Fernando Costa Lima, Visão on line,
Na minha primeira crónica publicada aqui em 24 de Dezembro de 2008, eu dizia a dado passo que "…na essência dos problemas está quase sempre a existência de conflitos de interesses mal resolvidos e acima de tudo, a maioria das vezes, mal acompanhados, mal controlados, mal vigiados."
Retomo o tema dos conflitos de interesses a propósito de uma notícia publicada no Washington Post online a 13 de Abril do corrente ano e que referia que, na sequência de um relatório produzido pelo Senado dos Estados Unidos, o Washington Mutual, o maior banco americano a ir à falência na história bancária americana, tinha um sistema de incentivos que recompensava os funcionários do banco pela quantidade e rapidez com que fechavam com os clientes empréstimos hipotecários do tipo subprime.
O mesmo relatório referia que os funcionários mais "produtivos" (que aprovavam empréstimos ou os "empacotavam" em valores mobiliários para colocar no mercado) eram candidatos a pertencer ao President´s Club do banco, com viagens a resorts de luxo.
A identificação, o controlo e o acompanhamento dos conflitos de interesses pelas instituições financeiras tem já hoje alguma legislação em vigor, obrigando-as a ter políticas e práticas tendentes a evitar prejuízos para os seus clientes decorrentes da existência de conflitos de interesses. É o caso, por exemplo, da subsecção do Código dos Valores Mobiliários intitulada "Conflitos de interesses e realização de operações pessoais", nos seus artigos 309.º a 309.º-F.
Ou ainda as recomendações emitidas por muitos reguladores sobre essa matéria, como por exemplo a carta enviada já em 2005 a todos os CEOs das instituições tuteladas e supervisionadas pela Financial Services Authority (FSA) e cujo assunto era "SENIOR MANAGEMENT RESPONSIBILITIES: CONFLICTS OF INTEREST AND NON-STANDARD TRANSACTIONS". Nesta missiva dirigida aos mais altos responsáveis das instituições a FSA refere que é da responsabilidade da gestão de topo implementar directrizes e procedimentos para gerir os conflitos eficazmente.
Regras e recomendações como as indicadas são muito úteis para, nas operações do dia a dia, os colaboradores das instituições financeiras colocarem sempre os interesses dos clientes acima dos da instituição ou até mesmo dos seus próprios interesses pessoais.
O caso do Washington Mutual (e muitos outros exemplos parecidos que levaram à chamada crise do subprime, com as consequências que todos conhecemos e sentimos) veio no entanto levantar a questão de saber como identificar e acompanhar os conflitos de interesses quando os mesmos são introduzidos e amplificados nas instituições através dos sistemas de incentivos postos em funcionamento pela gestão das empresas e que apelam a maioria das vezes à ganância pura e simples dos colaboradores.
É aqui que devem entrar os reguladores; não através da elaboração e publicação de novos regulamentos e regras, mas através de uma fiscalização "de proximidade" junto das instituições financeiras. Cada vez estou mais convencido que a fiscalização e supervisão das instituições financeiras passa por uma prática constante, regular e devidamente planeada de "conversas" dos reguladores com a gestão de topo, a gestão intermédia, os auditores, os accionistas dessas instituições.
Rever e acompanhar os sistemas de incentivos, explícitos e implícitos, postos em funcionamento nas instituições financeiros é o primeiro passo a dar pelos reguladores para detectar potenciais situações de conflitos de interesses no sistema financeiro que se podem tornar explosivas ao ponto de terem consequências desastrosas como as recentemente verificadas.