à adoção de comportamentos menos úteis à sociedade como um todo. Comportamento gera comportamento. E a sensação geral é que as pessoas se estão todas ‘a marimbar’. Não sou assim tão pessimista, mas que a nossa cultural pessoal e profissional teria uma ou duas coisas a melhorar, insisto neste pedido: presenteie lá esta gente com uma cultura de integridade, responsabilidade e serviço. Integridade para que sejam críticos e exigentes com os outros e consigo próprios, e que tenham a coragem de tentarem sempre fazer o que é correto. Responsabilidade para serem homenzinhos e mulherzinhas na assunção do que lhes é devido e não sucumbam à tentação desse desporto nacional que é o ‘sacudir a água do capote’. E Serviço para que se recordem sempre que temos de ser uns para os outros, e que o que mais dignifica e valoriza cada um é o ajudar os outros, mesmo quando por vezes não se seja direta e materialmente beneficiado. Para quem acha que a sua vida por vezes enferma de significado, considero que estes três princípios de conduta podem ser um verdadeiro bálsamo existencial.
Na realidade, o que eu não quero mesmo é deixar de acreditar em si, pois tal implicaria ceder ao cinismo e perder de vez o encanto que vem da fé na possibilidade que todos temos de sermos bons. Naturalmente, perceberei se não conseguir entregar tudo o que está nesta lista. Não será por isso que deixarei a lareira acesa na noite de Natal.