Óscar Afonso, Jornal i
Como os políticos não têm qualquer elo de responsabilidade com os eleitores, uma enorme fatia de cidadãos informados abstém-se de participar, deixando as decisões eleitorais para os eleitores que vêm os partidos como clubes de futebol.
Que lição decorre daqui para o Portugal atual, que, fazendo parte da União Europeia (UE), permanece na cauda e, ainda assim, contra o que sustenta a teoria económica, tem também pior desempenho económico, apesar de ter uma constituição escrita, eleições democráticas e poder político centralizado?
Vamos assumir que a constituição serve, ainda que, só para dar um exemplo, permita que os deputados não tenham qualquer elo de responsabilidade com os eleitores e que, assim, se impeça a participação da população no controle da qualidade dos responsáveis políticos e nos atos que praticam – neste contexto nem sei como se estranha a abstenção eleitoral! Penso que se finge estranhar porque continuará tudo tal como está.
Será que as eleições são verdadeiramente democráticas? Não creio. Como os políticos não têm qualquer elo de responsabilidade com os eleitores, uma enorme fatia de cidadãos informados abstém-se de participar, deixando as decisões eleitorais para os eleitores que vêm os partidos como clubes de futebol. Por este facto sabe-se à partida que determinado partido terá um determinado score eleitoral: PSD e PS em torno dos 30% (mais 5 ou menos 5%), e BE, CDS e CDU em torno dos 10% (mais 2 ou menos 2%). Os votantes são facilmente enganados com jogos políticos, fingimentos, promessas falsas e meias verdades, que apenas garantem o paraíso no futuro! Quem está no poder, o incumbente, tem sempre vantagem porque, não havendo uma preocupação com a atuação eficiente dos órgãos de Soberania, pode usar recursos públicos para ganhar eleições. Próximo de atos eleitorais, as preferências vão para o que é imediatamente visível para os votantes e não para a reforma inclusiva das instituições que assegura mais bem-estar.
O poder político tem sido competente? A falência eminente do país por três vezes no pós-25 de Abril diz. Decisões sobre o “imediatamente visível” são casuísticas e discricionárias, não distinguem o essencial do acessório e asseguram que a riqueza é distribuída “para cima” (à elite) com algumas “esmolas” “para baixo” (aos pobres). Estes últimos preocupam-se, coitados, com o emprego e aumentos salariais marginais, “de tostões”, mas, enfim, não reagem aos aumentos (invisíveis) de impostos indiretos, e os primeiros nem se chateiam com tudo isto, mas apenas “com milhões”, que, no complexo mundo dos interesses, tendem a cair do Céu numa espécie de dádiva divina! O poder político não responde, pois, aos interesses de todos e não há vergonha na prática de atos abusivos que se criticavam em anteriores detentores do poder. Em suma, nem todos os portugueses têm as mesmas oportunidades porque, se não se combatem os monopólios, em geral, não se combatem a nível corporativo e político como revela a continuidade no poder dos mesmos de sempre. O compadrio, a criação de intermediários improdutivos e de parasitas originados pelos partidos políticos é, de facto, a regra, desprezando-se a meritocracia em favor de interesses pessoais e/ou políticos. Deixo três questões para reflexão: quem são os governantes e deputados de sempre, e os seus assessores? Qual a relevância do curriculum vitae para os cargos desempenhados? Não é reduzido o número de famílias que controla o país? Assim se afastam os eleitores informados que, no jogo político, dá jeito afastar – e não me digam o contrário, pois se assim não fosse haveria as reformas necessárias!
Enfim, as instituições são extrativas e os cidadãos, compulsivamente afastados da vida coletiva, não desempenham as profissões pretendidas, seja porque as oportunidades são diferentes, escandalosamente diferentes, seja porque a educação é cara, havendo profissões a que só a “cunha” permite aceder. O Estado atrapalha tudo, condiciona a liberdade dos cidadãos, e não há uma clara aposta na livre iniciativa e em regulamentações que evitem o condicionamento da atividade económica, desmotivando investidores e inovadores. Sem investimento, inovação e capital humano a competitividade depende do emprego de mão-de-obra barata e é uma “festa” ter emprego que gera pobres, como vai acontecendo. Neste contexto, a corrupção só podia, como é, ser generalizada, tendo aumentado com a democracia e com as deficiências da justiça. Esta, sendo morosa e também cara, não assegura que todos os portugueses tenham tratamento igual perante a lei. Há, portanto, portugueses de primeira, de segunda, de terceira, ...
Em suma, as nossas instituições e a pertença à UE servem claramente a elite e permitem escapar da pobreza, crescendo pouquinho, mas não permitem – nem interessa que permitam – a ascensão da população em geral até à prosperidade média da UE. Tendo cada um de nós colaborado, por ignorância ou distração, para a situação atual cabe-nos, finalmente, perceber que nenhuma elite cede poder e benefícios voluntariamente, pelo que a prosperidade requer luta política contra o(s) privilégio(s). Para muitos a luta passa por não votar!