António João Maia, Jornal i online

Serão os incêndios (sobretudo os de grande dimensão) um problema impossível de prevenir e controlar com maior eficácia?

Os incêndios, sempre eles, a marcar nos últimos anos o espaço mediático dos nossos verões, como se de uma inevitabilidade se tratasse.

Avanço para esta crónica com uma declaração de interesse. Não sou conhecedor da problemática dos incêndios, nem de qualquer dimensão que se lhes possa associar, nomeadamente quanto a medidas, modelos ou soluções de controlo, prevenção e combate.

Ainda assim, considero que sobra espaço para partilhar algumas preocupações cidadãs sobre a questão. Porque, tal como todos nós, sou afetado pelo problema em pelo menos duas dimensões: pela perda acelerada do nosso património florestal e ambiental (e o efeito é incomparavelmente mais gravoso para aqueles que são as vítimas mais diretas, que dolorosamente perdem os seus bens e, nalguns casos, a própria vida); e porque os impostos que pagamos são também destinados a custear as (pelo que se vê, ineficazes ou insuficientes) medidas de controlo, prevenção e combate.

E ao recuperar os textos que publiquei em agosto (Os incêndios em Portugal - alguns contornos estranhos) e setembro (Mação, renascer das cinzas) de 2017, o ano dos fatídicos incêndios que ceifaram 117 vidas, verifico, com muita frustração, que 8 anos e 4 governos depois, pouco ou nada parece ter-se alterado relativamente ao problema dos incêndios em Portugal, sobretudo os de grandes dimensões, pelo menos naquilo que nos é mostrado relativamente à sua dimensão e à incapacidade dos bombeiros e demais estruturas de controlo para lhes fazer frente.

E perante estes sinais, suscita-se uma primeira questão: serão os incêndios (sobretudo os de grande dimensão) um problema impossível de prevenir e controlar com maior eficácia?

Numa perspetiva mais radical, que pressupõe como verdadeiro o adágio popular que nos diz que "o que não tem solução não é problema", então os incêndios não são um problema, mas uma inevitabilidade.

Deste ponto de vista, provavelmente os incêndios são mesmo uma inevitabilidade. Todos os dias, meses e anos, há (como sempre houve) ocorrência de incêndios, originados pelas mais diversas formas, desde as acidentais até aos fogos deliberadamente ateados.

Porém, se sempre houve incêndios, não será menos verdade que no passado era muito menor o número dos que evoluíam para as dimensões incontroláveis dos atuais, com os correspondentes efeitos nefastos que todos conhecemos. A vida das populações rurais até há duas ou três décadas atrás pode explicar esta circunstância – a utilização no dia-a-dia de matos e pastos acabavam por ser processos de limpeza natural das florestas, reduzindo assim a matéria combustível que agora permite o rápido alastramento e crescimento do fogo.

Noutra perspetiva, que será provavelmente a que a maioria de nós partilha, que considera que os incêndios são um problema, e grave, que a todos afeta, então seria exigível, ou, no mínimo, expectável, termos mais e melhores resultados nesta luta, dada a já longa experiência acumulada pelas nossas estruturas de prevenção e combate, pelo menos ao longo dos últimos anos.

Voltei aos textos de 2017 - e muitos outros haverá, seguramente mais bem informados e esclarecedores, porque produzidos por especialistas sobre o problema - e vejo as notícias e as imagens que as TVs nos oferecem por estes dias, e parece que pouco ou nada aprendemos com as sucessivas (e têm sido tantas) vagas de incêndios.

Serão os técnicos e as estruturas de controlo incapazes de estudar e conhecer o problema e encontrar melhores soluções?

O que podemos aprender, ou o que temos aprendido, conjuntamente com outros países também vítimas deste flagelo, sobretudo do mediterrânio, dos Estados Unidos e do Canadá?

Haverá suficiente investimento público para estudar, conhecer e testar soluções mais eficazes? Em relação a esta questão, que se relaciona diretamente com os impostos que todos pagamos, importa salientar, de acordo com dados da Agência de Gestão Integrada de Fogos Rurais, o esforço no investimento em prevenção e combate a incêndios, que passou de 143 Milhões de Euros em 2017, para 638 milhões, em 2024, como se mostra em quadro no final do texto. Porém o reforço de verbas por si só não é sinónimo de melhoria de resultados, como se tem verificado. Importa conjugar melhor o esforço financeiro com soluções eficazes.

Será possível ter mais eficácia sobre as ignições e os pequenos incêndios, apostando em medidas que reduzam a probabilidade de crescerem e se tornarem incontroláveis, como temos verificado?

Existirá um mix de interesses associado ao problema, que acaba por bloquear ou atrasar eventuais medidas de sucesso, como por vezes se insinua?

Serão mesmo os incêndios, sobretudo os de grande dimensão, uma inevitabilidade?

Investimento público em prevenção e combate a incêndios em Portugal (2017 a 2024)
Fonte – Agência de Gestão Integrada de Fogos Florestais