Jorge Fonseca de Almeida, Dinheiro Vivo

As palavras pesam. Algumas estão carregadas de significado político. Positivo para uns, negativo para outros.

Austeridade agrega uma troika de significados: i) redução dos serviços públicos essenciais como a saúde e a educação; ii) redução do deficit público e iii) empobrecimento da generalidade da população com uma redução acentuada do seu poder de compra. Como os sacrifícios não são igualmente distribuídos a austeridade aumenta a desigualdade social, destrói a coesão social e promove a emigração e a baixa natalidade.
A viabilidade do Governo da geringonça, um compromisso improvável entre o PS, o Bloco e o Partido Comunista, nasce do repúdio por uma larga maioria da população das políticas de austeridade. E a verdade é que esse governo travou o prosseguimento desse caminho de autodestruição e conseguiu em alguns casos, muito poucos, reverter algumas medidas anteriormente tomadas.
Com o anúncio de uma fase de inflação o PS resolveu desfazer a geringonça e avançar para eleições. Obteve a maioria absoluta e governa sem rival e, quase, sem controlo nem verdadeira, no sentido de substantiva, oposição.
Com a maioria do governo PS-Costa regressa a austeridade. Não lhe refere o nome, mas pratica-a em toda a linha. Vejamos:
· Redução dos Serviços Públicos - O Serviço Nacional de Saúde nunca esteve tão mal, faltam médicos, enfermeiros, técnicos, materiais. As consultas têm atrasos de anos. A mortalidade bate recordes. A educação é um desastre. Os professores recebem menos que o ordenado mínimo de grande parte dos países da zona Euro, muitas instalações estão decrépitas, muitas escolas não têm ginásios nem laboratórios equipados. É possível aos alunos chegarem ao 6º ano de escolaridade sem saber ler nem escrever. Tudo está feito para as estatísticas, mas não para a aprendizagem. E o que se aprende em algumas disciplinas, como História, são inverdades e preconceitos racistas e coloniais.
· Redução do deficit público. As palavras são outras. Agora repete-se que é preciso seguir uma política de contas certas. O que são contas certas: diminuir o deficit. Muda o disco e toca o mesmo.
· Empobrecimento da população. De acordo com dados públicos a generalidade dos trabalhadores por conta de outrem perdeu o equivalente a um mês de salário em termos de poder de compra. Um empobrecimento muito significativo.
Voltamos, pois, à austeridade pura e dura, dura como política imutável e dura como sacrifícios e sofrimento desnecessário imposto à generalidade famílias portuguesas.
Um sacrifício desnecessário e perigoso. As importações estão já a crescer mais do que as exportações. O deficit externo alarga-se. Porquê? Porque as importações estão mais caras e as exportações não acompanham a subida porque os nossos salários ficam na mesma.
A nível mundial joga-se o jogo da repercussão. Isto é cada país tenta que sejam os seus parceiros a pagar a inflação, subindo os preços do que exporta. Nesta dança internacional da passagem da batata quente para o vizinho, Portugal é o que vai ficar com as mãos escaldadas. Vai ficar com uma população empobrecida e um deficit externo, deficit externo que significa, como já sabemos, mais austeridade num futuro não muito longínquo. Os erros pagam-se sempre e quem os paga são sempre os mesmos - como diz o outro referindo-se aos portugueses, mas pondo-se de fora, "aguentam, aguentam". Até quando?