Pedro Moura, Expresso online (065 01/04/2020)

Há uns anos eu e a minha mulher demos por nós com um nível exagerado de preocupação com a disciplina e resultados escolares das nossas miúdas. Isto manifestava-se num cuidado e participação excessivos no estudo delas, tendo-se começado a notar dois fenómenos perniciosos:

  1. Aumento generalizado de preocupação e ansiedade no seio familiar;
  2. As miúdas começaram a praticamente só estudar com a nossa presença/insistência no seu estudo.

Se o primeiro fenómeno era mau no curto prazo, o segundo pareceu-nos extremamente perigoso no longo prazo, pois o motivo que levava as gaiatas a estudarem era mais a nossa preocupação que o seu sentido de responsabilidade e auto-motivação.

Felizmente conseguimos detetar isto a tempo e meter a mão na consciência. Resolvemos ter uma conversa com elas no sentido de lhes dizer que estávamos disponíveis para ajudar, mas que não iríamos estar em cima delas para estudarem. Pregámos liberdade, autonomia, mas com responsabilidade. A cama que fizessem seria a cama em que dormiriam.

Lembro-me de ter custado um pouco gerirmos os nossos impulsos de controle, mas ao fim de uns anos posso claramente afirmar que foi uma aposta certa. Não são alunas perfeitas, nem queremos que sejam. Preferimos que sintam dificuldades, que errem, que tenham sustos com as notas de vez em quando, que, sobretudo, sintam como sua a responsabilidade pelo seu futuro. Acredito ser esta uma receita (outras haverão) para que seja maior a probabilidade de virem a ser adultas senhoras de si, que tenham vontade autónoma, que não estejam sempre a depender de outros para agarrarem em mãos a sua própria vida.

Por tudo isto custa-me ter conhecimento de tantos casos (muito pelas estórias que as miúdas contam) de colegas seus em que os pais são tão presentes e controladores que mais parece quererem viver como sua a vida dos seus filhos. Eu chamo-lhes os ‘super-pais’ / ‘super-mães’, pois de tanto quererem o melhor para os seus filhos, de tanto quererem que eles sejam os melhores, lhes estrangulam o natural desejo de autonomia com a sua omnipresença e lhes tolhem a capacidade de errar e aprender com as suas orientações infalíveis.

As crianças necessitam do seu espaço para se desenvolverem. Ser-se um bom pai ou mãe não significa ocupar todos os buracos da vida dos filhos, ser-se super-protetor, decidir tudo pelos filhos. É bem mais importante as crianças e jovens saberem que os seus pais estão lá no caso de fazerem asneira, com todo o seu amor incondicional e a sua autoridade baseada em experiência de vida para ajudar, que criar pequenos seres sem que estes nunca tenham de tomar uma decisão ou assumir responsabilidade por si mesmos.

Aos que crescem sem serem ensinados a serem donos de si próprios resta-lhes, provavelmente, obedecer.