Henrique Santos, Visão on line,
É verdade, por incrível que pareça, em conjunto com os meus colegas de trabalho, semanalmente jogo no euromilhões. A parca contribuição de cada um não chega a um euro, e eu, fiel crente, esporadicamente jogo on-line no mesmo!
Dada a minha formação, sobretudo académica, conscientemente não devia jogar no euromilhões, ou em qualquer outro jogo cuja probabilidade de me sair qualquer prémio seja, na realidade, igual a zero. Este zero anda na minha cabeça desde que me fascinei pela estatística e sobretudo pelas probabilidades. Logo que tive as ferramentas iniciais da área da estatística, dos cálculos mais cobiçados entre todos, era saber qual a probabilidade de me sair o totoloto. Bem, recorrendo, de forma simplista, a uma combinação de 49 números seis a seis, facilmente concluímos (eu e os meus colegas que assistimos à ratificação dos cálculos pelo nosso professor), que a probabilidade de me sair o totoloto era um arredondado zero!
Se até então ainda jogava o totoloto, de imediato deixei de o fazer.
Confesso que passaram alguns anos sem jogar qualquer destes jogos, até que surgiu o euromilhões, e alguém me aliciou. De imediato quis acreditar na ideia [errada] que se jogasse ou "me saía", ou "não me saía". Prefiro crer nesta probabilidade de 50% tão simpática, em que eu tenho sempre o azar de não me sair. Claro que, entretanto, já tinha verificado que as hipóteses de ganhar o euromilhões face ao totoloto eram infinitamente menores, mas não podia desanimar os colegas abdicando de participar no nosso grupo de jogo, nem tão pouco deixar de fazer alguém feliz, pois, conforme veiculam os Jogos Santa Casa "se ganhar fará muita gente feliz, se não ganhar também".
Por estranho que pareça, até aqui tudo bem, não fosse no fim do ano transacto assistir ao sorteio do euromilhões pela televisão e ouvir a apresentadora dizer algo do género "este sorteio é acompanhado por auditores independentes que garantem a legalidade do processo". Quero acreditar que sim, mas:
- O concurso é realizado em directo?
- Esses auditores verificam o peso das bolas, os mecanismos de sorteio e tudo o resto?
- Quem são esses auditores? Quais as suas obrigações? Como fazem a auditoria ao concurso?
Não é por nada (peço desculpa pela simplicidade da expressão), mas eu já vi um sorteio em directo do totoloto, em que estava presente o júri do concurso (também composto por um representante do Governo Civil) que garantia a legalidade do processo, e ficou incrédulo quando, bem à sua frente, saiu a bola com o número zero, e o sorteio nem sequer contemplava tal número (e, pretensamente, foi esse mesmo júri que colocou as bolas na tômbola). Também já vi muitas equipas de auditoria que, ou não desenvolviam o seu trabalho, o faziam à medida, ou ainda que o desenvolvendo bem (de acordo com o solicitado), não era, de facto, o adequado face às reais necessidades.
Não fiz, conscientemente, qualquer investigação sobre o procedimento para verificar a dita legalidade, mas fá-lo-á o comum dos mortais? Refiro, inocentemente, que os Jogos Santa Casa fazem questão de salientar a importância do papel dos auditores independentes no sorteio. Será que se não o fizessem alguém colocaria em causa o procedimento?
Prefiro acreditar que a probabilidade de me sair o grande prémio é 50%, e eu é que tenho azar. Mas como farei sempre alguém feliz (e isso tenho 100% de certeza que é verdade), então prefiro jogar, não vá o euromilhões ter a ousadia me contemplar (se ele ler esta crónica acho que jamais me visitará).
Lançando o rastilho para quem o quiser apagar, e porque pelo resto não me pretendo deixar influenciar, de facto jogo no euromilhões porque a probabilidade de me sair é zero! Que outra razão teria para o fazer?
E sim, este ano já voltei a jogar no euromilhões… até agora continuo a acertar nos 50% errados.