Jorge Fonseca de Almeida, Jornal i
Nenhuma sociedade a duas velocidades se consegue afirmar. A desigualdade e a discriminação são sempre fatores de atraso.
A pandemia, as quarentenas, o clima de tensão criado por alguns órgãos de comunicação, tem vindo a aumentar dois fenómenos preocupantes: o racismo e a fraude. Duas atitudes criminosas que devem ser combatidas sem hesitação.
Por exemplo nos Estados Unidos o FBI tem vindo a atuar de forma firme contra as fraudes na internet. Como em pandemias anteriores, a doença cria terreno fértil para esquemas fraudulentos de venda de falsas vacinas, de curas milagrosas, desinfetantes inseguros e máscaras contrafeitas. Dezenas de milhares de sites deste tipo foram localizados e encerrados pela intervenção da Polícia. Na União Europeia a Europol tem vindo a dar conta de esquemas fraudulentos de vendas de falsos testes e de medicamentos contrafeitos e perigosos como os à base de cloroquina. Por cá, país, de brandos costumes, a Polícia parece estar de quarentena neste capítulo.
O racismo, os crimes de ódio, a brutalidade policial contra negros e outras minorias, a discriminação na distribuição de apoios sociais, no acesso à educação e à saúde têm sido temas presentes na imprensa de vários países. Com honrosas exceções estranhamente ausentes em Portugal.
Veja-se a questão de muitos ciganos que trabalham como pequenos revendedores de roupa e outros bens. Proibidos de exercer a sua atividade sem que tenha sido desenhado nenhum sistema de ajuda para os compensar. Abandonados à caridade e à sopa dos pobres.
As dezenas de milhares de alunos negros, ciganos e de outras minorias etnias nacionais que ficaram sem escolaridade porque esta exige acesso a computadores e à internet, bens que não possuem.
Mas também as comunidades imigrantes que foram deixadas sem apoios num momento em que milhões foram canalizados para empresas e outras instituições. Muitos brasileiros correram desesperados para o aeroporto fechado na esperança de fugir do nosso país.
A discriminação nos apoios torna-se um fator de atraso alienando parte significativa da população. Um desastre em termos económicos. Nenhuma sociedade a duas velocidades se consegue afirmar. A desigualdade e a discriminação são sempre fatores de atraso.
Uma lição que podemos retirar desta pandemia é que ela, ao concentrar as atenções exclusivamente na doença, acaba por ser propiciadora de comportamentos desviantes e criminosos no domínio da fraude, da corrupção e do racismo.
Da União Europeia esperam-se largas dezenas de milhares de milhões em fundos para investimento e desenvolvimento. Em áreas em que os programas não estão desenhados e testados. Em que a fraude pode prosperar.
Portugal desbaratou completamente o dinheiro dos Fundos europeus na década de 90. Esse dinheiro não permitiu mudar o lugar do país no mundo, nem o nosso perfil económico. Permanecemos um dos países mais pobres e atrasados da União Europeia. Fomos mesmo ultrapassados por vários países de Leste recém-chegados à União Europeia e a quem chamávamos nos anos 2000 de pobres. A fraude, a corrupção foram a causa principal deste enorme insucesso.
A não tomarmos medidas sérias de combate à fraude e à corrupção, o racismo, oportunidade que aí vem, seguirá o mesmo caminho. Será um bodo aos corruptos e um desastre para o país e para a maioria da população. Organizações como o OBEGEF são essenciais para ajudar a delinear uma estratégia que permita enfrentar a onda de corrupção que se avizinha.