Fernando Costa Lima, Visão on line,
A exigência de idoneidade a accionistas e dirigentes das instituições financeiras é por demais evidente, dado tratarem-se de entidades que lidam com o dinheiro dos outros e sem que estes tenham, a maioria das vezes, qualquer interferência no modo como aquelas o usam.
No Relatório de Supervisão Comportamental referente a 2007, o Banco de Portugal escreve, a dado passo: "A intervenção pública através da actuação de uma entidade reguladora e de supervisão procura reduzir todos estes custos de transacção e dar segurança aos consumidores através dos seguintes tipos de actuações: obrigatoriedade de divulgação de informação sobre os produtos; regras sobre a integridade e idoneidade das instituições financeiras e dos seus empregados; padrões sobre as competências elevadas que as instituições devem possuir; requisitos a que deve obedecer a publicidade e comercialização de produtos financeiros; normas sobre práticas comerciais equitativas." (pág. 13, sublinhado meu).
Basta fazer uma pesquisa a toda a legislação e regulamentação das actividades financeiras em Portugal, bem como à correspondente legislação comunitária que a suporta, para verificarmos que a palavra idoneidade (associada a requisitos de exigência de idoneidade) surge um sem-número de vezes. De todas as referências, provavelmente a mais emblemática é o artigo 30.º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (RGICSF) que, para além de exigir idoneidade aos membros dos órgãos de administração e fiscalização, refere no seu n.º 2: "Na apreciação da idoneidade deve ter-se em conta o modo como a pessoa gere habitualmente os negócios ou exerce a profissão, em especial nos aspectos que revelem incapacidade para decidir de forma ponderada e criteriosa, ou a tendência para não cumprir pontualmente as suas obrigações ou para ter comportamentos incompatíveis com a preservação da confiança do mercado."
Todo este arrazoado vem a propósito da constatação que faço de que os reguladores não têm usado a arma da falta de idoneidade para excluir do sistema pessoas e entidades que, de forma reiterada e ao longo dos anos mostraram "tendência para não cumprir pontualmente as suas obrigações ou para ter comportamentos incompatíveis com a preservação da confiança do mercado". Dito doutra forma, os reguladores apenas permitem a entrada no sistema de pessoas e entidades que, à partida, não exibem nenhum sinal manifesto de falta de idoneidade, mas parecem não tirar as devidas consequências dos comportamentos do dia-a-dia dessas pessoas e entidades, parecendo, pelo contrário, ficar reféns em exclusivo do que refere o artigo 70.º do RGICSF, i.e. apenas actuam quando o próprio ou a instituição em que trabalham, se acusam.
Sou pois de opinião que os reguladores devem passar a usar sem condescendência e sem tibiezas a arma da falta de idoneidade, não apenas à entrada mas durante o exercício dos respectivos cargos e actividade, para eliminar do mercado as pessoas e entidades que, pelos seus actos e comportamentos, põem em causa o bom nome e a reputação de todo o sistema financeiro.
Exige-se, para bem do sistema e para a manutenção da confiança dos aforradores no sistema financeiro, uma acção pronta das autoridades de supervisão, não me parecendo que a solução passe pela forma como, por exemplo, o Conselho Nacional dos Supervisores Financeiros (CNSF) tem abordado o assunto, a avaliar pela seguinte afirmação "o CNSF aprovou ainda em 2007 o desenvolvimento de um conjunto de medidas em sede de "Idoneidade e Experiência Profissional". É de salientar a adopção de um questionário comum de comunicação da informação relevante para a verificação dos requisitos de idoneidade e experiência, acessível nas respectivas páginas na internet, consagrando, adicionalmente, o dever de renovação periódica da informação e a convergência dos critérios de avaliação da idoneidade dos membros dos órgãos de administração e fiscalização." (Relatório de Actividade e Contas da CMVM - 2008, pg. 17).
Como já referi, parece-me uma visão limitada do papel dos reguladores em matéria de verificação e acompanhamento da idoneidade.
PS: Reflexão a propósito da afirmação do antigo director do Departamento de Supervisão do Banco de Portugal, no dia 20 de Janeiro de 2009, na comissão parlamentar de inquérito: "Neste momento, face ao conhecimento que existe dos procedimentos desenvolvidos ao longo de uma série de anos, considero que efectivamente há dúvidas sobre a idoneidade" de Oliveira e Costa enquanto administrador do BPN. (Com base na notícia publicada no site http://tsf.sapo.pt em 20 de Janeiro de 2009)