A Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) publicou recentemente um entendimento doutrinário (Informação Vinculativa n.º 21980), que é, ao mesmo tempo, banal e surpreendente.
Diz o entendimento da AT que estão sujeitos ao IMI "os edifícios e outras construções implantados nos terrenos integrantes do domínio público do Estado, sob gestão das administrações portuárias, por entidades concessionárias ou titulares de usos privativos de domínio público".
Este entendimento não tem nada de novo e qualquer fiscalista sabe que sempre foi assim, que qualquer construção privada instalada em terrenos do domínio público paga IMI. Também o sabem aqueles que anualmente pagam o imposto; por exemplo, os donos de bares nas praias ou de quiosques nas vias públicas. Aliás, o Código do IMI di-lo expressamente.
O que é surpreendente é que, com este entendimento, a AT está a desautorizar o próprio Secretário de Estado que a tutela e também, naturalmente, todo o Governo.
É também surpreendente que a própria administração tributária tenha uma posição dúplice nesta matéria, aplicando este entendimento à generalidade dos contribuintes e não o aplicando à EDP.
Este entendimento aplica-se, nos seus precisos termos, às barragens recentemente vendidas pela EDP. Também aí, existem "edifícios e outras construções implantados nos terrenos integrantes do domínio público do Estado (...) por entidades concessionárias ou titulares de usos privativos de domínio público". E, neste caso, é hoje conhecido publicamente que os edifícios e construções que compõem as barragens, não só são prédios privados, como a própria EDP os tinha no seu balanço, como ainda os vendeu, no negócio das barragens. E mais, esse caráter privado consta do próprio contrato de concessão e dos sucessivos aditamentos, incluindo aquele que foi celebrado com o Estado em 2020, no contexto do negócio.
Mas esta doutrina contradiz também um anterior entendimento, da mesma AT, aliás subscrito pela mesma diretora-geral, relativo especificamente às barragens, segundo o qual, os prédios que as integram são bens do domínio público e que não devem pagar IMI nem IMT.
Há aqui um dualismo insustentável ou, pior do que isso, uma discriminação inaceitável e ilegal, que a AT deve corrigir imediatamente, aplicando a sua própria doutrina, agora consagrada. E essa aplicação não pode ser outra senão liquidar e cobrar o IMI sobre os prédios que integram as barragens, bem como o IMT e o Imposto do Selo, (verba 1.1 da Tabela Geral), que incidem sobre a sua transmissão no seio do negócio das barragens. A liquidação do IMI deve ainda ser retroativa aos 4 anos anteriores.
É ainda necessário e urgente que se apurem responsabilidades em toda esta história muito mal contada.