Carlos Pimenta, Jornal i

As actividades contabilizadas oficialmente e as que não são podem ser expressas na mesma unidade de medida, mas não podem ser metidas no mesmo saco

1. O Instituto Nacional de Estatística apresentou os seus cálculos da «economia não observada» (ENO) , referindo as novas normas europeias, preparadas há vários meses mas só agora anunciadas. Procurámos, e solicitámos, informações metodológicas sobre as técnicas utilizadas, mas sem resultado.

Dessa revelação oficial e dos valores apresentados para a actualidade resultam alguns problemas. O primeiro tem a ver com o valor estimado para a ENO, porque tal reflecte uma certa leitura da nossa sociedade. O segundo é a sua inclusão, ou não, na contabilidade nacional e o significado social e epistemológico que a envolve. Concomitantemente, dada a importância do Produto Interno Bruto (PIB) na avaliação da economia e nas metas políticas, as manipulações sócio-políticas são um corolário dos aspectos anteriores, por muita honestidade que as instituições estatísticas europeias e nacionais revelem.

Poder-se-ia ainda interrogar sobre o significado ético de tais medidas e especular sobre duas possibilidades alternativas: permitir o interdito para “facilitar” a economia ou reforçar o interdito para “facilitar” os cálculos.

2. O valor é um problema menor. Os seus montantes dependem da possibilidade da metodologia utilizada abarcar a realidade subjacente, não registada formalmente, mas existente. Se com os aspectos considerados calculam 15% da economia efectivamente registada, a inclusão de outros aspectos da economia subterrânea (ex. a ausência de contabilização e as manipulações contabilísticas para as diversas formas de fuga fiscal eventualmente envolvendo offshores), da economia ilegal (ex. tráfico de seres humanos e de órgãos, negócios de guerra, pesca ilegal, captura de espécies proibidas, lixo tóxico, etc. ) e da economia informal, certamente conduziria a valores bastante maiores. O fundamental é acompanhar os cálculos com as informações metodológicas que permitam verificar o que está, ou não, englobado no montante encontrado.

3. O PIB é um agregado importante que exige transparência do seu conteúdo e uma transposição simbólica perceptível por todos. As actividades contabilizadas oficialmente pelos agentes económicos e as que o não são podem ser expressas na mesma unidade de medida, mas reflectem realidades sociais suficientemente distintas para não serem metidas no mesmo saco.

Além disso, essa inclusão, assim como a identificação entre “produção” e “criação de utilidade”, assim como a adopção do “valor de mercado” mesmo quando o mercado não existe, aumenta a probabilidade de termos uma contabilidade nacional criativa.

E recorde-se que o PIB é um dado central do nosso quotidiano, emerso na dinâmica da actividade económica, condicionado pelas políticas económicas, elucidado ou confundido pelo discurso político-ideológico.

Já que a crise perdura porque não aumentar o PIB via imaginação? A Europa cresce, as eleições têm mais demagogia e falsidade, o peso da dívida no produto reduz-se.

4. E porque não aproveitar a onda criativa?

Actualmente engloba-se no PIB o que os proprietários de casas que habitam pagariam se fossem inquilinos. Porque não contabilizar as relações sociais dos agregados familiares como se tivessem que recorrer ao mercado da mais “velha profissão do mundo”? Fazendo amor três vezes por semana ter-se-ia um aumento de 12% do PIB. Talvez com o sorteio de um preservativo de luxo se alcançasse um valor mais elevado! Com mais sexo até cumpriríamos o anti-social pacto orçamental.