Henrique Santos, Visão on line,

"... o paciente ... volta ao hospital e entrega um leitão ... ao médico,... que significa isto?"

Num passado recente, um Jornal diário nacional publicou uma notícia sobre uma distinção realizada pelo Senhor Presidente da República a um gestor.

Não fiquei indiferente à notícia. Nem eu, nem alguém que conheço, que me voltou a despertar para o assunto.

Na verdade, o conteúdo da notícia em si não interessa para nada. O que a mim martelou a cabeça foi o facto de alguém ser premiado por fazer algo que devia fazer com o salário que lhe pagam. Sem me referir diretamente ao caso da notícia (não tenho matéria de facto para avaliar o desempenho do gestor em questão), estou a falar nos casos em que alguém é premiado por um bom desempenho em determinada empresa ou instituição (independentemente do que a expressão "bom desempenho" signifique).

Quando Cavaco Silva, na qualidade de Presidente da República, distingue um gestor (no caso, pode dizer-se, gestor público) teve em conta diversos "pedidos" e "sensibilidades", que surgiram de diversos quadrantes, e não o fez de ânimo leve (segundo veicula a notícia). Teve em atenção não só a pessoa em si, mas os resultados de toda uma instituição que essa pessoa representa e, sobretudo, o exemplo que pretende passar para as restantes unidades da mesma índole.

Sei agora que o gestor, como mandam as regras de boa educação, ética e conduta aceitou a distinção. O que a mim muito me impressionaria, era se o referido gestor não a tivesse aceite. Isso é que era um exemplo, e não tanto a "brilhante" gestão que imprimiu à Instituição onde trabalha.

Na verdade, o presidente do conselho de administração da dita Instituição (na qualidade de líder da mesma), não fez mais que a sua obrigação. Pensem comigo: "por gerir bem uma entidade, que por acaso até é pública, alguém tem o direito a ser distinguido? Então não foi para isso que o contrataram?"

Bom, dirão uns: - mas os outros que estiveram antes não fizeram o que ele fez, - os gestores dos outros centros hospitalares também não foram tão longe nos resultados, dirão outros. - E?, pergunto eu.

A distinção em referência, para mim, pode correr o risco de corresponder a uma redondo zero, e levar mesmo ao desincentivo dos seus pares, isto porque temo que a avaliação realizada, e que levou à distinção atribuída, tenha sido feita sem qualquer tipo de parâmetros perfeitamente claros e conhecidos de todos as outras Instituições da mesma índole e com as mesmas dependências (entendam-se hierárquicas e de financiamento).

Se me disserem que lançaram o desafio a todos os Presidentes das outras Instituições congéneres, a informar que iriam ser avaliados e premiados mediante determinados critérios, ainda posso admitir que, no fim de um ciclo, se possa concluir por uma ou mais distinções. Agora atribuir uma distinção a quem faz o seu trabalho (neste caso aparentemente digno de registo), não é motivo de premiar. A regra é: se faço bem o meu trabalho sou distinguido, se não faço o meu trabalho ou o faço mal "azar o deles"? É algo que não se percebe.

Claro que não sou tão leviano assim. Mas pensem nas consequências que tais atitudes têm implicado: temos excelentes gestores públicos, brilhantes políticos e consultores notáveis, temos dirigentes públicos premiados anualmente mesmo com as respetivas entidades dirigidas com dívidas incomportáveis e estas em constante crescimento, e ainda temos dos gestores mais bem remunerados do mundo!

Não posso terminar sem vos deixar um exemplo: Determinado paciente vai ao hospital com uma forte dor. Após avaliar o caso é realizado o diagnóstico pelo médico, tendo o paciente sido submetido a uma intervenção cirúrgica no mesmo hospital. Após 15 dias, o paciente, totalmente recuperado e com alta médica há 4 dias, volta ao hospital e entrega um leitão assado à Bairrada ao médico. O médico aceita. A minha pergunta é: "Que significa isto?", uma distinção, um prémio, um agrado?

Mas eu posso mudar o cenário: Se o mesmo paciente morrer durante a cirurgia e a família for levar igualmente o leitão assado à Bairrada ao médico, que interpretação ou analogia posso daqui retirar? Será que o médico era um esfomeado?

Eu sei que a pergunta inteligente devia ser colocada nos seguintes termos: Se o mesmo paciente morrer durante a cirurgia, deve a família levar igualmente o leitão? (como sei que o estimado leitor não me vai responder, eu respondo-lhe: - acho que sim. Se não concorda, manifeste-se, porque isto é o que está permanentemente a acontecer).

Uma coisa eu sei, se fosse tão fácil responsabilizar como premiar, muitos se demitiriam de imediato de funções.