António João Maia, Jornal i

As máscaras definem e sustentam o lugar de cada um na sociedade e ditam as regras do jogo da vivência e das relações entre as pessoas

 

No Carnaval as pessoas não se mascaram, desmascaram-se.

É o que, em tom descontraído, costumo comentar entre amigos por estas alturas do calendário, quando se assinala, como na próxima terça feira, a celebração do Carnaval.

Embora a maior parte de nós não tenha noção desta dimensão, a verdade é que passamos as nossas vidas a usar máscaras, que vamos trocando – porque foi assim que nos ensinaram, na família, na religião, na escola, nos amigos e no local de trabalho, enfim, um pouco por todo o lado – em função dos diversos contextos em que nos encontramos, e que se vão sucedendo uns aos outros.

Quantas vezes nos apetece vestir uma determinada peça de vestuário – para utilizar um exemplo simples – mas, porque vamos para um evento com determinadas características – uma festa de casamento, por exemplo – temos de usar aquela que as circunstâncias nos dizem ser a mais adequada, embora saibamos nos vai deixar menos à vontade, menos confortáveis, enfim, no limite, menos felizes…; Quantas vezes nos apetece dizer “Não, porque…”, mas, porque as expectativas e as circunstâncias do contexto onde nos encontramos o aconselham, o que nos sai pela boca é um “Sim, claro”; Quantas vezes nos apetece, ao acordar pela manhã, um passeio à beira-mar para desfrutar a brisa marinha e os raios de Sol primaveril, mas temos de “mergulhar na multidão que se arrasta na chuva dissolvente” – como dizem os Xutos e Pontapés – para irmos trabalhar…; Quantas vezes, ao repreendermos o nosso filho por uma traquinice que fez – bem sabendo que, quando foi a nossa vez, tanto gozo nos deu fazer algo semelhante –, estamos, sem dar conta, a contribuir para a construção das suas próprias máscaras.

Enfim, quantas vezes agimos em função da sociedade, das pessoas que nos rodeiam e com quem partilhamos a nossa existência, as quais, pelas mais diversas formas e processos, nos vão indicando de forma permanente o que esperam de nós.

Todavia, estas máscaras, como lhes chamo, são um dos preços a pagar por vivermos em sociedade. Elas criam uma espécie de teatro em que cada ator vai apreendendo e utilizando o papel mais adequado para desempenhar em cada ato da sua vida. E todos os atores – grande parte deles sem consciência desta condição – funcionam neste registo. As máscaras definem e sustentam o lugar de cada um na sociedade e ditam as regras do jogo da vivência e das relações entre as pessoas.

De outra forma, se cada um agisse unicamente em função dos seus impulsos, das suas vontades, muito provavelmente a sociedade não existia. Em seu lugar teríamos muito provavelmente grupos de seres que viviam numa espécie de caos anárquico, sem grandes laços de relacionamento uns com os outros…

Neste contexto, rituais como o do Carnaval são importantes. São espaços privilegiados para afrouxar o peso da máscara sem censura. São pontos de libertação das tensões criadas em cada um pelo “baile de máscaras”.

Os autores das fraudes também dançam este bailado. Todavia eles conseguem desenvolver um perfil que lhes permite, com facilidade e por vezes com grande mestria, mostrar a quem os rodeia, sobretudo às suas vítimas, uma máscara coerente com as expectativas, embora por detrás dela estejam efectivamente a desempenhar um outro papel, a ter propósitos diferentes dos que evidenciam através da máscara que mostram.

Por isso se diz, quando descobertos, que lhes “caiu a máscara.