Oscar Afonso, Visão on line,
Como é do conhecimento geral, a Economia Sombra ou Não Registada (ENR) é um fenómeno complexo e nem sempre directamente observado. É, por isso, de difícil medição. Tentativas de estimação directa do seu tamanho são feitas através de inquéritos estatísticos às famílias, auditorias à contabilidade de empresas, confronto entre inquéritos referentes às receitas e despesas das famílias, análise das declarações de rendimentos e sinais exteriores de riqueza. Porém, a precisão dos resultados depende da forma como o questionário ou investigação é feita e da cooperação dos inquiridos, cujo comportamento poderá ser o de não confessar e ocultar a sua participação em práticas ilegais ou fraudulentas.
Como medir então o "invisível"?
Em 2002, a OCDE distinguiu três grupos de métodos estatísticos e econométricos capazes de medir esse "invisível": métodos monetários, de indicador global e de variável latente. Nesta crónica descreve-se apenas a intuição de cada um, enfatizando as vantagens e desvantagens associadas.
Os métodos monetários estabelecem relações entre o Produto Interno Bruto (PIB) oficial e variáreis monetárias, e assumem que comportamentos destas variáveis à margem dessas relações são motivados pela ENR. Entre estes métodos há sobretudo três abordagens distintas: das transacções, do rácio moeda/depósito e da procura de moeda.
A abordagem das transacções foi desenvolvida no final dos anos 70 por Feige e baseia-se na relação constante entre as transacções de moeda e o PIB oficial. Porém, existem transacções de moeda que não estão relacionadas com a geração de rendimento e são incluídas nos cálculos. Além disso, considera que a ENR no ano base é nula ou que assume um determinado valor (ad-hoc!?).
A abordagem do rácio moeda/depósitos foi também inicialmente utilizada no final dos anos 70 por Gutmann. De acordo com este autor, o aumento relativo da moeda em circulação no período pós-Segunda Guerra Mundial estaria associado ao crescimento da ENR. Haverá, contudo, outras causas para o aumento relativo da moeda em circulação pelo que, como esperado, a conclusão de Gutmann não é unânime na literatura.
A terceira abordagem, proposta no início dos anos 80 por Tanzi, relaciona a dimensão da ENR com a procura de moeda. A crítica resulta do facto de nem todas as transacções na ENR serem pagas em moeda.
Os métodos monetários são geralmente considerados como pouco fiáveis para medir a ENR, porque se baseiam em pressupostos que não podem ser justificados, porque os resultados são sensíveis aos pressupostos do ano base e porque apresentam resultados diversos nas diferentes abordagens.
Para medir a actividade económica total de uma economia, em meados dos anos 90, Kaufmann e Kaliberda propuseram o método do consumo de electricidade, sendo este o exemplo da abordagem mais proeminente para um indicador global. Este modelo assume uma relação precisa e estável entre consumo de electricidade e o PIB global de uma economia, sendo o consumo de electricidade o indicador físico de toda a actividade económica. Comparando o PIB oficial com uma aproximação do PIB global da economia, obtém-se uma estimativa da ENR. Em particular, este método sofre das seguintes críticas: nem todas actividades da ENR necessitam de um montante considerável de electricidade, outras fontes de energia podem ser usadas, em certas actividades a relação consumo de electricidade e PIB não é estável e, face ao progresso tecnológico, o uso de electricidade é cada vez mais eficiente.
Os modelos descritos assumem pois que a ENR pode ser modelada por um pequeno número de variáveis específicas, ignorando circunstâncias e informação que levam à sua existência. Com base na teoria estatística de variáveis não observadas, o método de variável latente introduzido, na década de 80, por Frey e Weck-Hanneman considera múltiplas causas e múltiplos indicadores da ENR.
A dimensão da ENR é neste caso estimada tendo por base desenvolvimentos nas variáveis que, por um lado, afectam o tamanho e o crescimento do produto da ENR e, por outro lado, são o rasto das actividades da ENR na economia oficial. Este método usa uma técnica que permite uma análise transversal da relação entre uma variável dependente não observada e uma ou mais variáveis independentes observadas. Como a variável não observada não é conhecida, é substituída por um conjunto de indicadores.
Frey e Weck-Hanneman, por exemplo, começaram por definir como variáveis explicativas da dimensão da ENR a actual carga de impostos, a percepção da carga de impostos, a taxa de desemprego, a burocracia, a atitude dos agentes económicos face ao pagamento dos impostos e o rendimento disponível per capita. Quanto ao rasto das actividades da ENR na economia oficial, definiram como indicadores a taxa de participação da população masculina na força de trabalho, o número de horas trabalhadas por semana e o crescimento do PIB.
Este método tem sido sobretudo criticado pelas variáveis explicativas escolhidas, pela dificuldade em quantificar determinadas variáveis (como, por exemplo, a atitude dos agentes económicos face ao pagamento dos impostos) e pela instabilidade dos resultados.
Em suma, cada metodologia tem pontos fortes e fracos não havendo uma capaz de assegurar com exactidão a medição da ENR. Por conseguinte, no âmbito da investigação em Economia, não deixa de ser motivador e premente o desenvolvimento de uma nova metodologia capaz de ultrapassar as lacunas existentes.