Glória Teixeira, Visão on line,

Em Portugal, e na grande maioria dos países pobres ou subdesenvolvidos, escolher ou ter a sorte de exercer uma profissão de político (deputado, vereador, etc.) é melhor do que ganhar o euro milhões.

Se perguntarem a qualquer estudante universitário português o que querem ser quando forem grandes, a resposta é unânime: querem ser políticos. E de facto, presentemente em Portugal, é a melhor carreira ou profissão que se pode desejar pois são muitas as garantias e direitos e poucas as obrigações.
Se conseguirmos o apoio de um amigo influente, podemos iniciar a nossa carreira de deputado bem jovens, com um salário líquido de aproximadamente 4000 euros e ter direito a uma reforma por inteiro, após 8 anos de permanência nominal ou efectiva na "cadeira" de deputado. De facto, melhor ainda que ganhar o euro milhões é possuir uma reforma certa e por inteiro aos 30 anos de idade e pode gozar a vida à custa do Orçamento de Estado português.
Partindo desta garantia básica, "constitucionalmente protegida", de direito a pensão antecipada e apenas com meia dúzia de anos de trabalho efectivo (por vezes o número ainda é mais baixo), avançamos para outro tipo de garantias e direitos cuja listagem seria sempre incompleta e portanto limitamo-nos a indicar algumas:
a) Ausência de regulação (não existe nenhuma entidade reguladora à semelhança das outras profissões);
b) Ausência de avaliação de desempenho e apenas recentemente se iniciou o controlo de faltas (na minha última visita à Assembleia da República com os meus estudantes do 2º ano de Direito, constatei que 2/3 dos deputados liam jornais ou conversavam descontraidamente entre si…);
c) Suspensão por tempo indeterminado dos contratos a que estivessem vinculados, se ligados à função pública, podendo regressar quando muito bem entenderem ou forem despedidos pelos "barões" do partido, antes do prazo de atingirem a "idade legal de reforma para políticos", etc. etc.
A lista seria extensa e o artigo tem de ser curto e portanto passo de imediato para as consequências ao nível de dívida pública.
Os trabalhadores portugueses, leia-se todos aqueles que não tiveram a sorte de serem políticos e portanto têm de trabalhar de "sol a sol", sem garantias de uma reforma aos 70 anos, ouvem todos os dias dos políticos a defesa da "Política da Verdade, Política do Sacrifício". Apesar dessa política, a dívida pública não cessa de aumentar e a produtividade a diminuir: quem trabalha, tem cada vez menos vontade de trabalhar, e sonha com a sua hora: "a hora do político".
Recentemente muitos e variados comentários e críticas legítimas se têm ouvido a denunciar este estado de desigualdade, discriminação e corrupção.
É manifestamente inconstitucional e ilegal tratar desigualmente e discriminar os trabalhadores, conferindo garantias desproporcionais e abusivas a determinadas categorias de contribuintes. Em nenhum país civilizado os políticos têm direitos e prerrogativas como as que existem em Portugal, sendo escandaloso e apelidadas de corruptas, internacionalmente, as leis que conferem aos políticos reformas antecipadas bem como garantias do tipo acima enunciadas.
Sabem os contribuintes os custos passados e futuros para os cofres do Estado com as "reformas antecipadas" dos políticos?
A injustiça é de facto flagrante quando o sistema começa, e bem, a ser impiedoso com as reformas antecipadas injustificadas.
Publicam-se listas de devedores ao fisco e à segurança social e pergunto-me se, em justiça e em defesa da verdade contributiva, não deveria publicar-se também a lista dos políticos (ou outras categorias de contribuintes objecto de favorecimento económico) a quem são atribuídas pelo Estado reformas antecipadas. Igualmente, a listagem de outros contribuintes a quem são atribuídos casuisticamente benefícios fiscais (contratos fiscais) deveria constar dos sítios da DGCI e DGAIEC.
A eliminação destas e outras garantias contribuiria para elevar o país e reduzir a dívida pública bem como aumentar a produtividade. O mau exemplo da classe política reflecte-se na restante sociedade e enfraquece o melhor e mais motivado trabalhador ou instituição.
Uma classe política competente e experiente gere bem um país e não o empobrece sistematicamente como acontece no caso português. Aqui, temos políticos (ou amigos de políticos) incompetentes, em demasia, a ocupar todo o tipo de chefias na administração pública, ministérios e empresas públicas ou participadas pelo Estado e o resultado está à vista: má gestão, dívidas sobre dívidas, desacreditação da justiça e novos casos de corrupção. Os políticos (ou amigos de políticos) estão em todo o lado que implique poder ou pagamento de excelentes vencimentos ou regalias. Saímos de uma ditadura e entramos noutra e o povo português permanece pobre. Ninguém tem dúvidas do contributo da União Europeia para o nosso desenvolvimento actual.
A classe política não deveria estar acima da Lei mas sujeita às mesmas regras dos restantes trabalhadores, em respeito pelos princípios da legalidade e igualdade. Estes princípios, nas situações aqui descritas, têm sido sistematicamente violados e pergunta-se se não teremos nós, contribuintes e trabalhadores, o direito a ser compensados pela discriminação a que temos estado sujeitos. Este argumento pesaria contra a arma "da proibição da retroactividade da norma mais desfavorável" ou "proibição da eliminação de direitos adquiridos" cuja insustentabilidade é por demais evidente. Leis corruptas devem ser eliminadas ou objecto de controlo pelas instâncias competentes. Tal não tem acontecido no caso português e por isso pagamos todos - incluindo também os políticos - uma factura cada vez mais elevada: a nossa esperança média de vida é inferior à dos países mais desenvolvidos da Europa (nestes, em média, os cidadãos vivem com qualidade até aos 85 anos de idade), possuímos mais doenças crónicas, vivemos com mais "stress" e não temos direito a uma assistência social digna na infância, na adolescência, na invalidez ou na velhice (mesmo aqueles com "reforma antecipada garantida").