Filipe Pontes, Visão online,

 

Considerando o último relatório disponível no sítio do Fundo de Garantia de depósitos (30/06/2014) a percentagem de depósitos superiores a 50 000 € é de 3,5 % em número de depositantes (cerca de 567 000 depositantes) e em termos de montante 53,6 % (cerca de 87 195 milhões de euros).

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O Governo aprovou em Conselho de Ministros de 8 de Setembro de 2016 o diploma sobre o regime de acesso e troca automática de informações financeiras no domínio da fiscalidade. Deste documento constam 2 itens de carácter vinculativo, ambos anteriormente assumidos pelo Estado português resultantes de: transposição de regras europeias (Diretiva 2014/107/UE) e do acordo com o Estados Unidos da América (Foreign Account Tax Compliance Act), a saber:

1) Transposição da Diretiva Europeia DAC2, que prevê um mecanismo automático de acesso e troca de informações financeiras em relação a contas detidas em Portugal por não residentes e a contas detidas por residentes no estrangeiro, incluindo cidadãos português.

2) Aprovação de regulamentação associada à implementação do acordo FATCA com os EUA. Este acordo permite o acesso da AT, e a comunicação aos EUA, dos saldos bancários e informações de aplicações financeiras, sediadas em Portugal, titulados por cidadãos americanos residentes em Portugal, pessoas residentes nos EUA e cidadãos portugueses que tenham tido autorização de residência nos EUA, estando no entanto limitada a um valor mínimo de 50 000 USD para o dever de comunicação.

Além disso foi inserido no mesmo diploma a aplicação dos mesmos deveres de comunicação dos bancos à AT relativamente a contas em bancos portugueses de que sejam titulares residentes em Portugal para depósitos superiores a 50 000 €. Desta forma o decreto vai mais longe extravasando e aplicando o mesmo regime de comunicação automático às contas em Portugal de portugueses e outros residentes fiscais no nosso País, mesmo que não tenham residência fiscal nem contas bancárias no estrangeiro.

A verdade é que apesar de limitar a valor superior a 50 000 € não exige para a sua aplicação de qualquer invocação por parte da AT, designadamente indício de prática de crime fiscal.

Ora como julgo é sabido pela generalidade da opinião pública para além de não existir nenhum compromisso externo sobre esta matéria, já existem numerosas situações em que a AT pode aceder a informações cobertas por sigilo bancário sem necessidade sequer de autorização judicial, falo de práticas de crime em matérias tributárias devidamente justificadas e já suportadas nos dias de hoje. Sobre a evocação do princípio constitucional da proporcionalidade, ou seja, o uso de meios excessivos por falta de indícios ou riscos justificativos foi clara a oposição da Comissão Nacional de Proteção de Dados julgo que deverá ter servido de amplo suporte ao veto presidencial. No entanto, julgo que importante é acrescentar ainda que considerando o último relatório disponível no sítio do Fundo de Garantia de depósitos (30/06/2014) a percentagem de depósitos superiores a 50 000 € era de 3,5 % em número de depositantes (cerca de 567 000 depositantes) e em termos de montante 53,6 % (cerca de 87 195 milhões de euros). Estes são os números que se podem extrapolar do relatório e que indiciam que a referida listagem iria representam um manancial de informação o quem em gíria de investigação de fraude se chama de “falsos positivos” ou seja, depositantes comuns que com o recurso à poupança conseguiram acumular valor aparentemente justificados de valores superiores a 50 000 € à data de 31/12/2016 e cujo valor da sua poupança sem qualquer outra justificação iria ser comunicada à AT.

O exercício seguinte seria questionar qual o tipo de utilização que seria dado à informação recolhida? Qual a utilidade de tantos “falsos positivos”? Existiriam fugas de capitais da Banca até ao final deste ano? Se sim por quem?  Mas isso passaria por uma discussão pública que não existiu e de um diploma que por estes ou outros motivos, por ora, não avançou com o recuo do Governo!