António João Maia, Jornal i,
O enquadramento político e económico que o mundo tem vivido nos últimos anos, sobretudo na Europa e em particular nos países do sul, é de profunda crise.
Dizem-nos agora que, erradamente, andámos a viver acima das nossas posses. Que gastámos o que tínhamos – o que produzíamos – e o que não tínhamos – o crédito que nos foi sendo concedido – e por essa via incrementámos o défice e hipotecámos o futuro. Dizem-nos também que este modelo foi induzido pelo Estado – através dos sucessivos governos e dos seus programas, alicerçados nas obras públicas e nos orçamentos para as edificar – e, numa lógica de mimetismo, pelas empresas e pelas próprias famílias, sob a miragem das baixas taxas de juro e da alegada segurança do Euro.
Apesar de, aqui e acolá, terem surgido vozes de alerta para a insustentabilidade do modelo, a verdade é que os nossos padrões de vida se conformaram com ele até ao momento em que soaram os alarmes vindos de fora, primeiro pelas agências de rating e depois pelos nossos principais credores. Num ápice, o apoio internacional de ajuda entretanto disponibilizado tem vindo a forçar, de forma dura, o reajustamento da dívida do país, o que tem provocado os efeitos sobejamente descritos e conhecidos de todos, quer ao nível do Estado, quer sobretudo ao nível das famílias.
Mas, questionar-se-á, que relação apresenta este cenário de crise com a questão da fraude, associada a esta coluna?
Toda e nenhuma, responderei.
Toda, na medida em que a negação repentina das expectativas individuais e coletivas criadas por aquele modelo, sem qualquer explicação conveniente sobre o porquê e sobretudo que futuro nos espera, encontra paralelo com os pressupostos de uma situação de fraude. E será por esta razão – por se sentirem defraudadas nas suas expectativas – que as pessoas mostram indignação e atiram para os políticos a culpa de toda a situação, como se resultasse de um plano urdido algures no passado com tal propósito.
Nenhuma, porque, sobretudo em democracia, o modelo não pode ter sido traçado com propósitos que não fossem o de melhorar a qualidade de vida das populações. Simplesmente, como tem acontecido ao longo da história da humanidade, as condições de contexto alteraram-se profundamente nas últimas décadas. Os crescentes custos do Estado social, associados ao envelhecimento das populações, ao aumento da esperança média de vida, ao crescimento das taxas de desemprego, à deslocalização das grandes indústrias para países de mão-de-obra barata e à emergência pujante das novas economias asiáticas e sul-americanas, contam-se entre os principais factores explicativos para o sucedido.
Vivemos atualmente na Europa um contexto de mudança profunda. Realidades tão importantes como o aumento da idade média da reforma, a redução dos apoios sociais e do valor das reformas, a par da redefinição da noção de estabilidade no trabalho, parecem cada vez mais prementes.
Concorde-se ou não, o modelo que começa a desenhar-se assenta numa incerteza permanente, geradora de cenários de instabilidade nas expectativas de vida, sobretudo para as gerações futuras.
A finalizar, deseja-se um ano de 2013 com esperança em melhores dias e, pelo menos no que depender de cada um de nós, com maior capacidade de entreajuda e cooperação, de modo a superarmos mais facilmente este período de transição.