Pedro Santos Moura, Visão on line,

Como inveja é um sentimento que gosto pouco de experimentar, deixo aqui uma proposta para os nossos ilustres governantes.
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O relatório Annual Fraud Indicator (AFI) do Reino Unido coloca as perdas para fenómenos de fraude em 62,3 mil milhões de euros (52 mil milhões de libras). Este valor diz respeito a Fraudes no Sector Privado (€25,4Bn), no Sector Público (€24,7Bn), Fraude Individual (€10,9Bn) e ‘Sector Social’ (€0,2Bn), representando o montante cerca de 3,4% do PIB do Reino Unido. Este relatório apresenta a decomposição deste montante não só por sector, mas também pelos respectivos subsectores, por fraude detectada e não detectada, e ainda por tipologia de fraude.

Este documento mostra-se fundamental não só para a definição, condução, acompanhamento e avaliação de políticas públicas e privadas de prevenção e combate a fraude de forma coerente e alinhada, mas também para o aumento da visibilidade, impacto e sensibilização da população em geral sobre este fenómeno. Mostra uma enorme maturidade, profissionalismo e transparência sobre um tema da maior seriedade a todos os níveis.

Este relatório é elaborado pela National Fraud Authority (NFA), um organismo Governamental do Reino Unido que lidera e coordena a luta contra a fraude em todos os sectores, em estreita cooperação com todas as áreas governamentais (centrais e locais).

Aconselho qualquer pessoa com interesse sobre a temática da fraude a dar uma vista de olhos no que os nossos amigos britânicos andam a fazer nesta matéria, utilizando os links referidos no fim deste texto.

Confesso ficar sempre com uma ponta de inveja quando olho para a forma como esta gente lida com este tema da Fraude, especialmente se pensar na minha experiência enquanto profissional a trabalhar na área em Portugal e na minha percepção enquanto cidadão da lusa pátria. Se por lá o primado é o da organização, da cooperação e da consequência, por cá ficamo-nos pelas ideias geniais, medidas avulsas, soundbytes mediáticos e demasiado dinheiro e recursos perdidos para os ‘espertalhões’ do costume.

Porque não um AFI em Portugal?

Como inveja é um sentimento que gosto pouco de experimentar, deixo aqui uma proposta para os nossos ilustres governantes.

Extrapolando a taxa estimada de fraude do Reino Unido (3,4%) para Portugal, comparando os respectivos PIBs (€1822Bn para UK e €165Bn para PT), e assumindo que a taxa de Fraude no Reino Unido não será menor que em Portugal (o que me parece bastante razoável), teríamos um valor estimado de €5,6Bn, com um valor estimado de €2,2Bn para o sector público. Sinceramente, pelo que conheço, parece-me um montante bastante conservador. Basta ter em conta o valor estimado de Economia Não Registada (paralela) estimado de €44Bn (fonte: OBEGEF) para se ter uma noção.

Mas não é o valor exacto que importa para a minha proposta: é a escala de valores envolvidos.

E a proposta que deixo é: porque não criar uma Autoridade Nacional de Combate a Fraude (ANCF), cujas funções fossem similares à National Fraud Authority do Reino Unido, que tivesse como principais funções definir, coordenar e liderar, em conjunto com todo o Governo (local e regional), os esforços de combate à fraude, bem como dar visibilidade às medidas e resultados conseguidos, no intuito de criar sensibilização e promover uma mudança cultural de intolerância a este fenómeno?

Em boas contas de merceeiro, como faria o meu avô, se um organismo destes tivesse um orçamento de €1M (milhão) de euros (15 a 20 pessoas + despesas operacionais) e conseguisse um impacto positivo e directamente mensurável de €50M (podendo ser muito superior) para além do que se consegue hoje com as medidas sectoriais de combate a fraude, não deveria ser criado? E isto sem mencionar os impactos a nível de sensibilização e mudança cultural. Parece-me, como diriam os senhores do Reino Unido, um ‘no-brainer’.

Já agora, se por acaso se inclinarem para esta ideia, façam o favor de lhe dar um mandato claro, autonomia e pessoas competentes (que as há muitas, no Estado e no Privado), não boys. Coloquem a ACFC debaixo do Gabinete do Primeiro Ministro (patrocinador forte para facilitar as ligações com o resto da ‘máquina’) e garantam que não é apenas mais uma ‘Unidade de Missão’, mas sim uma unidade que tem como missão recuperar dinheiro indevidamente perdido e, sobretudo, mudar mentalidades e atitudes.

 

Fontes: