Sofia Nair Barbosa, Jornal i online

A lei estabelece um quadro punitivo para o incumprimento das medidas previstas, com contraordenações graves e muito graves, puníveis com coimas que podem chegar aos 250 mil euros no caso de pessoas coletivas e 25 mil euros no caso de pessoas singulares.

É certo que o mundo tem atravessado períodos controversos, por meio de esquemas de corrupção e de fraude. Estas situações expõem claramente os sistemas financeiros, económicos, políticos e sociais, tornando-os vulneráveis e gerando com isso sociedades desiguais.

Casos de corrupção e fraude são sinónimo de violação de direitos humanos, e com isto pretendo referir que a nossa democracia entra em declínio na medida em que cada situação desta natureza que ocorra, influencia, certamente, os direitos e as liberdades de cada individuo de uma determinada sociedade.

A história já nos contou que existem imensos casos de corrupção polémicos, ao nível mundial, como por exemplo, o caso do Madoff (Esquema em Pirâmide), a Crise de 2008 (Crise Subprime) - com a queda de um dos maiores Bancos de Investimento do mundo, o Lehman Brothers, originada também por táticas de corrupção e de fraude -, o Caso da Renault / Nissan (Burla financeira), o caso da Dieselgate (Escândalo das emissões de poluentes da Volkswagen), o caso do Banco Espirito Santo (BES) em Portugal – reconhecido pelo Transparência Internacional (Organização Internacional Anticorrupção, sem fins lucrativos), como uso da posição de último beneficiário em operações de offshore ou em participações de sociedades anónimas, abusos de direitos humanos e escala da corrupção envolvida. Poderia elencar muitos mais, mas não é necessário, pois já conseguimos perceber que existe efetivamente um grande problema, relativamente a estas temáticas.

Contudo, também temos assistido a vários Órgãos que pretendem mitigar os riscos de fraude e corrupção, como por exemplo, a nível mundial: Organização das Nações Unidas (ONU), Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), Transparência Internacional (TI), e a nível nacional: o Tribunal de Contas (TC), o Observatório de Economia e Gestão de Fraude (OBEGEF) e a Direção-Geral da Política de Justiça (DGPJ). Estas Instituições têm tido impacto, na medida em que influenciam os dirigentes dos países e das instituições a implementarem soluções de anticorrupção, por meio de leis e obrigatoriedades, chegando, portanto, ao ponto de abordagem do nosso artigo – Canais de denúncia.

Em dezembro de 2021, foi divulgada a Lei 93/2021 que visa, de acordo com o Artigo 2.º, a regularização da proteção das pessoas que denunciam situações relacionadas com (a) contratação pública, (b) branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo, (c) proteção do ambiente, (d) defesa do consumidor, (e) proteção da privacidade e dos dados pessoais, bem assim, (f) violação das regras de concorrência, entre outros relacionados com casos tratados indevidamente. Com isto, esta Lei exige às empresas e organismos públicos que implementem canais de denúncia, os quais, no entanto, devem obedecer a determinados critérios para a sua implementação.

Assim, a referida Lei impõe às pessoas coletivas que empreguem 50 ou mais trabalhadores, entre outras, o dever de disporem de canais de denúncia interna, permitindo que as médias empresas, que empreguem entre 50 e 249 trabalhadores, partilhem recursos no que respeita à receção de denúncias e ao respetivo seguimento.

Os canais de denúncia interna devem ainda considerar os seguintes requisitos: (1) Permitir a apresentação e o seguimento seguros de denúncias, a fim de garantir a exaustividade, integridade e conservação da denúncia, a confidencialidade da identidade ou o anonimato dos denunciantes e a confidencialidade da identidade de terceiros mencionados na denúncia, e impedir o acesso de pessoas não autorizadas; (2) Ser operados internamente, para efeitos de receção e seguimento de denúncias, por pessoas ou serviços designados para o efeito, sem prejuízo de poderem ser operados externamente para efeitos de receção de denúncias; (3) Garantir a independência, imparcialidade, confidencialidade, proteção de dados, sigilo e ausência de conflitos de interesses no desempenho das funções; (4) Permitir a apresentação de denúncias por trabalhadores, anónimas ou com identificação do denunciante, por escrito e ou verbalmente, por telefone ou através de outros sistemas de mensagem de voz e, a pedido, mesmo em reunião presencial (com recurso, estando disponíveis, a meios de autenticação eletrónica com cartão de cidadão ou chave móvel digital, ou com recurso a outros meios de identificação eletrónica).

De referir que esta obrigatoriedade teve início a partir de 18 de junho de 2022. E no caso de existência de incumprimentos, a lei estabelece um quadro punitivo para o incumprimento das medidas previstas, com contraordenações graves e muito graves, puníveis com coimas que podem chegar aos 250 mil euros no caso de pessoas coletivas e 25 mil euros no caso de pessoas singulares.

Em minha opinião esta Lei chegou em momento oportuno, uma vez que, considero fundamental a denúncia de situações que colidam com as liberdades dos indivíduos ou que traduzam a sobreposição de interesses particulares sobre os interesses das organizações. É necessário efetivamente que haja uma proteção acrescida aos denunciantes, no sentido de caminharmos para uma sociedade que detenha um maior Índice de Justiça.

Contudo considero que seja igualmente fundamental que as denúncias efetuadas sejam suportadas por informações e elementos probatórios válidos, no sentido de permitirem o apuramento da verdade.

Acredito também que, na generalidade, as entidades destinatárias desta medida se encontram preparadas para implementar canais de denúncia, devido às exigências que o mercado impõe, e que inclusivamente muitas delas tinham já em funcionamento instrumentos com uma funcionalidade semelhante.