Óscar Afonso, Jornal i

Infelizmente, creio que uma vez assinado o programa de assistência deixou de ser possível pensar em alternativa possível de ajustamento

 

No ano de 2009 sucederam-se decisões políticas que, desafiando toda a racionalidade económica, arrastaram o défice público para um caminho perigoso e conduziram definitivamente o país para a bancarrota. Nessa sequência, o governo demissionário, sem parecer compreender o que se passou, negociou com a troika (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional) um acordo que impôs uma alternativa de ajustamento baseada em políticas restritivas e que condicionou a governação futura.

Pode dizer-se que Portugal teve a honra de ter sido governado com os “pés”, por personalidades que, ainda hoje, se supõe deuses da política e da razão, quando simplesmente desprezaram a generalidade dos portugueses, considerando-nos como simples “ralé”, e que, pelas declarações que fazem, continuam a não perceber o que é governar para todos.

Esquecem-se que a correcção dos desiquilíbrios que deixaram e particularmente da correcção do défice externo e do défice público era impossível sem dor. Esquecem-se que, já no fim do seu ciclo, começaram a martirizaram a população com uma recessão duríssima – recorde-se que foi em 2009 que o PIB real caiu 3% – e com as medidas de forte contenção orçamental aplicadas a partir de 2010.

Esquecem-se que, com o resultado das políticas que primeiro conduziram e das que depois aceitaram, negociando e assinando o programa de assistência com a troika, obrigaram o governo actual a aceitar o agravamento da austeridade, traduzida em mais impostos e menos despesa pública. Tal implicou naturalmente uma redução drástica do consumo interno e do investimento, e um aumento significativo do desemprego.

Neste contexto, a degradação económica, financeira, social e política num contexto geral de decadência e humilhação nacional não pode ser culpa de quem teve de implementar o programa de assistência. É culpa de quem nos conduziu à sua necessidade e o negociou. Quando muito culpe-se o governo actual por não distinguir o bem do mal gerido, os bons dos maus, e a implementação de medidas cegas, transversais e iguais para todos.

Infelizmente, creio que uma vez assinado o programa de assistência deixou de ser possível pensar em alternativa possível de ajustamento. Choca-me particularmente que quem o assinou, assumindo-o, ainda hoje tenha “a lata” de afirmar que pensa o contrário, fazendo de nós “burros”.

Mas será a alternativa assumida errada? De acordo com economistas influentes, como Alberto Alesina, essa é a melhor alternativa porque cortes significativos na despesa são seguidos de períodos de forte crescimento. Além disso, um stock de dívida pública expressivo retira recursos da economia face ao pagamento de juros, e assim afecta negativamente o investimento e a taxa de crescimento da economia.

Assumiu o compromisso, acredita-se que mais cedo do que tarde o ajustamento reconduzirá Portugal ao caminho da prosperidade e que a utilidade dos sacrifícios acabará por ser reconhecida. Um sinal é a evolução das taxas de juro da dívida pública que acabam de atingir mínimos históricos impensáveis. Se tudo continuar a correr bem, concluído o período de ajustamento, a troika deixará de nos visitar e a obtenção de financiamento externo dependerá então da boa vontade dos mercados que, naturalmente, nos obrigarão a manter a disciplina económica e financeira conseguida. Além disso, na mesma linha, o Tratado Orçamental Europeu de 2012 parece proteger-nos igualmente de políticos irresponsáveis.

Espero, portanto, que finalmente, por culpa de alguns, deixemos de estar condenados a ciclicamente estar sujeitos a um processo de humilhação nacional.