Óscar Afonso, Dinheiro Vivo

No passado dia 17, o Parlamento português foi palco de um debate intenso sobre o Estado da Nação. Este debate, realizado anualmente, evidenciou as divergências entre os principais partidos políticos e sublinhou os desafios e oportunidades que Portugal enfrenta. Esta crónica visa analisar as intervenções dos líderes partidários, a dinâmica do debate e as implicações para o futuro político e económico do país.

O primeiro-ministro, também líder do PSD, abriu o debate com uma estratégia clara: mostrar que o Governo está pronto para liderar e colaborar. Ao anunciar um dia antes do debate que iniciará as negociações do Orçamento de Estado para 2025 (OE 25) com os partidos apenas dois dias após o debate, procurou desfazer as críticas de falta de diálogo e reduzir a crispação política. Esta jogada foi uma resposta imediata ao anúncio de Pedro Nuno Santos (PNS), líder do PS, que se mostrou disposto a negociar de boa-fé, mandatado pela Comissão Nacional do PS para tal. A prontidão do primeiro-ministro em avançar com as negociações sinaliza uma tentativa de reposicionar o Governo e o PSD/AD como abertos ao diálogo e à cooperação, características essenciais num contexto político cada vez mais polarizado.

O primeiro-ministro começou por garantir que o Governo está a cumprir os compromissos assumidos no Parlamento. Entre as medidas destacadas, mencionou a proposta de redução do IRS, que, embora chumbada pela oposição, foi cumprida pelo Governo. Esta medida foi apresentada como um esforço para aliviar a carga fiscal sobre os cidadãos. Além disso, destacou os esforços do Governo para pagar aos fornecedores, negociar com professores e outras classes profissionais, e abrir a Concertação Social para discutir aumentos de rendimentos. Estas ações foram apresentadas como exemplos do compromisso do Governo com a estabilidade e o desenvolvimento económico.

No entanto, a intervenção do primeiro-ministro não ficou isenta de críticas ao PS. O líder do PSD acusou o PS de se aliar ao Chega para governar a partir do Parlamento, uma opção que considera desleal e não séria na atividade política. Esta acusação visou sublinhar a necessidade de um alinhamento mais coeso entre os partidos tradicionais, evitando a influência de forças políticas extremistas. Argumentou que a colaboração entre o PS e o Chega mina a confiança nas instituições democráticas e compromete a capacidade do Parlamento de funcionar de maneira eficaz e transparente.

PNS, por sua vez, respondeu às críticas com uma retórica igualmente contundente. Acusou o primeiro-ministro de arrogância, sublinhando que as derrotas nas europeias e as sondagens deveriam ter levado a uma atitude mais humilde. Enfatizou que, apesar dos desafios, Portugal está a crescer acima da média europeia, mas que é necessário acelerar a transformação e diversificação da economia. Este ponto é crucial num contexto global onde a competitividade e a inovação são determinantes para o crescimento sustentável. Defendeu uma visão estratégica que inclui setores como energia, mobilidade, metalomecânicas e saúde, áreas que considera fundamentais para o futuro económico de Portugal.

Um dos pontos mais controversos do debate foi a proposta de redução do IRC, que PNS criticou. Ele argumentou que esta medida beneficiaria principalmente as grandes empresas, sobretudo da banca, e grande distribuição, questionando a eficácia da mesma para o desenvolvimento económico mais amplo e considerando que “redução de IRC transversal e sem critério é errada, injusta e ineficaz”. É conhecida a sua posição a este respeito, defendendo a redução do IRC condicional à criação de emprego, investimento e modernização das empresas.

O primeiro-ministro, no entanto, defendeu a redução do IRC como uma medida necessária para atrair capital físico e humano qualificado. Segundo Montenegro, o modelo de desenvolvimento do PS não vingou devido ao baixo crescimento económico do país neste milénio (onde o PS governou grande parte dos anos) e é urgente criar um ambiente mais favorável ao investimento. Manifestou disponibilidade para discutir soluções estratégicas, lembrando o acordo de 2014 entre PSD/CDS e PS para a redução do IRC e desafiando PNS a um consenso semelhante. Argumentou que a maioria das empresas beneficiárias da redução do IRC seriam PME, contrariando a narrativa de que esta medida favoreceria apenas as grandes corporações. Este ponto é central para a argumentação do primeiro-ministro, que procura mostrar que a sua visão de desenvolvimento económico é inclusiva e beneficia a maioria dos portugueses.

