Jorge Fonseca de Almeida, OBEGEF
Ganha a confiança, a vítima, crédula na patranha que o criminoso lhe conta, está pronta a agir com base na falsa informação recebida. Caiu que nem um patinho na armadilha. Vai agir livremente contra o seu próprio interesse. Vai entregar os seus bens, a sua liberdade, a sua consciência, o seu apoio, o seu voto sem a menor suspeita de que está a ser enganada.
Um deputado do Chega foi apanhado pela Polícia que depois de executar um mandato de busca em casa dele o acusa de furto de malas nos aeroportos. Uma investigação jornalística descobriu depois uma conta de um sítio da internet de venda de objetos em segunda mão onde o suposto larápio monitorizava o saque. A ser verdade, e nada nos faz suspeitar que as autoridades não levaram a cabo uma investigação impoluta, quão baixo pode a classe política chegar? Estamos no grau zero da indignidade. Mas claro que se pode descer ainda mais. Após a denúncia em vez de confessar, pedir desculpa e de se retirar para uma cela prisional o deputado do Chega resolveu manter-se em funções, como representante dos Açores na Assembleia da República. Pobre região, representada por tal personalidade.
A fraude maior é a do Partido que propõe um individuo destes para deputado, um partido que o escolhe e o vende como “português de bem”. Uma pessoa que, segundo a Polícia, se apodera desavergonhadamente, perante as camaras de videovigilância, dos haveres dos outros. Ora vender gato por lebre é uma fraude conhecida.
Já não estamos perante o truque sofisticado, longe da subtileza da mudança da vírgula, do conflito de interesses no limite do duvidoso, mas do simples furto descarado. Do crime mais simples e rasteiro. Quem pode alcandorar a lugar elegível esta personalidade.
O teatro, sabendo que o larápio é inamovível do seu posto na Assembleia da República o líder do Chega monta uma rábula curiosa. Chega dos Estados Unidos onde esteve a ouvir o discurso inaugural de Trump, chama o deputado e diz-lhe que se se demita ou suspenda o mandato. Depois perante a mais que expectável recusa deste, faz-se de vítima e quer fazer parecer que o Chega lavou a honra. Uma fraude política.
Que diria Ventura se a Lei fosse como a sua? Que diria se o Juiz perguntasse ao ladrão: Quer ir preso ou suspender a sua liberdade? E se o ladrão respondesse nenhuma das duas se limitasse a mandar expulsá-lo do Tribunal. Que mascarada de Justiça seria essa?
Que força tem um líder partidário que não consegue que um deputado do seu partido se retire? Recordo o estilo de presidencialismo francês. Antes de nomear um qualquer Primeiro-Ministro o Presidente francês pede-lhe uma carta de demissão com a data em branco. Se pretender afastar o primeiro-ministro o Presidente só tem que preencher a data do documento já em seu poder. Um processo simples e eficaz. Outros existem. Só Ventura não tem nenhum. Ingenuidade ou fraude política?
Estes dias trazem-nos de volta a profunda vergonha de sermos representados por este tipo de aldrabões. De todo o mundo civilizado, do Norte ao Sul do globo, estar a ver e o mais importante órgão da democracia (com letra pequena) portuguesa não ter, ou tendo-os não os ativar, os mecanismos para se libertar deste tipo de personagens. Que pensar da restante classe política que aceita este tipo de indivíduos e os considera seus pares, isto é seus iguais e os senta no banco dos altos representantes da nação? Será esta democracia uma enorme fraude?