Miguel Abrantes, Jornal i online
Quatrocentos anos após a bolha especulativa das tulipas holandesas, temos a bolha especulativa dos NFT, que tem igualmente potencial para uma queda brusca dos preços com consequências ainda imprevisíveis
No século XVII, nos atuais Países Baixos ocorreu aquela que foi considerada a primeira bolha especulativa da história: a febre das tulipas.
No século de ouro dos Países Baixo as tulipas atingiram valores extraordinariamente elevados. O incremento dos preços começou em 1620 e o mercado entrou em colapso em 1637.
No auge dos preços um simples bolbo de uma variedade famosa de tulipa poderia custar muitos milhares de florins neerlandeses. Algumas variedades podiam custar mais que uma casa em Amsterdão. Dizia-se que um bom negociador de tulipas conseguia ganhar seis mil florins por mês, quando o vencimento médio anual era de 150 florins. Um bolbo de tulipa passou a ser vendido pelo preço equivalente a 24 toneladas de trigo.
Naquela época, as tulipas eram vendidas em bolsas de valores em muitas cidades holandesas. O comércio das tulipas era encorajado por todos os membros da sociedade, muitas pessoas vendiam casas e terrenos com a intenção de especular no mercado de tulipas.
Alguns especuladores tiveram elevados lucros, enquanto outros perderam tudo o que tinham.
Os negociantes passaram a vender bolbos de tulipas que tinham acabado de plantar ou que tencionavam plantar (os chamados contratos futuros de tulipas). Mas a partir de fevereiro de 1637, o preço das tulipas começou a diminuir de uma forma brusca e, rapidamente, a negociação em bolsa entrou em colapso.
As tulipas, economicamente, consistiam em bens que não tinham nenhum valor inerente. Pois, não consubstanciavam o capital de empresas, nem dívida de entidades públicas ou privadas.
Pelo contrário, as tulipas eram (e continuam a ser) um bem perecível, que depois de serem colhidas têm de ser imediatamente colocadas em vasos e regadas três vezes por dia, sem deixar que a terra fique encharcada, além de que também não podem apanhar sol nem calor em excesso.
O único motivo que levou as tulipas a atingiram preços extraordinários, foi a vontade de especular para enriquecer rapidamente.
Atualmente também existem bens que não têm valor intrínseco, o valor é-lhes atribuído, unicamente, pela vontade em especular e enriquecer rapidamente. Os NFT encontram-se nesta categoria.
NFT significa «non fungible token». Consistem, assim, em «tokens». Ou seja, códigos numéricos com registo de transferência digital, não fungíveis, não podendo, por isso, ser substituídos por outros de natureza idêntica.
Na prática, são itens colecionáveis, que não podem ser reproduzidos, mas apenas transferidos. Ao contrário das criptomoedas, os NFT não são mutuamente intercambiáveis.
Os NFT representam, assim, um bem específico e individual, que não pode ser substituído, tal como um quadro um uma escultura. Estes ativos, podem representar qualquer bem, real ou intangível, incluindo trabalhos artísticos ou vídeos, sendo atribuído um código ao legítimo proprietário.
Nas obras de arte (como as pinturas), pode haver vários quadros iguais, mas apenas um é o original. No caso dos NFT também podem existir vários exemplares iguais, mas apenas aquele que tem o código de autenticidade associado é o original e tem valor associado.
Apesar da garantia de autenticidade atrás referida, é imprevisível o interesse que futuramente os NFT irão continuar a despertar. Caso venha a suceder uma repentina perda de interesse nestes ativos, quem investiu nos mesmos pode perder o investimento efetuado.
Quatrocentos anos após a bolha especulativa das tulipas holandesas, temos a bolha especulativa dos NFT, que tem igualmente potencial para uma queda brusca dos preços com consequências ainda imprevisíveis.