António João Maia, Expresso online

Se os cidadãos pagam impostos (e têm de os pagar, para que o Estado e as suas estruturas executem as suas funções ao serviço dos mesmos cidadãos), importa que sintam que eles são efetivamente aplicados para os servir, o que se traduz desde logo na qualidade da prestação do serviço público

Há poucas semanas, por razões de trabalho, desloquei-me à Áustria, mais concretamente a Viena, para uma reunião com representantes de diversos países num projeto europeu.

Os trabalhos perduraram por três dias, durante os quais, nomeadamente para me deslocar entre o hotel e o local das reuniões, utilizei os transportes públicos da cidade, que se articulam numa rede, que me pareceu muito eficiente e eficaz, que é integrada, de entre outros, pelo metropolitano, por autocarros e por metro de superfície.

Utilizei particularmente o metropolitano, e tive oportunidade de constatar que circula sempre no horário previsto, e que em cada paragem se indica o tempo de espera até ao próximo veículo, que durante o dia é de 3 minutos e à noite de 6 minutos, tempos que foram sempre cumpridos escrupulosamente.

Ao circular nele, num dos dias, dei por mim a considerar como em Portugal nem sempre é assim, nomeadamente nos comboios pendulares que costumo utilizar, que diariamente transportam milhares de utentes entre os subúrbios e o interior das grandes cidades, que circulam muitas vezes atrasados, outras vezes são simplesmente suprimidos, e outras ainda estão parados devido a greves dos trabalhadores.

Bem sei que estou a comparar o incomparável – uma experiência de três dias, com uma vivência permanente em Lisboa. E também sei que é muito português tendermos a ver “a galinha da vizinha mais gorda do que a nossa”. Mas ainda assim, e com toda a sinceridade objetiva, fiquei impressionado com o grau de organização, de eficiência e de qualidade evidenciadas pela rede de transportes da cidade, o que por certo será um sinal da capacidade de organização da sociedade no seu todo.

No intervalo de uma das reuniões, dei nota do agrado que sentia pela forma eficiente como os transportes públicos funcionavam, o que foi logo corroborado por colegas de outros países, ao que um dos austríacos afirmou que os cidadãos do seu país pagam impostos muito elevados, das maiores taxas da Europa, mas que o fazem sem desagrado por saberem e sentirem que os serviços públicos lhes devolvem qualidade nas funções que executam.

Considero que a explicação que o colega austríaco apresentou é muito pertinente e faz todo o sentido. Efetivamente, se os cidadãos pagam impostos (e têm de os pagar, para que o Estado e as suas estruturas executem as suas funções ao serviço dos mesmos cidadãos), importa que sintam que eles são efetivamente aplicados para os servir, o que se traduz desde logo na qualidade da prestação do serviço público.

Se, ao contrário, sentirem que esse esforço não é devidamente devolvido em serviços de qualidade, sentem-se defraudados e, muito provavelmente, também com sentimentos de legitimação para não contribuírem, para se eximirem ao pagamento de impostos.

Claro que a questão não pode ser avaliada assim de forma tão simplistas, na medida em que ela inclui muitas outras componentes que importa ter em consideração. Mas esta formulação simplista, pode de facto ser perspetivada numa lógica muito linear de custo/benefício, que é a maneira mais fácil do cidadão comum a perceber. Até porque, como sabemos, ela tem sido utilizada e explorada em muita argumentação no campo do debate ideológico (por vezes demagógico) sobre que modelo de Estado melhor nos serve e estamos dispostos a pagar.

Relativamente ao modo como os portugueses encaram a questão do pagamento de impostos e a sua relação com o financiamento do Estado, parece-nos relevante apresentar alguns resultados curiosos que foram alcançados através do estudo Motivações na esfera do (in)cumprimento fiscal de Tânia Silva, apresentado em 2018 ao Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, que revelou que: apenas 63% das pessoas consideram que os impostos que pagam se destinam a financiar o funcionamento dos serviços públicos; 23% assume que paga impostos por acreditar que os outros o fazem de forma honesta; e 57% paga impostos por se sentir forçado nesse sentido.

A finalizar apresentamos a tabela com o valor da carga fiscal sobre o rendimento bruto (PIB) registado em 2023 nos países da União Europeia, segundo a EUROSTAT, que nos permite perceber que a Áustria é o 4º país com a taxa mais elevada, com 43,5%, e que Portugal é o 13º, com um valor de 37,6%, e que o valor da taxa média dos países da União Europeia é de 40%.

Porque pagamos impostos e para que servem?