Glória Teixeira, Visão on line
Acabo de regressar de Londres onde apresentei um trabalho, em conferência organizada pela Universidade de Londres, dedicado às trocas de informações fiscais e da sua crescente importância num mundo cada vez mais global.
Por coincidência, a imprensa inglesa noticiava mais um encontro dos G8, desta vez dedicado ao combate contra a fraude fiscal, e alertava para o problema dos países mais pobres que perdem mais com a fraude fiscal do que aquilo que recebem a título de ajuda financeira.
Paralelamente, nos países desenvolvidos, multinacionais como a Google, Apple, Starbucks tem estado debaixo de fogo pela sua sujeição a uma reduzida carga tributária, pedindo-se mais justiça fiscal e menos sacrifícios aos pequenos e médios contribuintes.
A alteração deste estado de coisas passa não apenas pela introdução de mais e melhor legislação fiscal (veja-se, nomeadamente o crescente número de tratados, multilaterais e bilaterais, e directivas dedicados às trocas de informações fiscais entre os estados) mas também pela progressiva implementação de medidas que obriguem determinadas categorias de contribuintes a divulgar publicamente os rendimentos que auferem.
Os estados têm vindo a atacar esta frente também mas com esforço e dificuldades acrescidas, exigindo-se uma autoridade tributária cada vez mais e melhor apetrechada, de forma a cobrir as situações de risco e que exigem uma atenção redobrada.
Se, ao nível dos contribuintes singulares assistimos a alguns progressos, visíveis no crescente número de condenados, no país e no estrangeiro, por crimes de fraude fiscal, ao nível das multinacionais muito haverá para fazer, especialmente em sede de preços de transferência, com uma mais justa alocação das receitas ou proveitos fiscais aos países da fonte ou ao território onde são gerados ou produzidos esses rendimentos.
As organizações internacionais têm chamado a atenção para estas injustiças flagrantes, nomeadamente com a utilização por parte de algumas multinacionais de países com zero ou reduzida tributação (veja-se o mais recente relatório da OCDE, de abril de 2013, 'Restoring fairness to the tax system').
Se é certo que os países são soberanos, podendo escolher o nível mais adequado de tributação, não poderão, todavia, os contribuintes, artificialmente, alocar proveitos a jurisdições de reduzida tributação, com o fim último de não pagar os impostos devidos.
Os casos 'Apple', 'Microsoft' e 'Hewlett-Packard' evidenciam os recentes esforços dos EUA em impedir possíveis manobras abusivas encetadas pelas multinacionais, nomeadamente a utilização de acordos de partilhas de custos entre empresas e a negociação de taxas preferenciais de IRC com alguns governos (veja-se, de acordo com as informações fornecidas pelo 'Tax News Service' do IBFD, a negociação de uma taxa de IRC inferior a 2%, para algumas multinacionais, por parte do governo irlandês, quando a taxa legal é de 12%).
A luta contra a utilização dos paraísos fiscais foi recentemente reforçada, com uma operação conjunta desencadeada pelos EUA, Reino Unido e Australia, que visa divulgar as empresas, beneficiários e consultores fiscais envolvidos neste tipo de planeamento fiscal abusivo. Foram identificados centenas de beneficiários que estão presentemente a ser investigados pelas diferentes autoridades fiscais daqueles países.
Estima-se ainda que os níveis de 'fuga' aos impostos são extremamente elevados nos diferentes países (no Reino Unido, por exemplo, aponta-se para valores na ordem dos 70 biliões de libras).
Igualmente não devem os estados, artificialmente através das chamadas ajudas de estado, conceder benefícios fiscais a grandes multinacionais que podem e devem pagar os seus impostos.
No entanto, a realidade mostra-nos que esta luta ainda está longe de ser ganha.
O caso mais flagrante foi a atribuição de uma taxa reduzida de IRC, pelo estado francês, a uma grande empresa multinacional francesa na área energética que, não obstante a queixa apresentada pela Comissão Europeia que alertava para a existência de uma ajuda de estado inaceitável e ilegal, logrou vencimento mesmo junto do Tribunal de Justiça da União Europeia. A taxa reduzida manteve-se e a Comissão Europeia perdeu o caso.
Os impostos são o preço que temos a pagar por uma sociedade civilizada e estes devem ser pagos por todos os contribuintes, sem exceções ou regimes preferenciais.