Lúcio Pereira da Silva, Semanário Vida Económica
Texto publicado no suplemento SEGUROS do Semanário Vida Económica
Diversos setores da atividade empresarial estão a ser revolucionados com a Inteligência Artificial (IA), e
o seguro de acidentes de trabalho não é exceção. Com a crescente adoção de tecnologias de automatização e análise de padrões que possam prever comportamentos futuros, as empresas podem tornar os seus ambientes mais seguros e, ao mesmo tempo, os seguradores podem adaptar os seus modelos de cobertura para refletir os novos riscos e oportunidades.
A IA está a ser usada para prevenir acidentes de trabalho antes que estes aconteçam. São sistemas inteligentes que podem analisar os padrões de comportamento dos trabalhadores e detetar fatores de risco com antecedência. Algumas das aplicações mais avançadas incluem sensores e câmaras equipadas com IA, que identificam movimentos perigosos e avisam os trabalhadores em tempo real, de forma a mitigar o risco de acidentes, qualquer que seja a atividade que esteja a ser desenvolvida pelo trabalhador.
Além disso, esses algoritmos analisam as bases de dados históricas para prever quais áreas ou práticas de trabalho apresentam maior risco de acidentes. O risco é calculado com base na probabilidade de ocorrência e na severidade do acidente. Assim, é possível determinar o nível de risco associado a determinada tarefa ou operação realizada pelos trabalhadores.
Também os sistemas de realidade virtual e as simulações baseadas em IA oferecem programas de capacitação para ensinar práticas mais seguras e menos complexas. Com o treino necessário, inclusive por meio de simulacros, os trabalhadores estarão mais aptos a lidar com situações de perigo.
Quanto às seguradoras, a forma como estas abordam os acidentes de trabalho está a mudar com a IA. Algumas tendências incluem, em vez de políticas padronizadas, o ajuste dos valores e coberturas com base na exposição ao risco em tempo real dos trabalhadores de determinada organização, seja considerando todos os trabalhadores, seja uma amostra representativa.
No que diz respeito à gestão dos sinistros, a IA pode acelerar a análise de reclamações, reduzindo o tempo de resposta, aumentando a qualidade e a reputação da seguradora no mercado. Além disso, fraudes podem ser identificadas com maior precisão e complexidade. Atualmente, a peritagem é tratada como um mal necessário, quase sempre executada por prestadores externos às seguradoras, o que constitui ou pode constituir um ponto fraco no processo de regularização do sinistro.
Com a IA, as fraudes ou mesmo as tentativas tendem a diminuir, seja quando o segurado alega um acidente inexistente ou atribui a um acidente ocorrido fora do contexto laboral o caráter de acidente de trabalho, ou ainda quando exagera ou prolonga indevidamente o período de recuperação para continuar a receber compensações.
A apresentação de recibos e diagnósticos médicos adulterados para justificar despesas médicas ou períodos de incapacidade também é uma prática
comum entre os sinistrados. Para lidar com esse problema, as seguradoras têm investido em tecnologias de inteligência artificial e cruzamento de dados para identificar padrões suspeitos e reduzir a incidência de fraudes.
Com a automatização das empresas e a implementação de medidas e processos com a utilização da IA, os seguros de acidentes de trabalho podem tornar-se mais acessíveis e eficientes.
Apesar dos benefícios, o uso da IA nos seguros de acidentes de trabalho levanta desafios importantes. Entre eles, a privacidade: até que ponto a vigilância dos trabalhadores pode comprometer a privacidade individual?
As decisões tomadas com base em algoritmos podem ser injustas, ao avaliarem a probabilidade de acidentes com base em características individuais
únicas.
A implementação de auditorias rigorosas, a formação de profissionais na área de sinistros e o uso de algoritmos de avaliação de risco são algumas das
estratégias adotadas para mitigar esse problema.
Além disso, a legislação portuguesa prevê penas de prisão de até três anos para quem for condenado por fraude em seguros.
As regulamentações devem evoluir para garantir que os avanços tecnológicos beneficiem a todos de forma equilibrada e justa, independentemente da organização.
A Inteligência Artificial tem o potencial de transformar significativamente o setor de seguros de acidentes de trabalho, tornando as empresas mais seguras e os processos de cobertura mais eficientes.
No entanto, é importante garantir que a implementação da IA seja feita de maneira ética e transparente, protegendo os direitos dos trabalhadores e assegurando um equilíbrio entre inovação e responsabilidade social.