Óscar Afonso, Jornal SOL
Crescer apenas ligeiramente acima da UE face a este assomo de ventos favoráveis só confirma que o potencial da economia é baixo e que há bloqueios urgentes a remover.
Nesta semana, o Governo festejou a distinção da revista The Economist, que colocou Portugal como a «Economia do ano» na OCDE em 2025, «Doce como um pastel de nata», ajudando a sustentar o discurso de que tudo vai bem na economia do ‘País das Maravilhas’.
Não poderia deixar de comentar, pois como é sabido, sou fortemente crítico desta leitura complacente do discurso dominante, que contrario abaixo de forma veemente.
Reitero que, sem reformas de fundo, voltaremos ao crescimento médio anémico de 1% ao ano registado desde 1999, passado um conjunto de fatores extraordinários que têm permitido a economia crescer um pouco acima da União Europeia (UE) nos anos mais recentes: (i) o PRR, que acaba em 2026; (ii) o surto de turismo pós-confinamento, já a abrandar; (iii) a guerra na Ucrânia, que travou o resto da UE e nos deu vantagens temporárias na atração de turistas adicionais e alguns investimentos (pela imagem de país seguro, longe do conflito), mas que cessarão quando houver paz; (iv) a entrada desregulada de imigrantes devido ao regime de Manifestação de Interesse, criado em 2017 e findo em 2024, pois mesmo que uma parte significativa esteja (ou tenha estado) na economia paralela, como sugerem os dados, beneficia sempre alguma coisa o PIB oficial por via do consumo.
Crescer apenas ligeiramente acima da UE face a este assomo de ventos favoráveis só confirma que o potencial da economia é baixo e que há bloqueios urgentes a remover.
Passo agora a uma análise breve, mas contundente, sobre o ranking da revista, que deveria fazer corar de vergonha os seus responsáveis e levá-los a terminar a divulgação o mais depressa possível.
Os cinco critérios de análise do referido ranking, reportados ao ano em causa, são: o crescimento do PIB; a evolução do emprego; a inflação e o seu desvio face à OCDE; e a valorização do mercado de ações.
Em primeiro lugar, faz pouco sentido, a meu ver, uma análise de indicadores que podem melhorar muito num ano apenas porque recuperaram face a um mau ano precedente (problema comum a rankings deste género, que a meu ver são pouco informativos), como é o caso do PIB ou, mais frequentemente, da evolução da bolsa. Faria mais sentido usar indicadores de desvio face a tendências passadas.
Em segundo lugar, nos indicadores escolhidos, salta logo à vista um erro crucial, que é a dupla inclusão do emprego – ao estar também presente na evolução do PIB, que se reparte entre emprego e produtividade do trabalho, como qualquer economista sabe –, o que favorece economias mais trabalho intensivas, com realce para as do sul da Europa, especializadas em turismo. A sequência de vencedores dos últimos cinco anos – Itália (2021), Grécia (2022 e 2023), Espanha (2024) e agora Portugal (2025) – diz mais sobre o próprio ranking do que sobre o mérito económico real dos países distinguidos.
Depois de a revista ter usado extensivamente o acrónimo inglês PIIGS (Portugal, Italy, Ireland, Greece, Spain) durante a crise de dividas soberanas e, anteriormente, o original PIGS (excluindo a Irlanda), que podem ser considerados ofensivos, talvez tenha sido esta a forma de se tentar redimir, criando um ranking que favorece as economias do sul da Europa, mas que manifestamente faz pouco sentido.
Portugal ficou em primeiro devido aos fatores extraordinários que já referi, necessariamente temporários, num ranking que mais deveria chamar-se ‘perdoa-me, Europa do sul’.
Como português, preferia que o ranking não existisse e, assim, a notícia nunca tivesse surgido, pois é perniciosa a vários níveis, como expliquei. Elogios injustificados são prejudiciais, tal como doces a mais fazem mal, como qualquer médico sabe – mesmo a nossa saborosa nata.
Em conclusão, com base na minha análise, penso que o melhor é encarar este ranking como uma brincadeira e propor a sua candidatura ao prémio IgNobel da economia na próxima oportunidade. Se fosse governante, evitaria o regozijo do primeiro lugar num ranking de construção e natureza muito duvidosos, para dizer o mínimo, e que não pode ser levado a sério pelos motivos elencados.

