João Pedro Martins, Jornal i,
Tenho a felicidade de ter um pai que não é um barão do narcotráfico, nem um padrinho da máfia siciliana. E graças a Deus não é um dos governantes do nosso país.
O meu pai teve um percurso profissional que começou de baixo para cima, sempre subindo cada degrau com o suor do seu trabalho e o reconhecimento do seu mérito. Nunca apanhou um elevador para ultrapassar um colega, nem pisou os incompetentes para se erguer no pedestal.
O meu pai sempre pagou os seus impostos e ajudou muitos a pagarem os deles, abrindo-lhes a porta para o mercado de trabalho.
O meu pai aprendeu alemão com dificuldade, mas sem nenhuma equivalência curricular, nem nenhuma sociedade secreta para o ajudar a copiar em vez de estudar e a praticar uma fraude em detrimento da honra e da verdade.
O meu pai jamais pensaria em colocar dinheiro numa conta offshore sabendo que isso seria melhor para ele, mas pior para os outros.
O meu pai votou sempre, mas nem sempre votou no mesmo partido porque sabe que um eleitor não é refém de uma ideologia, por mais generosa que esta seja, e que as mesmas propostas políticas têm de ser avaliadas no contexto de cada eleição.
O meu pai é aposentado e desde o dia em que se reformou nunca mais teve outra fonte de rendimento porque na sua cabeça um pensionista é alguém que deixou de trabalhar para descansar profissionalmente, permitindo que a sociedade possa dar oportunidades aos mais jovens na produção de riqueza.
O meu pai continua ativo e tudo o que faz é trabalho voluntário e gratuito porque tem uma pensão que é um direito merecido e prometido por todos os seus anos de trabalho e de descontos solidários.
O meu pai sempre planeou viver os últimos dias suportado nas suas poupanças e na sua pensão, mas não é isso que os nossos governantes pensam. A tralha que lidera o país rasgou os compromissos que o Estado assumiu com os contribuintes ao longo de uma vida e diz-lhes que agora têm de voltar a contribuir para que o sistema funcione.
O meu pai aprendeu a gerir o salário e a poupar dinheiro sem passar por um curso de gestão numa universidade. Por que razão tem de ser ele o sacrificado para solidariamente pagar por décadas de má gestão de dinheiros públicos, pelas dívidas fiscais que prescreveram, por aqueles que nunca se mostraram solidários e pela incompetência de quem está no governo?
O meu pai nunca disse em público que tem uma reforma baixa, mas ganha menos do que o Presidente da República e não acumula várias pensões.
O meu pai doou litros de sangue para os hospitais públicos porque sabe que uma vida vale mais do que mil palavras e nunca se queixou como alguns políticos que nunca arregaçaram as mangas para um seringa e afirmam que ser deputado é uma chatice e um cargo mal remunerado.
O meu pai trabalhou horas infindáveis a troco de amizade com reclusos em prisões, doentes em hospitais, iletrados em salas de aula e eleitores em mesas de voto, sem que nada disso fosse contabilizado nos cortes cegos feitos por este governo a todos os reformados.
O meu pai era incapaz de dormir descansado se lhe fizessem uma serenata no emprego com uma canção de Zeca Afonso para criticar o seu desempenho profissional.
O meu pai sempre foi o homem que um dia eu gostaria de ser, como qualquer filho vê o melhor exemplo num pai honrado.
A grande diferença entre o meu pai e este governo é que o meu pai soube construir uma família e este governo conseguiu destruir a maioria das famílias portuguesas.