Miguel Viegas, Jornal i online

As dívidas totais ao fisco e à segurança social têm vindo a crescer, somando em 2023 a soma astronómica de 41 mil milhões de euros! De acordo com o Tribunal de Contas, a dívida incobrável atingia em 2022 o valor de 8,7 mil milhões de euros, tendo mais que duplicado desde 2016

Muito se tem falado sobre impostos ao longo desta campanha eleitoral, o que é perfeitamente normal e até de salutar. Contudo, a forma com que grande parte dos partidos se debruçam sobre este tema não tem contribuído para o esclarecimento da opinião pública, limitando-se quase sempre a promessas de baixa de impostos para tudo e para todos. Ao afunilar o debate sobre a tributação na baixa de imposto, desligando o debate sobre o tipo de estado que queremos para o país, estamos a universalizar a ideia de que pagamos impostos a mais. Pior, estamos a legitimar a fuga ao fisco em vez de apostar na pedagogia dos impostos, sendo esta uma matéria que nos separar de outras economias mais avançadas onde o pagamento de impostos é plenamente aceite como um dever e até uma virtude das nossas sociedades democráticas.

Infelizmente, sabemos que existe em Portugal uma certa condescendência sobre o não pagamento de imposto, como se o cidadão fosse uma espécie de David contra Golias, personificando este o estado Leviatã que abafa tudo e todos. Os números, infelizmente tendem a traduzir esta realidade. As dívidas totais ao fisco e à segurança social têm vindo a crescer, somando em 2023 a soma astronómica de 41 mil milhões de euros! De acordo com o Tribunal de Contas, a dívida incobrável atingia em 2022 o valor de 8,7 mil milhões de euros, tendo mais que duplicado desde 2016. Só em 2022, o valor das dívidas fiscais prescritas disparou 585,9% face ao ano anterior, atingindo o valor de 43,5 milhões de euros (dados da Direção-Geral do Orçamento). Nestas prescrições, o IVA representa a maior fatia com 57,5%, seguido do IRC com 24%. Quanto ao IRS o seu peso foi de 11,7% no total das prescrições.

Repare-se que estamos a falar de impostos cobrados mas não pagos. Se somarmos a este fenómeno a economia paralela, que representa entre 25 e 30% do PIB de acordo com várias estimativas, a questão assume dimensões estratosférica. De acordo com um estudo recente da Faculdade de Economia do Porto coordenado pelo Professor Óscar Afonso, o acréscimo de receita fiscal que poderia resultar de uma estratégia coordenada de combate à economia paralela, poderia representar um encaixe anual de 16 mil milhões de euros, num cenário base considerado prudente.

Com base neste cenário, parece-me que a discussão sobre impostos deveria assentar em dois eixos fundamentais. Em primeiro lugar importa colocar na agenda a melhoria da máquina tributária. Apesar do investimento em nova tecnologia que tem colocado a nossa Administração Tributária ao nível dos melhores padrões internacionais, continuam a faltar meios humanos. De acordo com a APIT, Associação Sindical dos Profissionais da Inspeção Tributária e Aduaneira, existem cerca de 3000 inspetores na Autoridade Tributária, mas destes, apenas cerca de 1100 estão alocados em funções verdadeiramente operacionais. Em segunda lugar, é necessário promover a chamada cidadania fiscal, começando na escola com a introdução de conteúdos que informem a juventude sobre a importância dos impostos no financiamento das funções fundamentais que qualquer estado democrático tem de promover para podermos viver em sociedade. Podemos admitir uma baixa de impostos. Mas para isso, é necessário que sejam criadas condições para uma mais justa repartição do fardo fiscal, onde cada um pague a sua contribuição em função dos seus rendimentos e não se premei nem juridicamente nem socialmente e muito menos politicamente o chamado “chico-espertismo”.