João Pedro Martins, Jornal i
Está na moda o bullying aos serviços públicos.
Criaram o mito que os serviços públicos são o Drácula das contas do país. Excesso de burocracia, estruturas obsoletas, tráfico de influências e corrupção, uma infinidade de pessoas que recebem muito e fazem pouco, entre outros vícios que colocam os serviços públicos debaixo de fogo.
Para este governo, a solução para a diabolização dos serviços públicos passa pelo exorcismo do Tribunal Constitucional, a alteração da própria Constituição e o extermínio dos funcionários públicos.
O plano está traçado e começou uma campanha que trata cada funcionário público como se fosse um judeu condenado num campo de concentração nazi. Os cortes salariais são iguais para todos, como eram os trabalhos forçados, as câmaras de gás, os fornos de inceneração e as valas comuns de Auschwitz.
É verdade que existe tráfico de influências e que em muitos serviços públicos, desde a administração central às autarquias locais, multiplicam-se os casos em que os organismos públicos deixaram de servir o público e passaram a alimentar lóbis que levitam à volta da luz do poder, transformando-se em verdadeiros ninhos de corrupção e viveiros do crime organizado, onde gente sem rosto e sem escrúpulos ganha milhões à conta do dinheiro dos impostos dos contribuintes.
Cortar 12% no salário de um funcionário público corrupto é pouco. Cortar a todos, onde se incluem os honestos e competentes, é um ato de gestão danosa. Este governo não sabe distinguir entre o prioritário e o acessório, o que funciona e se deve melhorar e o que está a mais ou em duplicado e é preciso eliminar.
Acabar com centros de saúde, maternidades, estações de comboio e serviços de correios de proximidade é acentuar ainda mais as assimetrias regionais. Significa criar novos guetos geográficos que impendem o desenvolvimento das regiões e das pessoas e abandonar a maioria dos contribuintes em função do lucro que se pode oferecer para privatizar.
Em tempos de austeridade, poderiam ser implementadas algumas medidas simples que garantissem a equidade e a justa distribuição dos dinheiros públicos. A lei deveria limitar o exercício de funções dos dirigentes públicos a dois mandatos, permitindo uma maior rotatividade, evitando a sustentabilidade de interesses instalados. As assessorias técnicas e os contratos com escritórios de advogados e empresas de consultoria deveriam estar limitados em função do valor dos contratos e em regime de exclusividade com a entidade pública adjudicante.
Em épocas de crise económica e social não é admissível que um consultor externo ou um escritório de advogados tenha vários contratos em vigor com diferentes organismos públicos. Quando o desemprego atinge percentagens alarmantes, é imoral que funcionários públicos acumulem cargos remunerados em vários organismos da administração central, local e do setor privado, impossibilitando que a função social do Estado disponha de meios para socorrer aqueles que ficaram sem o posto de trabalho.
Os governos podem ser demasiado maus de forma a justificarem o permanente recurso a manifestações na rua, mas enquanto tivermos eleitores que escolhem um porta-voz de um presidiário condenado, como o caso de Oeiras, o país não tem pernas para sair da crise.