João Pedro Martins, Jornal i

Maioria dos candidatos são ilustres desconhecidos e a generalidade dos eleitores deixou que lhes pusessem uma chucha no cérebro e entrassem em modo abstencionista

 

 

As eleições europeias estão à porta, resta saber quantos portugueses estão dispostos a trocar o sol e a praia, ou a festa do futebol, por uma reflexão profunda sobre a Europa e perceber quanto vale um voto.

O abismo que separa os candidatos ao Parlamento Europeu dos eleitores portugueses parece cada vez mais intransponível. Os 28 Estados-membros vão eleger 751 deputados, dos quais apenas 21 representam o voto dos eleitores portugueses.

A maioria dos candidatos são ilustres desconhecidos e a generalidade dos eleitores deixou que lhes pusessem uma chucha no cérebro e entrassem em modo abstencionista.

Se compararmos os mais de seis mil euros livres de impostos que cada deputado europeu recebe no fim do mês com o rendimento de muitos portugueses que são vítimas de desemprego ou de cortes salariais, facilmente encontramos um motivo para o crescimento da abstenção.

A austeridade em nome da troika, onde a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu tiveram um papel determinante, fez que muitos portugueses deixassem de acreditar no projeto europeu como a resposta da democracia e da solidariedade e aparecessem reminiscências de um passado nazi de profunda desigualdade social.

Temos de nos lembrar que anualmente há um milhão de milhões de euros que desaparece na Europa devido à corrupção e à evasão fiscal. Martin Schulz, o candidato do Partido Socialista Europeu à presidência da Comissão Europeia diz que “É altura de os que causaram a crise serem chamados a pagar”. O político alemão defende mesmo que as multinacionais têm de pagar impostos onde os lucros são obtidos e critica a evasão fiscal dos especuladores e multinacionais que escondem o dinheiro em paraísos fiscais e obrigam os pequenos contribuintes a pagar a fatura.

Esta é uma das razões que nos deve fazer refletir quando votarmos para o Parlamento Europeu e decidir se queremos que o sucessor de Durão Barroso seja o luxemburguês Juncker, que governou um paraíso fiscal, ou o alemão Schulz que promete uma Europa com uma política de transparência e de combate à evasão fiscal.

O economista Thomas Piketty deixou-nos um aviso preocupante: “O fosso entre ricos e pobres ameaça destruir-nos.”

O capitalismo nasceu cego e nunca vai crescer com a visão de igualdade e justiça. A política que nos chega de Bruxelas tem privilegiado os piratas e terroristas fiscais, fazendo que os ricos sejam cada vez mais ricos e vivam à custa do suor dos mais pobres.

Avaliando o desempenho dos 22 deputados portugueses no Parlamento Europeu, é fácil perceber que Elisa Ferreira foi a eurodeputada que mais trabalhou pela transparência fiscal, dando um contributo decisivo, no âmbito da Comissão de Assuntos Económicos e Monetários (ECON), para que o Parlamento Europeu estabelecesse regras claras de forma a que as grandes empresas de petróleo, gás, minérios e madeira sejam obrigadas a divulgar os pagamentos efetuados a governos, por país e por projeto, sempre que os montantes envolvidos ascendam a 100 mil euros.

É um orgulho ter deputados como Elisa Ferreira que colocou um travão na falta de transparência e na corrupção na indústria extrativa, ou a acutilância de Ana Gomes na defesa dos direitos humanos, ou ainda a irreverência de Marisa Matias no combate aos medicamentos falsificados, ou até mesmo a tenacidade de Rui Tavares na denúncia de um estado ditatorial na Hungria.

As alternativas à austeridade passam pelo voto no próximo dia 25 ou pelo branqueamento numa praia portuguesa. Basta escolher onde queremos ver o sol a brilhar.