Carlos Pimenta, Dinheiro Vivo (JN / DN)

A Suíça tem uma grande diversidade de serviços financeiros, que representam mais de 10% do seu PIB  

...

Com esta crónica procuramos mostrar as razões sociais que fazem com que a Suíça ocupe hoje a terceira posição no pódio dos mais importantes offshores no nosso mundo contemporâneo, valendo-nos fundamentalmente da documentação da Tax Justice Network.

Este país, muito provavelmente o mais antigo paraíso fiscal, que ocupou um lugar cimeiro nos anos de 2015 e 2018 (penúltimos anos com listagens mundiais hierarquizadas)  desceu em 2020 desceu para a terceira posição, depois das Ilhas Caimão e EUA. Ocupa esta posição com um índice de sigilo de 74 (em 100) e com um peso no mercado financeiro global de 4,12%.

Vale pela sua capacidade de sigilo informativo da actividade bancária, essencialmente no que se refere à propriedade efectiva da riqueza, e pelo prestigio assumido na rede mundial destes espaços de encontro de algumas instituições socialmente cumpridoras com muitíssimas outras, que procuram fugir aos impostos a que estavam obrigadas nos seus países ou proceder a um conjunto de operações de «lavagem de dinheiro» de actividades ilegais, para que o possa utilizar nos mercados legais.

Com uma grande diversidade de serviços financeiros, estes representam mais de 10% do Produto Interno do pais  e o total dos activos bancários são cerca de 500% daquele agregado nacional.

A Confederação Helvética data de 1291 e constituiu o primórdio histórico da actual «nação». A Suíça ainda hoje apresenta a especificidade de ser um pequeno país,  uma república federal, tendo no seu seio quatro culturas com línguas próprias (alemão, francês, Italiano e romanche, por ordem decrescente de importância). Situada numa região altamente beligerante (centro da Europa) com tendência interna de diversidade de posições conforme a dos países vizinhos, encontrou na sua neutralidade, e correspondentes formas de organização política, assentes na democracia directa e autonomia de decisão das suas regiões, concomitantemente com a afirmação internacional, os elementos fundamentais de coesão interna.

A população também constatou melhoria das condições de vida durante os períodos de conflitos armados na Europa e de neutralidade da Suíça, pugnando por tal e pela importância do seu sistema bancário.

Esta neutralidade foi desde cedo acompanhada por regras de sigilo bancário: “Em 1713, muito antes da Suíça existir como estado federal, o Grande Conselho de Genebra aprovou regulamentos que proíbem os banqueiros, que já albergavam depósitos substanciais pertencentes à  aristocracia europeia, de revelar detalhes sobre os seus clientes” (TJN)

Em síntese, a pequena descida de posição na hierarquia dos offshores é essencialmente o resultado das pressões do governo federal dos Estados Unidos da América e da União Europeia sobre os bancos daquele país (e não sobre o Estado deste).

Tal significa três coisas:

  1. Cedência dos principais bancos suíços a algumas pressões exercidas e represálias antevistas. Desde há muito que diversos países tentam penetrar nos segredos bancários, mas só a partir de 2000 pressionando directamente os bancos, os EUA (valendo-se da sua força internacional e da importância do seu «mercado financeiro» interno) conseguiram alguns sucessos, seguidos da União Europeia e da aceitação pela Suíça da troca formal e automática de informação defendida pela OCDE.
  2. Continuidade interna de uma obrigatoriedade legal e agressiva de sigilo bancário. Este continua a vigorar, (adjuvando a sua experiência na rede de offshores) pois:
    • “Ainda é possível criar uma empresa na Suíça que nem sequer tenha a sua propriedade legal registada, quanto mais a propriedade real e benéfica.” (TJN)
    • “os bancos suíços tomaram medidas agressivas para proteger o sigilo suíço em algumas áreas. Enquanto as leis suíças de sigilo bancário permanecerem, continuará a ser um crime denunciar um crime. As leis foram reforçadas em 2014, alargando a pena de prisão de três para cinco anos para os denunciantes que expõem dados bancários.” (TJN).
  3. Continuar a ser o centro offshore nevrálgico para todos os restantes países. As relações com os países subdesenvolvidos, continuam como sempre.