Miguel Abrantes, Jornal i online
Em países onde o lobbying é visto com desconfiança a sua regulamentação é tão legítima como inútil.
O debate sobre a legalização do Lobbying é ciclicamente retomado em diversos países. Esta atividade consiste, basicamente, em sensibilizar entidades públicas para interesses legítimos de determinado setor de atividade. Pelo que, é geralmente entendido que a mesma deve ser desenvolvida com total transparência e, por isso, regulamentada.
Em regra, a regulamentação desta atividade compreende três vertentes:
- Registo de representantes de interesses legítimos;
- Registo público de todas as interações ocorridas entre representantes dos interesses privados e representantes de entidades públicas; e, finalmente,
- Legalização de entidades que prestam serviços de intermediação em nome de outras entidades (conhecidas por lobistas).
O registo público de representantes de interesses legítimos foi instituído em dois órgãos da União Europeia. No Parlamento Europeu em 1996 e na Comissão Europeia em 2008 e consiste num registo de transparência facultativo para as entidades que participem na formulação e execução das políticas europeias no âmbito de atuação destes dois órgãos, encontrando-se também associado ao cumprimento de um código de conduta.
As entidades representantes de interesses legítimos relacionados com a formulação e execução de políticas europeias ao serem registadas passam dispor de um conjunto de direitos e obrigações incluídas no código de conduta.
O registo público de interações consiste na inscrição em suporte informático de todas as reuniões ocorridas entre os representantes de interesses privados e entidades públicas. Nas referidas inscrições devem constar todas as audiências concedidas por entidades públicas.
Assim, com a aplicação deste regime é possível ter conhecimento de todas as reuniões ocorridas entre entidades públicas e privadas.
A legalização de entidades que prestam serviços de intermediação em nome de outras inclui a indicação dos representados e o registo de todas as reuniões que tenham ocorrido com entidades públicas.
Desta forma torna-se publico: quem são as entidades titulares de interesses privados que recorreram aos serviços de lobistas profissionais para defender os seus interesses; quem são os lobistas profissionais; e que interações tiveram estes profissionais na defesa dos seus clientes.
A promoção de interesses legítimos com a utilização lobbying é legítima desde que seja efetuada de uma forma transparente, tal como se encontra legislada na generalidade das jurisdições onde se encontra implementada. Todavia, a utilidade da sua legalização não é relevante pelos motivos que iremos descrever.
O registo de representantes de interesses legítimos permite saber quais são as entidades que desenvolvem interesses legítimos, mas não permite saber se alguma das referidas entidades cometeu alguma ilegalidade na defesa dos seus interesses.
O registo público de toda as interações ocorridas entre entidades privadas e representantes de organismos públicas permite obter o histórico de todos as reuniões realizadas, mas se algo de ilegal foi combinado durante as mesmas, obviamente, que não ficará registado.
A legalização de entidades que prestam serviços de intermediação de interesses legítimos em nome de outras encontra-se implementada em alguns países (como os Estados Unidos onde o Lobbying se encontra regulamentado desde 1946, mediante Regulation of Lobbying Act) e permite qua a sociedade conheça os interesses subjacentes à tomada de decisões políticas.
Todavia, em países onde a generalidade da população não aceita que as decisões do poder público sejam tomadas com base na ponderação dos diversos interesses particulares, mas unicamente com a finalidade de promover o bem comum, não é plausível que os titulares de interesses privados recorram a lobistas profissionais para defender os seus interesses.
Assim, em países onde o lobbying é visto com desconfiança a sua regulamentação é tão legítima como inútil.