Óscar Afonso , Visão on line,
Sócrates insiste em insinuar que Portugal podia ter evitado a troika. Poder podia, como sabemos, mas não no momento do abismo. Nessa altura, como também sabemos, o seu ministro das finanças, ter-lhe-á dito que já só havia dinheiro para um mês de salários. Refere que a dívida pública subiu 30% de 2010 para 2012, insinuando que nada teve a ver com isso. Mas esse aumento não resultou antes do registo do que estava escondido? E os encargos com as PPPs que nos deixou para pagar, não são bem superiores ao que sugere? Não foi quem congelou por dois anos os salários dos funcionários públicos para os poder aumentar em ano de eleições? Não foi quem nacionalizou o BPN? Não foi quem iniciou a política de austeridade com os PEC, política que depois passou a considerar errada? Não assinou o memorando de entendimento com a troika, condicionou o futuro e humilhou o orgulho nacional? Não foi criativo na cronologia da crise, fingindo por vezes que nada sabia em 2009 e outras que tudo começou no início de 2008? E em 2009, não dizia que a dívida não era um problema e que Ferreira Leite era “bota-abaixista”?
Sócrates enganou efectivamente e continua demagogicamente a enganar, com toda a naturalidade e, o que me entristece, num palco (RTP) que nos pertence. Não é que seja relevante, mas é revelador o seu comentário sobre o relato do jogo de futebol Coreia do Norte-Portugal do Mundial de 1966, em que ficou fã de Eusébio. Não é que ia para a escola na Covilhã, nesse dia 23 de julho, sábado e em época de férias escolares?
Com Passos Coelho vieram novas promessas. Era um disparate acabar com o 13º mês, atacar ainda mais a classe média, acabar com a taxa intermédia de IVA para a restauração, aumentar os impostos, cortar salários, ... Mas rapidamente passou ao “que se lixem as eleições”. O argumento foi o usual. Não sabia e não esperava a gravidade observada das contas públicas, mas não era sua obrigação conhecer o estado das coisas? E as promessas de Seguro? E o estado das contas do partido que dirige? Acho que nem merece a pena falar, não venha a incompetência parecer competente.
E o episódio recente Barroso versus Constâncio sobre o BPN? Simplesmente admirável! Diz o primeiro que, quando era primeiro-ministro, disse três vezes ao segundo, quando era governador do Banco de Portugal, para saber se o que se dizia era verdade. Constâncio afirma que não recorda qualquer convocatória exclusiva sobre o BPN feita por Barroso, ficando a sensação de que nada de substantivo se terá falado e que as conversas terão sido casuais. Não havendo registos e não tendo sido lavradas actas, não haverá ninguém que se lembre de ter vendido cervejas e tremoços para essas conversas casuais?
Enfim, apetece dizer que, em Portugal, a “Política Paralela” é a regra, vigorando a ilegalidade, a ocultação, a informalidade, a ausência de agendas, as reuniões sem actas, as declarações sem testemunhas, a ausência de sentimentos genuínos, a frieza, a insensibilidade aos sentimentos alheios, as manipulações, o egocentrismo, a falta de remorso e culpa, e o que se lixe. E assim não me espanta nunca ter ouvido um político no activo falar em corrupção e, no entanto, todos sentimos que está em todo o lado, que cresce há décadas e que alimenta a elite minoritária, cada vez mais rica e poderosa, a quem interessa o poder e o dinheiro público. Elite que teve “a lata” para “na nossa cara” montar um esquema que, com os nossos impostos, suportamos e que lhe permite contratar especialistas em comunicação e imagem que a ajuda a enganar-nos.
Chegados a este estado de sociedade doente, divertimo-nos com a novela mexicana que a elite nos oferece e a escolher clubisticamente entre o meu partido e o dos outros. Como já alguém disse, não basta mudar de “moscas”, é preciso remover toda a porcaria!