Miguel Abrantes, Jornal i

"Quanto mais generalizado for o pagamento de impostos, mais justo é o sistema fiscal"

Em direito tributário a matéria coletável é o montante sobre o qual incide a taxa do imposto e, em princípio, quanto maior for o número de pessoas sujeitas ao pagamento de impostos (e à respetiva matéria coletável) mais receita é arrecadada pelo Estado e mais baixa poderá ser a tributação para a generalidade dos cidadãos.

Ou seja, quanto mais generalizado for o pagamento de impostos, mais justo é o sistema fiscal.

Sucede, todavia, que o extenso regime de exceções previsto na legislação tributária de muitos países tem como resultado o aumento do número de contribuintes com a matéria coletável dos impostos a que estão sujeitos reduzida ou mesmo eliminada.

Estas exceções previstas na legislação tributária, em muitos casos, têm motivações atendíveis, pois radicam em objetivos com relevância económica ou social.

Os países, no entanto, necessitam cada vez mais de receitas para fazer face aos compromissos a que se encontram vinculados e a consequência inevitável é o aumento de impostos para os restantes contribuintes, sem que estes tenham a possibilidade de fazer ouvir a sua voz e apresentar argumentos junto do poder político.

Desta forma, a proximidade ao poder político e a importância económica ou social dos destinatários dos diversos impostos está, inevitavelmente, ligada às exceções introduzidas à legislação tributária e à diminuição da matéria coletável que lhes é aplicável.

Assim, pela mera ação da lei tributária, um número reduzido de contribuintes aumenta a sua riqueza e os restantes são empobrecidos porque têm de compensar a perda de receita do Estado provocada pelos privilégios atribuídos aos contribuintes que conseguem influenciar as autoridades.

A nível internacional, têm sido elaborados relatórios no âmbito da OCDE (Organização para a Cooperação Desenvolvimento Económico) com a intenção de combater a erosão da base tributária, denominados BEPS (Base Erosion and Profit Shifting).

Estes relatórios têm sido importantes para dar a conhecer as diversas formas que os países encontram para diminuir a carga fiscal que incide sobre alguns contribuintes e, consequentemente, a quantidade de cidadãos que em diversos países do mundo são sobrecarregados devido aos privilégios conferidos a outros.

O conhecimento da realidade dada a conhecer pelos relatórios BEPS sobre a erosão da base tributária de alguns contribuintes tem sido importante para despertar a opinião pública a nível internacional sobre as injustiças existentes nas legislações tributárias de muitos países.

No fundo, não se trata apenas da erosão da base tributária, trata-se, também, da erosão da justiça tributária, que causa um sentimento de revolta na generalidade dos contribuintes e incentiva a ocorrência de fraudes.

No entanto, esta tendência para diminuir a tributação que incide sobre alguns contribuintes verifica-se em muitos países do mundo e é difícil a um país, de forma isolada, contrariar.

Por um lado, porque existem setores da economia que criam muitos postos de trabalho e dessa forma contribuem para a melhoria das condições de vida dos cidadãos, mas que apenas subsistem com a ajuda do Estado, através da diminuição da tributação.

Por outro lado, devido à concorrência internacional, os países para atraírem investimento estrangeiro são forçados a baixar impostos e negociarem benefícios fiscais com os investidores.

Assim, sempre que em algum país do mundo, a comunicação social noticiar que determinadas pessoas ou empresas protestam para que a carga fiscal a que estão sujeitas seja diminuída ou eliminada e que o respetivo governo está sensível às suas reivindicações, o cidadão comum deve estar ciente que vai pagar mais impostos.