Rute Serra , Visão online

É sabido (o próprio GAFI já o afirmou), que Portugal, considerando a sua ligação histórica a países africanos e da América Latina, funciona como «país de trânsito» para o mercado europeu de capitais branqueados, assim como «espaço de recuo» para indivíduos identificados nos seus países de origem como suspeitos.

Podemos definir branqueamento de capitais como sendo a transformação de fundos provenientes de actividades criminosas, por dissimulação da origem ou do real proprietário daqueles fundos, em capitais reutilizáveis de modo aparentemente legal. Este processo normalmente consubstancia-se em três fases sucessivas e distintas: a colocação de bens ou rendimentos em circuitos financeiros ou não financeiros, os quais por sua vez são alvo de múltiplas e repetidas operações com vista a mascarar a sua real proveniência, para por último se proceder à sua reintegração nos circuitos económicos legítimos.

Esta actividade, em Portugal, constitui crime previsto e punido no artigo n.º 368º-A do Código Penal.

Há cerca de três décadas, Portugal integrou o denominado GAFI (Grupo de Acção Financeira), que consiste num organismo intergovernamental com o objectivo de desenvolver e promover políticas, nacionais e internacionais, de combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo, através da promoção de padrões internacionais e da aplicação efectiva das medidas legais, regulamentares e operacionais necessárias para combater este fenómeno e outras ameaças à integridade do sistema financeiro internacional. Ciclicamente, este organismo promove avaliações aos países que o integram, datando a última, a Portugal, de 2017. Nessa altura, concluiu o GAFI que Portugal apresentava uma estrutura legal robusta de prevenção e combate ao branqueamento de capitais, tendo, não obstante, formulado recomendações no sentido de serem implementadas medidas mais adequadas ao controlo de actividades e profissões de cariz não financeiro.

Talvez ancorados nestes louros de 2017, apesar de desde então terem sido várias as suspeitas de branqueamento de capitais perseguidas criminalmente em Portugal, o nosso país encontra-se atrasado na transposição da Directiva 2018/843/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho (usualmente denominada como a 5.ª Directiva AML ou Directiva 'Anti-Money Laundering'), a qual, segundo fontes oficiais nacionais, encontra-se porém em fase final de revisão para posterior envio à Assembleia da República. Certo é que o prazo se extinguiu em dez de Janeiro último.

Por este motivo fomos já admoestados com um prazo de dois meses, findos os quais a Comissão pretende dar seguimento ao processo de infracção junto do Tribunal de Justiça da União Europeia.

Ficaria mais tranquila se este atraso não se verificasse. É sabido (o próprio GAFI já o afirmou), que Portugal, considerando a sua ligação histórica a países africanos e da América Latina, funciona como «país de trânsito» para o mercado europeu de capitais branqueados, assim como «espaço de recuo» para indivíduos identificados nos seus países de origem como suspeitos. Mas a par desta conclusão, o facto de apresentarmos mecanismos incentivadores ao empreendedorismo, como seja desde logo a existência do Centro Internacional de Negócios da Madeira, uma cada vez mais elevada taxa de actividade turística e um nível de desenvolvimento tecnológico razoável, deveria constituir preocupação preventiva bastante, mas que ao que parece verifica-se de modo ténue…