A redução do IRC é consensual na literatura económica do crescimento económico como uma medida que pode estimular o investimento e a criação de emprego. Ao diminuir a carga fiscal sobre as empresas, estas ficam com mais recursos para reinvestir no negócio, aumentar a sua competitividade e contratar mais trabalhadores. Isto é particularmente importante num país como Portugal, onde as PME representam o grosso do tecido empresarial e a dimensão média das empresas é muito inferior à das congéneres europeias, sendo a falta de escala uma grande desvantagem que penaliza as nossas empresas e a competitividade da economia. A diminuição do IRC pode, assim, contribuir para um ambiente económico mais dinâmico e competitivo, atraindo não só investimentos nacionais como também internacionais.

Apesar das divergências, houve pontos de concordância. Ambos os líderes reconheceram a necessidade de reformar a Administração Pública e combater a burocracia, problemas que têm sido obstáculos persistentes ao desenvolvimento económico e à eficiência governamental. Houve, pois, algum consenso quanto a áreas onde a cooperação interpartidária pode ser frutífera.

O Governo destacou-se pelos acordos com professores, funcionários judiciais e forças de segurança, bem como pela decisão sobre a localização do novo aeroporto – que resultou de uma articulação com o PS, na altura ainda liderado por António Costa. Outras medidas importantes incluem a recuperação de listas de espera na saúde, o alargamento do Complemento Solidário para Idosos e a apresentação de uma Agenda Anticorrupção. Estas iniciativas foram apresentadas como evidências de um Governo que está a trabalhar ativamente para melhorar a qualidade de vida dos cidadãos e reforçar a confiança nas instituições.

Contudo, persistem desafios significativos. A falta de um programa abrangente de combate à burocracia e uma reforma profunda e eficaz da Administração Pública são questões prementes. Além disso, a retirada de discussão parlamentar das medidas de IRS Jovem e desagravamento do IRC, apesar de anunciada como uma estratégia para facilitar a aprovação do orçamento, poderá ter um impacto negativo se não forem alcançados consensos duradouros. Estas medidas são vistas como essenciais para atrair e reter talento jovem no país, um fator crítico para o futuro económico de Portugal.

A confiança e a estabilidade são fundamentais para a atração de investimentos e para a retenção de capital humano. Um acordo interpartidário pode garantir a continuidade destas políticas, evitando a incerteza e a instabilidade que têm marcado a política económica portuguesa. Para que medidas como a redução do IRC e o IRS Jovem tenham um impacto significativo, é crucial alcançar consensos entre os principais partidos. A capacidade de negociar e encontrar soluções comuns será determinante para o sucesso destas políticas e para o futuro do país.

O debate sobre o Estado da Nação revelou um Governo empenhado em cumprir os seus compromissos e uma oposição crítica, mas disposta a negociar, de um modo geral. A antecipação das negociações do Orçamento do Estado é um passo positivo, mas será necessário mais diálogo e compromisso para enfrentar os desafios económicos e sociais de Portugal. A colaboração entre os partidos pode ser a chave para desbloquear novas oportunidades de crescimento e desenvolvimento, colocando os interesses nacionais acima das divergências partidárias.

Outro ponto de grande destaque no debate foi a questão da saúde, que continua a ser uma das principais preocupações dos portugueses. PNS criticou a falta de investimento adequado no Serviço Nacional de Saúde (SNS), sublinhando que é necessário não só aumentar o financiamento, mas também melhorar a gestão e a eficiência dos serviços. Argumentou que o subfinanciamento crónico do SNS está a levar a um aumento das listas de espera e a uma diminuição da qualidade dos cuidados prestados. Defendeu a implementação de um plano de recuperação que inclua a contratação de mais profissionais de saúde, a modernização das infraestruturas e a digitalização dos serviços, medidas que são essenciais para garantir um SNS sustentável e de qualidade.

O primeiro-ministro, por sua vez, reconheceu os problemas no SNS, mas criticou a abordagem do PS, argumentando que o aumento do financiamento por si só não resolverá os problemas estruturais do sistema de saúde. Defendeu a necessidade de uma reforma mais abrangente, que inclua a promoção de parcerias público-privadas e a introdução de mecanismos de gestão mais eficientes. Sublinhou que é essencial criar um sistema de saúde que seja capaz de responder às necessidades da população de forma eficaz e sustentável, e que para isso é necessário implementar reformas corajosas e inovadoras.

