Jorge António Moreira, OBEGEF
Quanto à frustração, sim, estou frustrado. Com o caso TAP, obviamente, mas também por não compreender como, face a tão pungente evidência, ainda há tantos concidadãos meus que advogam a nacionalização de unidades empresariais.
Cresci com o provérbio popular que dá título à presente crónica a ecoar-me nos ouvidos. Hoje, não conheço vivalma que o utilize. Embora a sabedoria que lhe está subjacente continue válida, o provérbio parece ter passado de moda.
Lembro-me dele sempre que assisto a mais um episódio da “novela” Comissão Parlamentar de Inquérito à TAP. Um destes dias, após mais uma sessão, quando o provérbio se expandia na minha mente, uma pergunta borbulhou: “Será que ele tem para as pessoas que o conhecem ou que alguma vez o ouviram o mesmo significado que tem para ti?”
Formular uma pergunta é mais de meio caminho andado para aumentar o conhecimento pessoal. Ideia que frequentemente passo aos meus alunos, até porque, parece-me, ao longo das suas ainda curtas vidas, num qualquer momento, o sistema de ensino encarregou-se de lhes eliminar a capacidade de gerar perguntas e de ir à procura das respostas. Como em muitas outras situações, também nesta, a ideia transmitida é abafada pelos seus comprometedores silêncios, onde fazem ricochete as perguntas e onde não medram respostas.
Parti em busca dela. Consultei o oráculo da moda, o ChatGPT. À minha interrogação “Qual o significado do provérbio popular ‘A ordem é rica e os frades são poucos’?”, ele devolveu-me a sua profunda sabedoria: “Este provérbio significa que há muito trabalho a ser feito, mas há poucas pessoas dispostas a fazê-lo. É comumente usado para expressar a escassez de recursos humanos em uma determinada situação. A palavra "frades" pode ser substituída por qualquer grupo de pessoas que sejam poucas em número em relação à tarefa que precisa ser realizada.”
Tão querido este ChatGPT. Veja-se se era isso que a minha mãezinha queria significar quando, depois de eu provocar algum estrago – como, por exemplo, partir uma peça de louça – ela me atirava (em sentido figurado) com o referido provérbio, em tom de voz que deixava entender a sua profunda preocupação por ver recursos escassos de uma ordem pobre a serem desperdiçados. Não era esse o sentido, pois não?!
Procurei confirmação, navegando por mundos menos inteligentes, mas mais diversificados. Busquei, quiçá, sabedoria da minha idade, em detrimento da de um imberbe oráculo. Como “quem procura sempre alcança”, a resposta estava num modesto blog com morada https://urzeira.blogspot.com: “Esta expressão utiliza-se sempre em sentido irónico. Diz-se acerca de alguém que, não tendo, gasta como se tivesse.”
Talvez seja isto que o ChatGPT ainda não domina: a ironia. Quem sabe se um dia, numa luta titânica entre a “inteligência natural” e a “inteligência artificial”, a ironia virá a ser a arma que a primeira esgrimirá para abortar a tentativa de domínio de um qualquer “big brother” quântico. O provérbio, esse, é amassado nela, na ironia, obviamente.
O sorriso na cara do leitor deixa-me entender – assim quero acreditar – que já viu qual a ligação entre a lembrança do provérbio e o caso TAP. A ironia que me invade quando olho esse folhetim talvez seja uma forma de me proteger, para não sofrer um qualquer colapso nervoso. A alternativa seria proferir umas quantas imprecações, daquelas “cabeludas” que em texto escrito aparecem substituídas por símbolos gráficos especiais, mas que a educação ministrada por uma sábia mãe nunca deixou que ganhassem em mim fundações como forma de expressão oral.
Ouve-se, vê-se. A dimensão da má gestão desta empresa pública, a TAP, aparece com todos os seus contornos. Aquilo que se sonhava, mas era demasiado assustador para se aceitar como realidade, afinal existia mesmo. Não era apenas mais um sonho mau do qual se acorda pela manhã, com o sol a entrar pela janela. E quando se pensa que este pode ser apenas um caso ilustrativo do que se passa nas restantes empresas públicas, a respiração passa a ser feita com dificuldade, o coração bate descompassado.
“Como vamos sair deste poço sem fundo, que suga os miseráveis cêntimos de uma ordem falida, atafulhada de gordos frades irresponsáveis que se banqueteiam a expensas do Povo, como se o amanhã não existisse?” – perguntei ao oráculo.
“Como IA, não sou capaz de fazer análises políticas ou económicas profundas, mas entendo sua frustração. No entanto, para sair deste poço sem fundo, é essencial: (1) medidas económicas inteligentes e bem planejadas que promovam o crescimento económico e a criação de empregos; (2) uma liderança responsável e comprometida que possa implementar mudanças positivas; (3) um foco na educação e no desenvolvimento de habilidades para equipar as pessoas para enfrentar as mudanças económicas; (4) uma cultura de responsabilidade e transparência para garantir que os tomadores de decisão sejam responsabilizados pelo seu comportamento.”
Sábio ChatGPT. Das sugestões avançadas, bastava-nos a (4). A responsabilização daqueles que, supostamente, deviam atuar em nome do Povo. Quanto à frustração, sim, estou frustrado. Com o caso TAP, obviamente, mas também por não compreender como, face a tão pungente evidência, ainda há tantos concidadãos meus que advogam a nacionalização de unidades empresariais.