A educação foi outro focodo debate. PNS destacou a importância de investir na educação como um motor de desenvolvimento económico e social. Argumentou que é essencial garantir o acesso universal a uma educação de qualidade, desde o ensino básico até ao superior, e que para isso é necessário aumentar o financiamento e melhorar as condições de trabalho dos professores. Defendeu a implementação de programas de formação contínua para os professores, a modernização das infraestruturas escolares e a renovação de currículos, de modo a preparar os alunos para os desafios do século XXI.

O primeiro-ministro concordou com a importância da educação, mas criticou o que considera ser a falta de visão estratégica do PS nesta área. Defendeu a necessidade de uma reforma mais profunda do sistema educativo, que inclua a promoção de parcerias com o setor privado e a introdução de mecanismos de avaliação mais rigorosos. Argumentou que é essencial criar um sistema educativo que seja capaz de formar cidadãos competentes e preparados para o mercado de trabalho, e que para isso é necessário implementar reformas corajosas e inovadoras.

A questão da habitação foi também um tema de destaque no debate. PNS sublinhou a importância de garantir o acesso a habitação digna e a preços acessíveis para todos os cidadãos. Defendeu a implementação de programas de construção de habitação social, a promoção de políticas de arrendamento acessível e a regulamentação do mercado imobiliário para combater a especulação e a gentrificação. Argumentou que é essencial criar um ambiente habitacional que seja inclusivo e sustentável, e que para isso é necessário aumentar o investimento público e promover a colaboração entre o setor público e o privado.

O primeiro-ministro, por sua vez, criticou a abordagem do PS, argumentando que as políticas de habitação do Governo têm sido ineficazes e insuficientes. Defendeu a necessidade de uma reforma mais abrangente, que inclua a promoção de parcerias público-privadas e a introdução de mecanismos de gestão mais eficientes. Sublinhou que é essencial criar um mercado imobiliário que seja capaz de responder às necessidades da população de forma eficaz e sustentável, e que para isso é necessário implementar reformas corajosas e inovadoras.

Em última análise, o futuro de Portugal depende da capacidade dos seus líderes em trabalhar juntos para um objetivo comum: um país mais forte, próspero e justo. O debate sobre o Estado da Nação foi um momento crucial para avaliar o estado atual do país e traçar um caminho para o futuro. Através do diálogo e da cooperação, é possível construir um Portugal onde todos possam prosperar e onde a confiança nas instituições democráticas seja reforçada. Este é o desafio e a oportunidade que se apresentam aos líderes políticos, e o sucesso desta empreitada dependerá da sua capacidade de superar as divisões e trabalhar em prol do bem comum.

Este debate sobre o Estado da Nação trouxe à luz as questões mais prementes que Portugal enfrenta atualmente. O imperativo de reter e atrair capital físico e humano qualificado, a necessidade de uma reforma abrangente da Administração Pública e a urgência de melhorar o SNS, de investir na educação e garantir o acesso a habitação digna e a preços acessíveis são temas prementes. A capacidade dos líderes políticos de se articularem na busca de soluções para estes desafios será crucial para o futuro do país.

Olhando em perspetiva, é claro que Portugal enfrenta desafios significativos, mas também tem oportunidades únicas. A capacidade de atrair investimentos estruturantes, a retenção de talento jovem, a modernização das infraestruturas e a promoção de um ambiente económico favorável são fatores que podem impulsionar o crescimento e o desenvolvimento do país. Através de uma colaboração estreita entre os partidos políticos e um compromisso com a implementação de reformas corajosas e inovadoras, é possível construir um Portugal mais forte, próspero e justo.

O debate sobre o Estado da Nação foi um momento crucial para avaliar o estado atual do país e traçar um caminho para o futuro. Através do diálogo e da cooperação, é possível construir um Portugal onde todos possam prosperar e onde a confiança nas instituições democráticas seja reforçada. Este é o desafio e a oportunidade que se apresentam aos líderes políticos, e o sucesso desta empreitada dependerá da sua capacidade de superar as divisões e trabalhar em prol do bem comum.